Nesta semana da consciência negra, na qual lembramos do legado da luta de Zumbi dos Palmares, reforçamos em nosso espírito a necessidade do combate ao racismo com reflexões, leituras, debates, comemorações. Importante lembrarmos que vivemos em uma sociedade que discrimina o ser humano simplesmente pelo fato dele ter a cor da pele diferente.
Os negros viviam em seu ambiente natural, organizados na África em comunidades, trabalhando nos campos, cuidando de suas famílias. Mas foram sequestrados de sua pátria-mãe para serem escravizados em muitos países. Foi assim que mais de cinco milhões deles chegaram ao Brasil, para trabalho forçado. A escravidão em nosso país durou séculos e viveu um momento histórico muito duro em 20 de novembro de 1695, quando o quilombo chefiado por Zumbi dos Palmares, em Alagoas, foi cercado, invadido e dizimado, culminando com a morte de seu chefe maior, cujo legado de luta nos anima até hoje a combater a discriminação contra o povo negro.
O Brasil foi o último país latino-americano a acabar com a escravidão. O conservadorismo da época e de hoje traz de volta o aumento da discriminação racial em nossa terra. O racismo tem suas digitais cravadas fortemente no Brasil de hoje.
Existencialmente ser negro hoje, no Brasil, é como estar envolvido por uma imensa nuvem sinistra, que discrimina e mata. Estudos sérios do IPEA, entre 2009 e 2011, revelam que mulheres negras, jovens e pobres são as maiores vítimas da violência no país. Conclusões do Mapa da Violência 2015, divulgado agora em novembro, pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) aponta que em um ano, no Brasil, morreram assassinadas 66,7% mais mulheres negras do que brancas.
Mas se historicamente estamos atrasados como nação, por outro lado, as políticas afirmativas dos governos Lula e Dilma têm colaborado para evidenciar uma presença mais representativa de negros e negras nas universidades, graças às cotas raciais, tão combatidas por setores muito significativos da perversa elite atrasada brasileira. No entanto, com toda a polêmica sobre esta questão de cotas, hoje, filhos de porteiros, pedreiros, motoristas, empregadas domésticas, ou seja, negros e pobres, estão se formando em doutores. A quantidade de universitários pardos, entre 18 e 24 anos, saltou de 2,2%, em 1997, para 11% em 2012. Já a de negros cresceu de 1,8% para 8,8%, nesse mesmo período.
É certo que a população negra brasileira avançou muito nos últimos 12 anos com programas de governo que diminuíram a distância entre ricos e pobres no Brasil. Nos governos Lula e Dilma, a renda per capita média dos negros cresceu 66,3% e a dos pardos, 85,5%.
O Bolsa Família teve um papel importante no crescimento da renda da população negra. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) e do IPEA, das 14 milhões de famílias atendidas pelo programa federal de transferência de renda, 73% são de pessoas pardas e negras.
O combate ao racismo, longe de cansar, é um convite permanente à luta pela adoção de medidas corajosas para modificar esta realidade cruel. A população negra e parda correspondia a 50,7% da população brasileira em 2010 e em 2014 este contingente chegou a 51% dos brasileiros, ou seja, 111.923.585 pessoas. No entanto, as ocupações dos trabalhadores e das trabalhadoras negras são caracterizadas pela desigualdade de rendimentos em relação aos brancos, o que se evidencia nas precárias condições de trabalho, na sua concentração em postos de menor prestígio, com salários pouco mais da metade (57,4%) do rendimento recebido pelos trabalhadores de cor branca, segundo o IBGE, em 2013.
Um dos setores de maior desigualdade é o setor bancário, onde o II Censo da Diversidade mostrou, em 2014, que, dos 500 mil bancários brasileiros, somente 24,7% são negros. Segundo este censo, o salário do negro é 27% menor do que o do trabalhador branco. Os bancários negros não têm o mesmo acesso aos cargos mais remunerados das chefias.
O desaparecimento físico de Zumbi, em 1695, dá lugar a uma luz que norteia nossa luta pela igualdade racial. Temos grandes heróis populares na nossa história e quero dedicar este dia também, ao marinheiro João Cândido, chamado o “almirante negro”, que comandou a Revolta da Chibata e modificou e melhorou o tratamento que a oficialidade dava aos marinheiros. Dedico esta data, também, à legião de escravos anônimos, enviados pela burguesia branca para a Guerra do Paraguai, muitos deles descalços, enganados pelo Império, para combater no lugar dos senhores de terras. Em troca, prometeram-lhes uma carta de alforria que os sobreviventes jamais receberam – eles eram os Voluntários da Pátria, cuja verdadeira história será melhor conhecida no dia em que forem abertos os arquivos do Itamaraty sobre esta guerra.
A Nação Brasileira deve muito aos seus negros. Salve Zumbi dos Palmares! Salve João Cândido! Salve todos os nossos heróis do passado e do presente! Chega de preconceito e racismo, na vida e no trabalho.
Almir Aguiar é secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT)