A ação higienista e autoritária do prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB), na Cracolândia no último domingo (21) levou a prefeitura a entrar em uma crise política sem precedentes.
Na última semana, Doria conseguiu esvaziar a Virada Cultural e promover uma ação truculenta junto à Polícia Militar do governador Geraldo Alckmin (PSDB), o que levou a sociedade, a mídia e a Justiça a criticá-lo duramente.
Em uma canetada, ele acabou com o programa “De Braços Abertos”, derrubou um prédio com pessoas dentro e colocou 900 policiais militares munidos de bombas de gás e balas de borracha para expulsar 400 pessoas da rua Helvétia, região da Luz, no centro de São Paulo, popularmente conhecida como Cracolândia.
O caráter marqueteiro e a inabilidade gestora do tucano têm gerado mal estar no primeiro escalão da prefeitura, clima que culminou no pedido de exoneração feito na quinta-feira (25) pela secretária de Direitos Humanos, Patrícia Bezerra. Depois do esvaziamento do orçamento da pasta, que ficou apenas com verbas para manutenção de recursos humanos, a ação violenta de Doria na Cracolândia, classificada por ela como “desastrosa”, foi a gota d’água.
“A tendência é que Doria transforme seu primeiro escalão em um grupo de lambe-botas, já que os secretários qualificados não concordam com suas ações. Qualquer pessoa qualificada sabe que Doria não tem nenhum conhecimento ou interesse na implementação de políticas públicas”, declarou o secretário de Cultura da gestão Fernando Haddad (PT), Nabil Bonduki.
Depois da ação, os usuários se espalharam por 23 regiões da capital, segundo levantamento feito pela Guarda Civil Metropolitana. Desde domingo (21), vereadores de oposição e entidades sociais estão monitorando as ações na região a fim de evitar novas cenas de violência.
Na noite de quinta-feira (24) foi realizada uma reunião extraordinária da Comissão de Direitos Humanos com usuários, moradores e comerciantes da rua Helvétia. As notas taquigráficas serão enviadas ao Ministério Público como prova dos abusos, das ilegalidades e da violência cometidas desde a primeira ação no domingo.
A tendência é que Doria transforme seu primeiro escalão em um grupo de lambe-botas, já que os secretários qualificados não concordam com suas ações. Qualquer pessoa qualificada sabe que Doria não tem nenhum conhecimento ou interesse na implementação de políticas públicas (Nabil Bonduki)
Vereadores do PT também apresentaram à Procuradoria do município duas denúncias referentes à falta de atendimento aos usuários retirados do local e ao pedido feito por Doria de interná-los compulsoriamente. A oposição também pretende convocar os secretários a se explicar em uma audiência pública prevista para a terça-feira (30).
“Estamos tentando dialogar com a prefeitura, ainda sem sucesso. Tentando algum retorno até para saber quais serão as próximas medidas e entender esse programa ‘Redenção’, já que ninguém consegue informações sobre como ele funciona”, explicou a vereadora e vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara de São Paulo, Juliana Cardoso (PT).
“Na quinta-feira (25), levamos duas denúncias à Procuradoria do município e fomos muito bem recebidos. Nos bastidores, sabemos que o objetivo de Doria é retomar o programa Nova Luz, de urbanização do local com o Santa Tereza. É um projeto ultrapassado que derruba o patrimônio da região”, explicou a vereadora.
O programa “Redenção” citado por ela foi criado por Doria para substituir o “De Braços Abertos” da gestão Fernando Haddad (PT). Porém, pouco se sabe sobre as políticas públicas do novo programa e ele não foi levado em conta nas ações iniciadas na Cracolândia no domingo (21).
Para o vereador e presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara municipal, Eduardo Suplicy, ficou claro, após ouvir os relatos houve violência por parte da polícia. “Ficou claro, diante dos relatos feitos na reunião extraordinária da Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal, realizada ontem, que houve violência nas operações policiais na Cracolândia, com abordagens desrespeitosas e inaceitáveis. Os direitos humanos de comerciantes, moradores e usuários de drogas foram violados e exigimos explicações a respeito dessa política da gestão do prefeito João Doria”.
Patrícia Bezerra deixou a secretaria depois de autorizar que 60 pessoas ocupassem o auditório da secretaria de Direitos Humanos, localizado no centro de São Paulo. Desde então, começaram a surgir relatos de ações truculentas contra os manifestantes. A chave da secretaria chegou a ser entregue à guarda municipal enquanto a prefeitura tentava esvaziar o prédio na noite de quinta-feira (25). Vereadores de oposição tomaram a frente nas negociações da ocupação com a prefeitura.
Ação gerou problemas judiciais ao prefeito
Doria e o governador tucano Geraldo Alckmin foram enxotados da Cracolândia depois de uma tentativa frustrada de entrevista coletiva na terça-feira (23), um dia após dispersão dos usuários.
Além da derrota política, a ação na Cracolândia também está rendendo problemas judiciais ao prefeito. A Justiça de São Paulo proibiu liminarmente o prefeito de derrubar imóveis na região sob pena de multa diária de R$ 10 mil. A mesma Justiça negou o pedido de internação compulsória dos usuários também feito pelo tucano.
As promotorias de Direitos Humanos e da Infância e Juventude e a Defensoria Pública do Estado abriram inquérito civil conjunto para apurar a atuação da Guarda Civil Metropolitana na ação coordenada por Doria e Alckmin e pelas ações promovidas desde domingo na região da Cracolândia.
Por Ana Flávia Gussen da Agência PT de Notícias.