A Bolívia resiste às ingerências norte-americanas no país. No fim do ano passado, o povo boliviano foi vítima de um golpe orquestrado pelos EUA, que derrubou Evo Morales do poder e trouxe uma perigosa instabilidade ao país. Agora, Luis Arce, o candidato progressista à Presidência apoiado por Morales, pode vencer as eleições de 18 de outubro já no primeiro turno. A perspectiva de vitória de Arce representa um sopro de esperança para a América Latina, cuja integração é histórica e constantemente ameaçada pelo domínio imperialista.
Segundo pesquisa da Fundação Jubileo, realizada com apoio de uma rede de universidades e divulgada na quarta-feira (16), Arce aparece com 40,3% das intenções de voto, à frente do segundo colocado, o ex-presidente Carlos Mesa, que tem 26,2%. A atual presidente interina, Jeanine Áñez, está em terceiro, com 10,6%. Segundo as regras eleitorais da Bolívia, para vencer no primeiro turno, o candidato precisa de 40% dos votos válidos e ter pelo menos 10 pontos de vantagem sobre o segundo candidato.
Arce é candidato do Movimento ao Socialismo (MAS) e foi ministro da Economia de Morales por 13 anos, entre 2006 e 2019. Seu vice na chapa, David Choquehuanca, também foi da equipe de Morales, atuando como ministro das Relações Exteriores entre 2006 e 2017.
O resultado da pesquisa foi celebrado por Evo Morales, atualmente exilado na Argentina. “Só Luis Arce nos dará a confiança para impedir o suicídio econômico ao qual o governo está nos conduzindo”, escreveu Morales, pelo Twitter. “Com ele, nossa amada Bolivia vai superar a crise e retomar o caminho do desenvolvimento”, afirmou.
Temido pela direita golpista da Bolívia e lembrado pelo povo, Morales teve o impedimento de sua candidatura ao Senado confirmada pela Justiça na semana passada. Ele havia recorrido ao tribunal de La Paz para anular decisão do Supremo Tribunal Eleitoral (TSE) de fevereiro. Morales também foi ameaçado pela presidente boliviana, caso tentasse retornar ao país. “Eu quero dizer a Evo Morales, que se regressar ao país, terá que enfrentar a Justiça por todos os abusos que cometeu durante sua gestão como presidente, por todos os atropelos aos direitos humanos”, declarou Jeanine Áñez, no início de setembro.
OEA, instrumento do golpe
Morales foi vítima de mais um golpe planejado e orquestrado pelo Departamento de Estado dos EUA, tendo como principal instrumento de execução a Organização dos Estados Americanos (OEA). Para legitimar a farsa, a entidade produziu um relatório com informações sobre uma suposta fraude nas eleições que deram a vitória ao candidato indígena do MAS, em novembro de 2019. Como a própria imprensa americana foi forçada a reconhecer posteriormente, fraudulento era o relatório da OEA.
Mais de seis meses após o golpe que exilou Morales, em junho de 2020, o jornal ‘The New York Times’ apontou em reportagem inúmeras falhas no relatório da organização. “Um exame atento dos dados eleitorais sugere que a análise inicial da OEA que levantou dúvidas sobre fraude eleitoral – e contribuiu para a deposição de um presidente – foi falha”, relatou a reportagem. Mas era tarde demais: a perseguição a Morales jogou o país em uma enorme convulsão social e caos econômico.
A Bolívia perdeu seu presidente mais popular, uma liderança que foi capaz de operar transformações históricas para o povo boliviano. “Fui o primeiro operário eleito e o Evo Morales foi o primeiro indígena”, disse nesta semana o ex-presidente Lula. “Ele fez uma administração estupenda, nunca na história da Bolívia, houve tanto crescimento econômico e o povo teve tanta ascensão social como no governo dele”, elogiou.
Comissão Interamericana de Direitos Humanos
A OEA teve e continua a ter papel fundamental na estratégia imperialista de enfraquecimento da América Latina. No mês passado, o brasileiro Paulo Abrão foi impedido de renovar seu mandato como secretário-executivo da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da OEA. O veto à recondução de Abrão, reeleito por unanimidade, foi uma decisão do secretário-geral da OEA, o uruguaio Luis Almagro, atualmente subordinado aos interesses dos EUA. A confirmação da saída de Abrão foi dada nesta quinta-feira (17).
O veto arbitrário de Almagro ocorreu às vésperas da divulgação de um relatório sobre milícias, violência policial e ataques à minorias no Brasil. O relatório cobre o período da primeira metade do mandato de Jair Bolsonaro na Presidência. A decisão gerou reações de organismos da comunidade internacional, entre eles ONU e Unesco e de países como México e Argentina, além do Grupo del Puebla, que reúne ex-presidentes da América Latina, como Lula, Dilma Rousseff, Rafael Correa e o ex-chanceler Celso Amorim, entre outros.
“O secretário Almagro, devido à sua carreira questionável à frente da OEA e às disposições estatutárias da OEA, não tem autoridade moral ou jurídica para punir a conduta do secretário Abrão ”, diz nota da organização, divulgada em 27 de agosto. “O Grupo não descarta que a intervenção do Secretário seja uma resposta às recentes decisões adotadas pela CIDH em relação à perseguição de lideranças políticas progressistas pelos governos do Equador, Bolívia, Chile e Colômbia”, apontou.
Dominação americana
Para o ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, tanto o veto à Abrão quanto a indicação de Mauricio Claver-Carone por Donald Trump para a presidência do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), são claras indicações da estratégia de dominação americana na América Latina. Historicamente, a presidência do BID sempre foi uma prerrogativa latino-americana. A indicação de Trump tem o apoio de Bolsonaro e da Colômbia, “uma coisa vergonhosa”, aponta Amorim.
“Depois de 60 anos, pela primeira vez, eles indicam um cidadão dos Estados Unidos. Sempre foi um latino-americano”, lembrou Amorim, recentemente, em entrevista ao ‘Brasil 247’. “E não é qualquer americano”, observou. “Claver-Carone faz parte do lobby anti-Cuba e defende ações duras contra a Venezuela. O objetivo do Trump em colocá-lo lá é ele ter o mesmo papel do Almagro, como por exemplo facilitar mudanças de regime, afastar aquilo que atrapalhe”, ressaltou o ex-chanceler.
Evo pede transparência nas eleições da Bolívia
Atento aos movimentos do traidor Almagro, que já foi ministro das Relações Exteriores do governo Pepe Mujica, entre 2005 e 2010, o ex-presidente Evo Morales sabe o que está em jogo no dia 18 de outubro. Na quarta-feira, a OEA de Almagro, que apoio o governo golpista de Áñez, anunciou que chefiará uma missão de observação nas eleições bolivianas, a convite do “governo de fato”.
“Quanto mais observadores honestos houver nas eleições, melhor para a democracia”, sugeriu Morales. “Temos plena confiança na ONU e na União Europeia. Não cairemos nas provocações de Almagro, secretário-geral da OEA”, afirmou o líder popular.
Da Redação