Não há base legal para o impeachment. A conclusão do ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi um “cala-boca” na oposição que teve que engolir 35 minutos de explicações técnicas e jurídicas que puseram abaixo qualquer resquício de argumento plausível para justificar o impedimento da presidenta Dilma Rousseff. A exposição de Barbosa ocorreu nesta quinta-feira (31) durante audiência pública da comissão que analisa a admissibilidade do processo de impeachment. Reforçando os argumentos do ministro, também falou o professor de Direito Tributário Ricardo Lode Ribeiro, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
“No caso dos decretos de crédito suplementar, em primeiro lugar, estavam de acordo com a legislação em vigor prevista no artigo 4º, da Lei Orçamentária de 2015. Em segundo lugar, a criação de um crédito suplementar não implica necessariamente um aumento de despesa financeira, porque esses créditos suplementares não alteraram o decreto de contingenciamento de 2015. Muito ao contrário, eles foram publicados depois de o governo adotar o corte de despesas”, afirmou Barbosa.
O ministro explicou que o decreto de contingenciamento estabelece o chamado “limite financeiro”, ou seja, quanto pode ser gasto em cada ação. Já o decreto de crédito suplementar amplia ou modifica o rol de ações em que pode ser gasto determinado valor. “Que valor? O valor determinado no decreto de programação financeira. (…) E nenhum dos seis decretos mencionados [no pedido de impeachment] modificou a programação financeira de 2015, nenhum deles modificou o limite global de gasto discricionário do governo”, detalhou.
Para entender fielmente o que está posto, Nelson Barbosa disse ser necessário separar o que é gestão orçamentária do que é gestão financeira. A primeira diz respeito às autorizações que o Congresso Nacional dá para a União realizar despesas. Nesse caso, segundo explicou, a própria Lei Orçamentaria de 2015 especifica no seu artigo 4º como podem ser dadas as autorizações adicionais – ou seja, os créditos suplementares. Afirmou ainda que o aumento de uma dotação para um programa não significa que aquele programa vai ter imediatamente um gasto aumentado, porque o gasto é separado, faz parte da gestão financeira.
“Um exemplo adequado é uma ida ao supermercado. Você vai ao supermercado com uma lista do que você precisa comprar: arroz, feijão, macarrão, molho de tomate… Isso é a dotação orçamentária, ou seja, onde você vai gastar o seu recurso. O que é o seu limite financeiro? É quanto de dinheiro você tem no bolso, o que você tem para gastar naqueles itens. Mas a caminho do supermercado, alguém da sua família liga e diz: em vez de um quilo de arroz, compre dois. Muda a lista do supermercado, muda a dotação orçamentária, mas você continua com o mesmo dinheiro no bolso. Se você for comprar os dois quilos de arroz, vai comprar menos das outras coisas”, argumentou.
Em suma, o que Nelson Barbosa traduziu no exemplo é que os seis decretos – num total de R$ 95,96 bilhões – aumentaram as alternativas que o governo tinha para aplicar o mesmo valor financeiro, fixado no decreto de contingenciamento, sem, no entanto, aumentar a sua despesa, o que comprova não ter havido ilegalidade. “A maior parte desse valor [R$ 95,96 bilhões] foi aberta pela anulação de outras dotações. Ou seja, se reduziu o valor de determinada ação para aumentar o valor de outra ação. Não há de se falar neste caso de aumento de limite orçamentário”.
O restante de R$ 2,5 bilhões em crédito suplementar, segundo o ministro, foi criado com a utilização do que se chama no jargão orçamentário de “superávit financeiro” ou “excesso de arrecadação”. Mais uma vez, sem aumento de limite orçamentário. Ele explicou ainda que, dentro desses R$ 2,5 bilhões, R$ 700 milhões foram destinados a pagamento de despesas financeiras (pagamento de encargos de dívidas e de juros) que por definição não entram no cálculo do resultado primário. Então, o questionamento, em termos de valor, se restringe a RS 1,8 bilhão dentro de um total de R$ 95 bilhões que foram objeto desses decretos. “Mesmo se fosse um centavo, os valores estariam completamente regulares com a lei fiscal e com a programação fiscal”.m
O deputado Paulo Teixeira (PT-SP), líder do governo na comissão, disse que todas as informações apresentadas deram “cristalina visão” de que todos os procedimentos adotados pelo governo foram corretos e rigorosamente dentro da lei. “Estamos aqui a julgar uma peça jurídica, que tem uma acusação. E essa acusação está a dizer: houve crime ou não houve crime? E ficou claro que essa acusação não tem base jurídica para prosperar. Não houve crime”, afirmou o parlamentar.
Para o deputado Henrique Fontana (PT-RS), líder da Bancada do PT no colegiado, é necessário o empenho de todos os parlamentares para garantir que as questões legais sejam consideradas, de forma a evitar que a comissão se transforme num tribunal político, que, segundo o parlamentar, seria um sinônimo de tribunal de exceção. Sobre os dados apresentados, disse estar claro que os decretos de suplementação são idênticos a outras dezenas e dezenas assinados por todos os presidentes que antecederam Dilma. “Como esse fato vai se transformar num crime para justificar a cassação de um mandato legitimado por 54 milhões de brasileiros? Quero que a oposição me responda, como antes não era crime e agora virou para cassar a presidenta”, questionou Fontana.
O deputado Carlos Zarattini (PT-SP) reforçou que as palavras tanto do ministro Nelson Barbosa como as do professor Ricardo Lode (UERJ) revelaram não ter havido nenhum desrespeito às normas e à legislação de gestão orçamentária e fiscal do País. “Temos que deixar isso claro, tudo o que disseram se contrapôs de forma total àquilo que foi dito ontem pelo doutor Miguel Reale Júnior e pela doutora Janaína Pachoal [autores do pedido de impeachment], que aqui vieram fazer discurso político, vieram fazer discurso mistificador. Por isso, temos que lutar, sim, para levar o mais longe possível os argumentos que foram apresentados pelo ministro Nelson Barbosa”, concluiu.
Do PT na Câmara