Jair Bolsonaro (PSL) deu o primeiro passo para acabar com as reservas indígenas no Brasil. Passou ao Incra, órgão vinculado ao Ministério da Agricultura, a tarefa de demarcação de terras. Além disso, Jair determinou, por meio da ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, que processos de demarcações só terão início após uma aprovação prévia de um conselho de ministros. Na prática, criou mecanismo para barrar a demarcação de terras.
Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, o conselho será formado por Damares e os ministros da Agricultura (Tereza Cristina), Meio Ambiente (Ricardo Salles), GSI (Augusto Heleno), Justiça (Sérgio Moro), Defesa (Fernando Azevedo) e Casa Civil (Onyx Lorenzoni). Em outras palavras, os processos de demarcações não terão a participação de nenhum indígena, além de ficar a cargo de ministérios e ministros ligados ao agronegócio.
Sônia Guajajara, da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) destacou que o conselho criado por Bolsonaro tem o único objetivo de travar as demarcações e é “totalmente desnecessário. Não tem sentido de existir esse conselho. Vai colocar cada vez mais poder exatamente naqueles que querem impedir demarcações”, disse a líder indígena à Folha.
A também líder indígena e deputada federal eleita Joênia Wapichana (Rede) disse que Bolsonaro desrespeitou a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), já que pelo novo processo, nenhum indígena será consultado. A convenção, por sua vez, determina a consulta prévia a povos indígenas sobre decisões do Estado que tenham impacto sobre a vida dos povos indígenas.
“O primeiro erro foi que não incluíram [no conselho] os povos indígenas. Não digo nem que é erro, é uma falta de consulta livre, informada, de novo. Além dessa reestruturação com a medida provisória, esse conselho mostra mais uma vez que [o governo] não atenta para os dispositivos legais, não considera as responsabilidades e as obrigações que firmaram em leis, que é a Convenção 169 da OIT.”
Ataques às reservas e assassinatos
Após a eleição de Bolsonaro em outubro de 2018, os ataques a comunidades indígenas vem se intensificando por todo país. Apenas algumas horas depois de fechadas as urnas, uma escola e um ambulatório foram incendiados na comunidade Bem Querer de Baixo, do povo Pankaruru, em Jatobá, no sertão de Pernambuco. Em novembro do ano passado, no dia 6, o líder indígena Reinaldo Silva Pataxó, de 40 anos, foi assassinado a tiros na aldeia Catarina Caramuru Paraguassú, em Pau Brasil (BA).
Pataxó já havia sido vereador no município e concorreu novamente em 2016, mas não conseguiu ser eleito. Segundo o jornal Folha do Cacau, a polícia ainda não tem informações sobre a motivação do crime, mas a principal suspeita é que esteja relacionado à disputa de terras na região.
No mesmo dia, o indígena Ava-Guarani Donecildo Agueiro, de 21 anos, do Tekoha Tatury, sofreu atentado a tiros após sair de reunião da Coordenação Técnica Regional da Fundação Nacional do Índio (Funai) sobre demarcação de terras indígenas na região de Guaíra, no Paraná.
Funai sob comando da mineração
O anúncio da criação do conselho, feito pela ministra Damares, ocorreu na Procuradoria Geral da República. E foi lá que a medida de Bolsonaro recebeu as primeiras críticas. A subprocuradora-geral da República Ela Wiecko criticou as mudanças no processo de demarcação e manifestou preocupação com a alteração. Ainda segundo a Folha, Ela também rebateu o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), o general da reserva Franklimberg Ribeiro de Freitas, que disse que anteriormente os processos de demarcações eram mais lentos pois tinham início com apenas um antropólogo e que agora haveria proteção aos povos indígenas.
Freitas, inclusive, trabalhou durante o segundo semestre do ano passado, poucos meses depois de pedir demissão da sua primeira passagem pela Funai, como conselheiro consultivo para assuntos indígenas, comunitários e ambientais da mineradora canadense Belo Sun Mining. A empresa é responsável por um dos maiores projetos de mineração do país que pretende, ao longo de um período de 12 anos, extrair 60 toneladas de ouro da região da Volta Grande do Xingu, no Pará. O empreendimento afetaria diretamente as tribos indígenas Juruna e Arara
“Proteger? Proteger o quê? Se o Incra vai ficar com a demarcação. Se o tal do conselho vai decidir se vai demarcar ou não demarcar. […] O senhor falou em embrião, disse que é um antropólogo. Não é verdade. É um grupo interdisciplinar que estabelece aquilo que o senhor disse que é um embrião. Mas é partir daquele embrião que nós vamos ter as terras demarcadas. E esse conselho vai partir do quê? Um conselho com o Ministério da Justiça para quê? Que não tem nada a ver com direitos humanos. Também não consigo entender”, disse a subprocuradora.
Da Redação da Agência PT de Notícias, com informações da Folha de S.Paulo