É preocupante a conjuntura do Brasil hoje: há “situações típicas de um Estado de exceção”, com “situações anormais aceitas como naturais por parte da população”. É o que avalia o presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) e juiz brasileiro, Roberto Caldas.
Entrevistado pelo jornal argentino “Pagina/12”, Caldas foi questionado sobre a tentativa de impeachment da presidenta Dilma Rousseff e sobre a metodologia da Operação Lava Jato. O jurista afirmou ver “com preocupação o avanço de elementos próprios de um Estado de exceção no Brasil”.
“Recordemos que já tivemos a experiência de golpes na Venezuela em 2002 e em Honduras em 2009 e esperamos que isso não aconteça novamente em nosso continente”. Nos dois casos, a Corte IDH considerou que houve um golpe de Estado.
“Não podemos olhar para o lado quando surgem ameaças à estabilidade institucional através de situações anômalas que podem terminar com a legalidade. Hoje não se põe fim à democracia com a intervenção de forças armadas, agora isso acontece por meio de outros mecanismos. A situação do Brasil preocupa muitos povos latino-americanos”, disse.
“O mais grave, no entanto, é que haja uma parte da sociedade que defende a quebra dos princípios elementares, que apoia a violação de garantias fundamentais e da privacidade de pessoas que sequer estão sendo processadas”, opinou.
Segundo o jurista, o Brasil conta com uma lei “que permite a gravação telefônica e seu uso como meio de provas em um processo penal”, mas a divulgação das gravações não está prevista na lei, “que só permite que se transcreva o que foi dito, mas jamais se pode divulgar o áudio da gravação”.
“O vazamento à imprensa de um processo que está sob segredo judicial é uma violação séria e se isto se repete com frequência configura uma excepcionalidade ao regime constitucional”, criticou.
De acordo com ele, a divulgação na imprensa de um processo que transcorre em segredo judicial é vetada. “Em primeiro lugar para não violar a autoridade do Poder Judicial, em segundo para não afetar a marcha da investigação e por último para não afetar a imparcialidade dos magistrados que julgam a causa através da pressão da opinião pública”.
“Para nós a função da imprensa é fundamental” (…) “a liberdade de expressão é um pilar fundamental do Estado Democrático de Direito”. “A liberdade de expressão não é absoluta e não pode se antepor a direitos humanos fundamentais e à garantia de um processo justo. A divulgação indiscriminada de gravações não pode violar a dignidade e a privacidade dos cidadãos”, disse Caldas.
Caldas tomou posse em janeiro na presidência da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Ele era vice-presidente da Corte e juiz da instituição desde 2013. Entre as principais atribuições do órgão está zelar pela correta aplicação e interpretação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos por todos os países que firmaram o tratado em 1969.
Da Redação da Agência PT de Notícias