Ser mulher em uma sociedade estruturada nas bases do patriarcado e do machismo é extremamente desafiante. Se colocarmos este cenário sob a ótica do sistema prisional, a situação torna-se muito mais penosa.
Em um ambiente feito e gerido por homens, as mulheres que se encontram privadas de liberdade enfrentam centenas de desafios e obstáculos. Seja na vivência no dia a dia dos presídios, seja na reinserção na sociedade.
E a fim de oferecer novas oportunidades a estas brasileiras, a deputada federal e pré-candidata à prefeitura de Goiânia, Adriana Accorsi (PT-GO), apresentou o projeto de lei 661/24, que prevê a criação de cotas no serviço público para mulheres egressas do sistema prisional. A proposta estabelece cota de 5% do total de funcionários de empresas contratadas pelo Poder Público para serviços de prestação continuada como vigilância, limpeza, e manutenção.
O texto também propõe cota de 5% para egressas em programas de empregabilidade ou de formação profissional, que venham a ser promovidos ou apoiados pelo Poder Público, seja da administração direta ou indireta, autarquias, e fundações públicas. Todas as cotas citadas deverão ser paritárias, em relação a raça e gênero, incluindo-se travestis e mulheres transexuais.
A parlamentar petista explica que o PL objetiva “garantir direitos fundamentais para as mulheres que estão privadas de liberdade para aquelas se são reinseridas na sociedade, busca desenvolver ações e estratégias voltadas à redução do encarceramento, promover os direitos humanos, em estabelecimentos de restrição de liberdade, e a cidadania de mulheres privadas de liberdade e egressas do sistema prisional; bem como de suas respectivas famílias.”
Segundo a Agência Câmara, “O objetivo é articular a atuação do Poder Público em ações voltadas à redução do encarceramento, à proteção dos direitos humanos nos presídios; e garantir o acesso a direitos e serviços públicos às acusadas e apoio às famílias das presas e saídas do sistema prisional e suas respectivas famílias.”
Algumas das diretrizes que o PL prevê são:
– Estabelecer fluxo de atendimentos e procedimentos específicos para as mulheres, de modo a garantir a regularização da assistência no interior das unidades prisionais;
– Pactuar ações junto à rede SUS e SUAS, para assistir as mulheres encarceradas e seus familiares em suas necessidades de saúde e assistência social, e garantir exames periódicos para prevenção e tratamento do câncer de mama;
– Firmar parcerias com instituições públicas e particulares de ensino superior, fomentando a realização de projetos de cunho educacional, esportivo e cultural junto às mulheres, além de estimular a pesquisa acadêmica.
Mulheres negras são a maioria das detentas
O Brasil é a quarta maior população prisional feminina do mundo, ficando atrás dos EUA, China e Rússia. De acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, realizado em 2018, o Brasil tem 42.355 mulheres privadas de liberdade.
O recorte deste público se apresenta da seguinte forma: 27% têm entre 18 e 24 anos, 23% entre 25 e 29 anos, 18% entre 30 e 34 anos e 21% entre 35 e 45 anos. No campo escolaridade das detentas, 45% têm ensino fundamental incompleto, 15% o ensino fundamental completo, 17% o ensino médio incompleto, e 15% o ensino médio completo. Quando observa-se o recorte de raça/cor, 62% das mulheres são negras, e 37% brancas.
Os crimes cometidos por mulheres, em sua maioria, não são violentos, sendo apenas 6% são homicídio; a maioria, 62%, são crimes relacionados ao tráfico de drogas, devido fatores sociais e econômicos.
O Observatório Legislativo da Intervenção Federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro (OLERJ) revelou que nas unidades para mulheres, somente 34% possuem espaço adequado para gestantes. Já nas unidades mistas, a situação é ainda pior, apenas 6% possuem celas adequadas para as grávidas, sendo que apenas 32% dos presídios femininos possuem berçário. Entre os presídios mistos, 3% das unidades dispõem da instalação, e apenas 5% das unidades femininas possuem creche e não existe nenhuma creche em unidades mistas.
“No que se refere às oportunidades de trabalho dentro do presídio feminino, a distribuição não é equitativa. Apenas um grupo escolhido e restrito tem oportunidade de trabalhar, que são as presas mais antigas ou as mulheres que desempenham alguma liderança. Nos presídios masculinos, ainda que com inúmeros problemas, as oportunidades de trabalho são muito maiores”, afirma o Observatório.
Existem mais presídios masculinos do que femininos. No presídio masculino, os homens são separados de forma que os grupos rivais não fiquem juntos, o que gera organização melhor da rotina e das regras de convivência. Os presídios femininos não têm esse tipo de procedimento e amontoam mulheres nas poucas unidades que o sistema prisional oferece.
Próximos Passos
O projeto, que tramita em caráter conclusivo, será analisado pelas comissões de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial; de Defesa dos Direitos da Mulher; de Finanças e Tributação; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.
Da Redação Elas por Elas, com informações da Agência Câmara e Observatório Legislativo da Intervenção Federal na Segurança Pública do Rio de Janeiro