Após a efetivação do golpe contra a presidenta eleita Dilma Rousseff no Senado, o Brasil tem assistido uma retomada das grandes manifestações, agora pedindo o Fora Temer e as eleições diretas. No último domingo (4), uma marcha com mais de 100 mil pessoas ocorreu de forma pacífica em São Paulo, mas terminou com repressão da Polícia Militar.
Frente aos últimos acontecimentos, a Associação Juízes Para a Democracia divulgou uma nota defendendo o direito à livre manifestação, criticando o uso de força desproporcional e indevida, além de cobrar do Ministério Público ação de fiscalização da atividade policial. Leia a nota na íntegra:
“A Associação Juízes Para a Democracia, entidade não governamental e sem fins corporativos, que tem por finalidade estatutária o respeito absoluto e incondicional aos valores próprios do Estado Democrático de Direito, vem a público externar repúdio e contrariedade em face dos atos de violência e repressão que atentam contra o livre exercício do direito de livre manifestação, ocorridos nos dias que sucedem à deposição da presidenta eleita Dilma Vana Rousseff, esperando do Ministério Público o efetivo controle da atividade policial, nos seguintes termos:
- A livre manifestação do povo encontra guarida no seio do corpo democrático, conforme o art. 5º da Constituição da República, que estabelece ser livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato, podendo se reunir pacificamente em locais abertos ao público, independentemente de autorização, sendo desnecessário registrar, no presente instrumento, o alto custo social pago durante os regimes de exceção para que tal direito fosse erigido à estatura constitucional.
- Diversos atos e fatos no pós 31 de agosto de 2016 demonstram o total despreparo do braço policial do Estado para a escorreita aplicação e preservação da Constituição da República. Nesse sentido, têm-se notícias de uso indiscriminado de balas de borracha contra manifestantes em geral em diversas cidades; tem-se a notícia de estudante que perdeu a visão do olho esquerdo em São Paulo; tem-se a notícia de advogado preso e agredido, em Caxias do Sul, quando se encontrava no exercício da função de defender cidadãos contra abusos oficiais; tem-se, ainda, a notícia de manifestantes presos mantidos incomunicáveis por várias horas e de agressão gratuita contra pessoas que participavam do ato pacífico ocorrido em São Paulo no dia 4 de setembro, o que foi testemunhado na pele por repórter da BBC Brasil, violentamente atacado por policiais.
- O uso da força tem se mostrado desproporcional, por todo o Brasil. A violência praticada envolve lançamento de gás, bombas, disparo de balas, ocasionando lesões corporais indiscriminadas de natureza grave e prisões arbitrárias, tudo em desrespeito primário à cidadania e aos direitos fundamentais.
- A repressão que impede o exercício pleno de tal direito elementar milita contra a Democracia, contra a Constituição, contra o povo, muito especialmente contra os que tombaram na construção da ordem constitucional vigente.
- É imprescindível, por tudo isso, que o Ministério Público exerça sua função prevista no artigo 129, VII, da Constituição da República, fiscalizando a atividade policial e exigindo, dos responsáveis pelo comando da polícia e dos próprios secretários da segurança e governadores estaduais, o pleno respeito às liberdades democráticas. Espera-se que o Ministério Público exerça tal função considerando que, em uma democracia fundada na promessa de construção de sociedade livre, justa e solidária, como previsto no art. 3º, I, da Constituição da República, o direito de manifestação é garantido não apenas à parcela da população que apoia um determinado grupo político; tal direito assiste aos manifestantes defensores das mais diversas ideologias e agremiações políticas que, sob um regime democrático, deveriam alcançar o poder apenas pelo voto popular.
- A defesa das liberdades públicas é dever constitucional atribuído a todo sistema de Justiça, inclusive ao Ministério Público na fiscalização da atividade policial. A Associação Juízes para a Democracia reitera que o sistema de Justiça afeto à Constituição é aquele que respeita o direito constitucional de livre manifestação e aceita o pluralismo de ideias. Urge reorientação no sentido de uma inflexão na escalada ascendente de desrespeitos e rupturas constitucionais vivenciadas na quadra atual.
São Paulo, 5 de setembro de 2016.
A Associação Juízes para a Democracia”
Da Redação da Agência PT de Notícias