Partido dos Trabalhadores

Bolsonaro ignora crise e deixa milhões sem auxílio de R$ 600

Presidente e mais três ministros vetaram 11 pontos da lei que previa a extensão do benefício emergencial a dezenas de categorias profissionais. Só no campo, Contag estima que 1,7 milhão de famílias de agricultores e mais 6,8 milhões de trabalhadores rurais ficarão desamparados

Bruno Caramori

Na última quarta-feira (13), em mais uma de suas exibições gratuitas para adeptos em frente ao Palácio da Alvorada, o presidente Jair Bolsonaro usou o drama de vendedores de churrasquinho e de biscoito Globo em sua campanha insana contra as medidas de isolamento social. Dois dias depois, os esfaqueou pelas costas, e a outros milhões de trabalhadores entre os mais vulneráveis, ao publicar, no Diário Oficial da União desta sexta, a promulgação do Projeto de Lei 873/20, que expandia o auxílio emergencial de R$ 600 a dezenas de categorias profissionais.

Além do presidente, os cúmplices da perfídia contra os trabalhadores mais pobres – os ministros Paulo Guedes (Economia); Onyx Lorenzoni (Cidadania) e Damares Alves (Família, Mulher e Direitos Humanos) – assinam a publicação.

Em audiência sobre o projeto na Câmara dos Deputados transmitida pela internet em 16 de abril, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, tinha avaliado que a inclusão de novos beneficiários seria uma mudança significativa. “Tem impacto fiscal elevadíssimo, da ordem de R$ 10 bilhões, mas do ponto de vista social é fundamental”, admitiu. O argumento, aparentemente, não sensibilizou o ministro da Economia e nem o presidente da República.

A lista de beneficiários em potencial do auxílio que foram excluídos inclui profissionais informais que não estão inscritos no Cadastro Único, como pescadores artesanais, motoristas e entregadores de aplicativos, taxistas, diaristas, agricultores familiares, artistas, profissionais autônomos da educação física e catadores de material reciclável, entre outras categorias (veja a lista abaixo).

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) estima que até 1,7 milhão de pequenas propriedades da agricultura familiar seriam diretamente beneficiadas pela extensão do benefício. Mais 4,4 milhões de trabalhadores rurais dessas pequenas propriedades e 2,4 milhões de familiares também seriam beneficiados indiretamente.

Razões injustificadas

Bolsonaro alegou que o veto foi necessário porque, ao especificar algumas categorias profissionais em detrimentos de outras, a proposta ofende o princípio da isonomia e igualdade material previsto na Constituição. Além disso, o texto do Congresso cria despesa obrigatória para o governo sem indicar a fonte de custeio e o demonstrativo de impacto orçamentário e financeiro, como determina a emenda constitucional do Teto de Gastos (EC 95), conhecida por “Emenda da Morte”.

Bolsonaro e seus ministros também vetaram a possibilidade de homens solteiros chefes de família receberem em dobro o benefício emergencial. Pelas regras vigentes, apenas mães chefes de família têm a prerrogativa para os R$ 1,2 mil do auxílio emergencial. De acordo com o Ministério da Economia, somente a inclusão de pais solteiros poderia beneficiar 900 mil pessoas, com custo estimado em R$ 1,6 bilhão em três meses.

A ministra Damares Alves justificou os vetos à inclusão de pais solteiros entre beneficiários do auxílio-emergencial: ofende o interesse público

Damares Alves, que recomendou ao presidente o veto, alegou que a proposta “ofende o interesse público por não se prever mecanismos de proteção às mães-solo, que se constituem a grande maioria das famílias monoparentais”. Segundo a ministra, não havia mecanismos para impedir que pais ausentes se colocassem como chefes de família de forma fraudulenta para receber o benefício em vez das mães que cuidam das crianças.

Outro ponto importante vetado pelo governo é a mudança no Benefício da Prestação Continuada (BPC). O texto do Congresso ampliava o critério de renda para acesso ao benefício, de um quarto do salário mínimo para meio salário mínimo. Era a terceira vez que os congressistas tentavam alterar a regra do BPC – todas vetadas por Bolsonaro, com o argumento de que a mudança também cria despesa obrigatória para o governo sem indicar a fonte de custeio e o demonstrativo de impacto orçamentário.

“O BPC é como uma despesa continuada. As flexibilizações que forem dadas tanto do entendimento do Supremo como a PEC do Orçamento de Guerra não abrangem as despesas continuadas. Teríamos que elevar tributos ou cortar despesas de caráter permanente. Os ministérios já vinham com dificuldades de executar suas políticas”, disse o chefe da Assessoria Especial de Assuntos Institucionais do Ministério da Economia, Esteves Colnago, na audiência virtual da Câmara.

Foram vetados ainda os dispositivos que permitiam a cumulatividade do auxílio emergencial com o Bolsa Família e o que limitava o cancelamento de benefícios previdenciários (aposentadorias, pensões e BPC) durante a pandemia. No primeiro caso, o presidente alegou que a redação aprovada era confusa e gerava insegurança jurídica. No segundo, afirmou que a medida impediria o cancelamento de benefícios fraudulentos.

Projeto foi massacrado

No total, Bolsonaro vetou 11 pontos da proposta, que havia sido aprovada por unanimidade no Senado antes de seguir para sanção, em 22 de abril. Transformado na Lei 13.998/20, o texto manteve a extensão do benefício apenas para mães menores de 18 anos e para quem teve renda superior a R$ 28,5 mil por ano e, por isso, foi obrigado a declarar Imposto de Renda.

Com isso, 7,5 milhões de pessoas a mais terão direito a receber o benefício assistencial, e o impacto calculado pelo Ministério da Economia é de R$ 13,5 bilhões em três meses. Na conta não entra o cálculo da ampliação para as mães adolescentes.

Outros pontos mantidos na sanção da nova lei foram a proibição aos bancos de fazer descontos sobre os benefícios e a possibilidade de o auxílio substituir, temporariamente, os benefícios do programa Bolsa Família, quando for mais vantajoso. Esses dois pontos já existiam desde o início da vigência do auxílio emergencial, no mês passado.

Bolsonaro também manteve os dispositivos que permitem a suspensão da cobrança de parcelas do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) dos contratos adimplentes antes da vigência do estado de calamidade pública (20 de março). A suspensão varia de duas a quatro parcelas, podendo ser prorrogada a critério do governo.

Os vetos presidenciais serão analisados agora pelo Congresso Nacional, que pode acatá-los ou derrubá-los, restabelecendo a redação original.

Criado pela Lei 13.982/20, o auxílio emergencial é pago a pessoas que não trabalhem com carteira assinada ou recebam benefícios do governo (com exceção do Bolsa Família), e tenham tido renda em março de até meio salário mínimo (R$ 522,50) ou renda familiar de até três salários mínimos (R$ 3.135).

O orçamento para o pagamento das três parcelas do programa está em R$ 123,92 bilhões. De acordo com o SigaBrasil, um sistema de informações sobre orçamento público federal, o governo já gastou R$ 36 bilhões com esse benefício.

 

Veja as categorias barradas por Bolsonaro

Fonte: Agência Câmara de Notícias