Firme no compromisso de atender aos interesses americanos sem que nada de concreto para a soberania brasileira seja oferecido em troca, o presidente Jair Bolsonaro continua a roer a corda que mantém as relações entre Brasil e China, comprometendo o futuro do desenvolvimento tecnológico e econômico do país. Além do anúncio de cancelamento do acordo para compra da vacina chinesa CoronaVac, as últimas audiências do governo com a comitiva americana para tratar de acordos bilaterais indicam que a manipulação de Bolsonaro pelo governo Trump trará resultados concretos aos EUA na guerra comercial contra a China. O objetivo é a exclusão da empresa Huawei no leilão de 5G no Brasil, em 2021.
“Bolsonaro está subordinando os interesses brasileiros à estratégia geopolítica dos Estados Unidos”, criticou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “E os EUA não admitem que nenhum país da América Latina tenha relações com a China. Tratam a América Latina como quintal deles”, disparou Lula. Mais do que submeter-se à estratégia imperialista de sufocar qualquer pretensão da América do Sul de tornar-se um ator global, o governo brasileiro, ocupado por militares, mostra que não tem um plano de desenvolvimento tecnológico e industrial para o país.
“Se a gente tivesse uma estratégia, a gente poderia se beneficiar dessa guerra entre os gigantes para poder avançar, mas nós não estamos fazendo isso”, aponta o professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), de São Paulo, Sergio Amadeu, em entrevista ao ‘Brasil de Fato’. “O Bolsonaro é um cão adestrado do Trump. O Trump acena e ele vai atrás balançando o rabo”, lamenta Amadeu, que é especialista em tecnologia da informação.
A ofensiva dos EUA contra a China, na forma das declarações feitas pelo secretário de Estado americano, Mike Pompeo, e do Conselheiro do presidente americano para Assuntos de Segurança Nacional, Robert O’Brien ganhou uma resposta à altura. Rebatendo as alegações de que a presença da empresa Huawei representa uma ameaça à segurança do país, o porta-voz da Embaixada da China no Brasil, ministro-conselheiro Qu Yuhui, subiu o tom.
Em nota, o ministro acusou os EUA de hipocrisia e que “a comunidade internacional não se esquecerá do histórico sujo dos EUA na segurança cibernética”. E devolveu: “esses políticos americanos, no seu número pequeno, consideram abertamente ‘mentir, trapacear, roubar’ como a ‘glória’ dos Estados Unidos, e se tornaram em criadores de problemas que ferem a ordem internacional e ameaçam as regras internacionais”.
Ainda segundo o porta-voz chinês, “ao ignorar os fatos básicos e produzir comentários baseados na mentalidade de guerra fria e jogo de soma zero, eles têm como objetivo real servir a certos interesses políticos, tirar proveito político dos ataques que difamam a China, atrapalham a cooperação internacional e instam a confrontação. A China se opõe fortemente a isso”.
Recado ao Brasil
Na nota, o representante da China ainda mandou um recado ao governo brasileiro, lembrando da disposição de Pequim em cooperar com o país desde o início da pandemia de Covid-19. Qu Yuhui destacou a doação de materiais, transferência de conhecimento sobre diagnóstico e tratamento da doença, além das parcerias “estreitas” no desenvolvimento de vacinas para o Brasil.
“Enquanto isso, os EUA vêm agindo contra o espírito humanitário básico e até retiveram materiais médicos urgentes, inclusive respiradores, que foram enviados da China ao Brasil, numa tentativa maléfica de atrapalhar a cooperação normal entre a China e o Brasil”, acusou.
Huawei nega problemas de segurança
Uma das alegações de Robert O’Brien para excluir a Huawei do leilão brasileiro é que a tecnologia 5G chinesa representa um risco para a segurança de dados estratégicos. Na terça-feira (20), a empresa se defendeu das acusações e garantiu que, “em 30 anos de atuação”, nunca houve “um grande incidente relacionado à segurança nos 170 países em que opera”, De acordo com comunicado da empresa, “a Huawei tem a confiança de mais de 2 bilhões de consumidores”.
Sobre banimento do leilão por questões de segurança a empresa apresentou argumentos técnicos. “Banir operadores específicos com base na origem do país não fará nada para proteger as redes de comunicações”, justificou a Huawei. “Tal ação ampliará ainda mais a exclusão digital, desacelerando o ritmo do desenvolvimento econômico sem proteger as redes de telecomunicações”, disse a empresa, no comunicado.
Da Redação, com informações de ‘Brasil de Fato’, ‘Valor’ e ‘Reuters’