Os casos de homicídio de pessoas negras (pretas e pardas) no Brasil cresceram 11,5% em dez anos. É o que aponta o Atlas da Violência 2020, divulgado na quinta-feira (27), em São Paulo, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).
No caminho inverso, no mesmo período de 2008 e 2018, a taxa entre não negros (brancos, amarelos e indígenas) apresentou uma queda de 12,9%.
Segundo o Atlas da Violência 2020, baseado em dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, para cada pessoa não negra assassinada em 2018, 2,7 negros foram mortos, o que representa 75,7% das vítimas. Enquanto a taxa de homicídio a cada 100 mil habitantes foi de 13,9 casos entre os não negros, já entre os negros ela chegou a 37,8%.
A diretora executiva do FBSP, Samira Samira, fala sobre a disparidade entre a prevenção da morte de não negros em contraponto com a de negros.
“O que me chama mais a atenção é perceber que essa política que tem sido implementada, seja ECA, Estatuto do Desarmamento, ou nos territórios, por prefeitos e governadores, tem sido capazes de prevenir a morte de pessoas não negras, mas, quando a gente olha para a taxa na população negra, no mesmo período, parece que estamos falando de países diferentes, tamanha a disparidade”, diz ela.
O secretário nacional de Combate ao Racismo do PT, Martvs das Chagas, ressaltou a necessidade da construção de programas e ações nas eleições de 2020 para a implementação de políticas de promoção da igualdade racial.
“Infelizmente, os dados do Atlas apenas reforçam o que nós já sabemos, a população negra continua sofrendo os efeitos da escravidão até os dias de hoje. Por isso, a importância dos partidos políticos em construir programas e ações nas eleições municipais desse ano para a implementação de políticas públicas de promoção da igualdade racial, para além da destinação de recursos para as candidaturas negras”, enfatiza Martvs.
Vulnerabilidade racial, de gênero e de classe
Um outro dado apurado pelo Atlas e que comprova a existência do racismo estrutural é referente ao homicídio de mulheres. Enquanto entre as mulheres não negras foi constatada uma redução de 11,7%, já entre as negras a taxa subiu para 12,4%.
No período pesquisado, os estados que tiveram as mais altas taxas de homicídios entre a população negra estão localizados nas regiões Norte e Nordeste, com destaque para Roraima (87,5 mortos para cada 100 mil habitantes), Rio Grande do Norte (71,6), Ceará (69,5), Sergipe (59,4) e Amapá (58,3).
A disparidade racial entre as mulheres assassinadas é a soma de vulnerabilidades ainda mais evidentes do que quando se trata de homens, aponta a pesquisadora Amanda Pimentel.
“No caso dos homens, são muito mais relacionadas à falta de acesso que os homens têm a serviços e políticas públicas. Mas entre as mulheres negras há uma tripla vulnerabilização: racial, de gênero e de classe”, afirma.
Violência policial e racismo
Segundo o pesquisador Dennis Pacheco, a violência policial é um dos fatores para a disparidade entre os mortos negros ou não. “A ideia do negro perigoso é uma ideia que muitas vezes existe em várias polícias no Brasil. O uso da força diferenciada entre negros e não negros ainda existe muito”, ressalta.
Ele destaca que não há como separar, nos dados do governo, os assassinatos cometidos por policiais e os por outros criminosos. No entanto, ele aponta que o índice de negros mortos é semelhante nos dois casos.
“A gente sabe que existe uma convergência entre os mortos pela polícia e os outros, em geral. Os negros estão entre 70% em ambos. Tem uma relação forte de como a política pública de segurança é ineficaz, ineficiente. Quando há investimento em soluções ostensivas e não preventivas, é esse é o resultado que temos em um país racista”, comenta Dennis.
Da Redação
Acesse aqui a íntegra do Atlas da Violência 2020
https://www.ipea.gov.br/atlasviolencia/download/24/atlas-da-violencia-2020