Ao mesmo tempo em que enchem meus olhos e renovam minha esperança por um país com plenitude democrática e maior participação popular, as manifestações contra a reorganização das escolas estaduais paulistas me preocupam, em razão da inobservância de direitos constitucionais básicos e da força desproporcional usada pelo Estado.
O corpo dolorido do professor de história Edvan Costa, agredido por policiais militares durante a ação de desocupação de uma escola na Zona Sul de São Paulo, é mais uma lamentável consequência do violento modus operandi do Governo de São Paulo. O educador apanhou por amar a profissão que abraçou, “por defender o justo, o correto, o digno e o óbvio”, como escreveu, em desabafo compartilhado na Internet.
A mesma truculência que não perdoa professores tenta transformar alunos, vítimas de uma lógica perversa, em indiciados. Em Americana, dois estudantes foram detidos, sob acusação de desacato. Eles participavam de um protesto contra o fechamento de salas noturnas do ensino médio, na Diretoria Regional de Ensino instalada na cidade. Foram levados à delegacia como criminosos, pelo simples fato de brigarem por um direito constitucional, sublinhado pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que diz que “o dever do Estado com a educação pública será efetivado mediante garantia de oferta de ensino noturno regular adequado às condições do educando”.
Classifico o projeto apresentado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo como uma ideia infeliz, equivocada e antidemocrática, resultado da falta de transparência de um governo que substitui o diálogo pela repressão e dá mais uma prova de desrespeito aos professores e indiferença à qualidade do ensino oferecido nas escolas que administra. E a resposta a essa insensibilidade tem sido dada nas ruas, tomadas por alunos com cartazes, caras pintadas, dispostos a lutar por seus direitos.
Em Hortolândia e Sumaré, também na Região Metropolitana de Campinas, o clima é de muita apreensão. Nas duas cidades, mais de dez escolas serão atingidas pelas mudanças. Uma delas é a Maristela Carolina Mellin, localizada no Jardim Minda, em Hortolândia. Embora o site criado pela Secretaria de Educação para tirar dúvidas da comunidade escolar informe que a unidade não será afetada, professores e alunos já foram comunicados de que as turmas do ensino médio serão fechadas e os alunos transferidos para outra unidade.
Os números da reforma anunciada pelo Governo do Estado são preocupantes: 1,4 mil escolas atingidas, mais de 90 fechadas, 311 mil alunos envolvidos e centenas de milhares de famílias tomadas pela incerteza. Como integrante da Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e coordenadora das frentes parlamentares em Defesa da Criança e do Adolescente e da Implementação do Plano Nacional de Educação no Estado, estou muito preocupada com as mudanças, que afrontam o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e contrariam o PNE, ao ignorar direitos e privar nossos jovens do acesso a um ensino gratuito de qualidade. Ademais, nossa Pátria Educadora precisa de mais escolas, não de portões fechados em nome projetos descontextualizados.
A postura dos estudantes é um exemplo de como devemos nos organizar para reivindicar aquilo que achamos justo. Com gritos de ordem como “não à reorganização”, “minha arma é um livro” e “não feche minha escola”, professores apaixonados e alunos conscientes têm nos dado uma aula de resistência em defesa do ensino público. Olhando para eles, tenho certeza de que seremos ainda mais fortes.
Ana Perugini é deputada federal pelo PT, integrante das comissões de Educação, Licitações, Minas e Energia e da Crise Hídrica. É também coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa da Implantação do Plano Nacional de Educação (PNE) no Estado de São Paulo.