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Brasil volta a ser apontado como próximo epicentro

Presidente do Instituto Butantan, que comanda combate à pandemia em São Paulo, alerta para progressão do país na escala de casos e mortes. Pesquisadores da UFMG projetam falta de leitos de UTI a partir de maio na maioria dos estados. Números oficiais: 881 mortes em 24 horas, somando mais de 12 mil óbitos

Cris Vektor | www.instagram.com/crisvector

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro usa de todos os recursos disponíveis para sabotar as medidas de isolamento social, o coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus no Estado de São Paulo, Dimas Covas, alertou nesta terça, 12, que o Brasil pode se tornar um dos epicentros da pandemia global de coronavírus, caso a marcha atual da Covid-19 no país não seja revertida. O país registra 881 mortes nas últimas 24 horas e ultrapassou a marca de 12 mil óbitos por Covid-19, com 177.589 infectados. É o pior dia da pandemia em mortes registradas.

Covas, que também é presidente do Instituto Butantan, lembrou, em entrevista coletiva, que embora a epidemia do coronavírus no Brasil tenha começado depois do que ocorreu em países da Europa, o número de mortes confirmadas pela doença em território nacional já ultrapassou o de vários países europeus.

“Em número de casos, o Brasil é o oitavo país do mundo, em número de mortes é o sexto país do mundo. Nós ultrapassamos, em termos de mortes, países como a Bélgica, Alemanha, Holanda, Canadá e a China. Isso mesmo considerando que nós estamos ainda numa fase inicial da evolução da epidemia”, disse. Covas coordena o centro de contingência devido à licença médica do infectologista David Uip.

“Nós estamos progredindo nessa escala, cada vez mais aproximando do topo. Isso mostra a importância do Brasil como um dos centros da epidemia e que poderá se tornar, se essa marcha não for invertida, talvez um dos epicentros mundiais”, acrescentou o médico.

São Paulo bate recorde

Segundo a Secretaria de Saúde, há em São Paulo 47.711 casos confirmados de Covid-19, com 3.949 mortes. A grande preocupação é com o aumento do número de casos no interior do Estado, que cresceu 99% nos últimos onze dias, de 4.389 para 8.733 casos confirmados. O secretário de Desenvolvimento Regional, Marco Vinholi, informou que, na última semana de abril, 40 cidades tinham registrado casos da Covid-19. Na primeira semana de maio, esse número mais que dobrou: eram 85 municípios.

Todos os municípios com mais de 70 mil habitantes já têm registros de Covid-19 e a epidemia começa a avançar para cidades menores. A previsão é até o final do mês o vírus esteja circulando em todas as cidades paulistas.

“A doença tem um crescimento exponencial e tem um dado que a gente às vezes observa pouco. Praticamente 80% dos municípios de São Paulo têm menos de 20 mil habitantes. E desses, 25% tem menos de 10 mil habitantes. E normalmente um município com menos de 10 mil habitantes não possui um leito hospitalar. E temos casos já em 25% desses municípios com menos de 10 mil habitantes. Isso é um dado extremamente preocupante”, disse Geraldo Reple, presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado.

Vinholi apontou que o número de novos casos já cresce de forma mais acelerada no interior do que na região metropolitana. “É fundamental que a gente possa seguir com as medidas de isolamento social e também da utilização de máscaras”, completou.

Brasil bate novo recorde e registra 881 mortes em apenas 24 horas. Número de óbitos no país cresce e já supera muitas nações europeias

Números e projeções preocupantes

Na sexta, 8, Covas disse que em 31 de maio, o Estado, de longe o mais atingido pela doença no Brasil, deve chegar a entre 90 mil e 100 mil casos confirmados, com 9 mil a 11 mil mortos. “Isso tudo considerando 55% de afastamento social. Se a taxa for menor, certamente esses números serão piores”, ressaltou.

No mesmo dia, o governador de São Paulo, João Doria, anunciou a prorrogação das medidas de isolamento social no Estado até 31 de maio. O governo já não descarta adotar medidas mais rígidas, incluindo lockdown (bloqueio).

Indagado sobre os critérios para a decisão, Covas respondeu: “O sistema de saúde está nocauteado e você precisa tomar medidas que são drásticas. Ou seja, você para totalmente a circulação do vírus, porque o vírus anda com as pessoas e se você faz o trancamento, você impede que o vírus circule e, portanto, dali a 15, 20 dias, você vai observar uma queda de número dos casos. Então isso é muito importante, porque a capacidade do atendimento de saúde é o que determina a necessidade do que você chamou de lockdown”.

Segundo o médico, a medida pode ser deflagrada se a taxa de ocupação de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) se aproximar de 100%. Conforme a Secretaria Estadual de Saúde, São Paulo tem 69,1% dos leitos de UTI ocupados, índice que sobe para 85,7% quando considerada apenas a região metropolitana da capital paulista. No momento, 9.535 pacientes com confirmação ou suspeita de Covid-19 continuam internados em enfermarias ou UTIs em todo o estado.

Esgotamento de UTIs

Há algumas semanas, o Ministério da Saúde prometeu que passaria a divulgar dados consolidados sobre a ocupação de leitos gerais e de UTI, mas esse censo hospitalar ainda está em fase de implantação. Um modelo matemático criado por pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no entanto, projeta que, até o fim de maio, mais da metade do país pode atingir a ocupação máxima dos leitos de UTI no Sistema Único de Saúde (SUS).

Segundo os cientistas, no sistema privado menos locais atingirão o limite de suas unidades em maio. Mas até o fim de junho a maioria dos estados deverá ter os leitos particulares e públicos lotados.

Durante o período de ocupação máxima, a falta de UTIs no sistema público pode atingir cerca de 20 estados e durar, em muitos casos, aproximadamente dois meses. No sistema particular, com mais leitos proporcionalmente, a carência de vagas será de cerca de um mês. Em ambos os sistemas, o tempo de internação em UTI de pacientes com a Covid-19 pode variar de 21 a 35 dias.

De um modo geral, a expectativa é que a falta de leitos de UTI comece a ocorrer duas semanas antes no SUS do que no sistema privado. A razão disso é que, além de atender cerca de 75% dos brasileiros, o SUS tem somente 1,4 leito de UTI, em média, para cada dez mil habitantes. No sistema privado, são 4,9 leitos por 10 mil segurados.

Oferta de leitos menor

Em alguns estados do Norte e do Nordeste, onde a oferta de leitos públicos é menor, maio será marcado pela ocupação máxima tanto dos leitos do SUS quanto dos privados. No Sudeste, as vagas de UTI do SUS podem acabar neste mês em São Paulo e no Rio de Janeiro.

A estimativa se altera conforme as medidas tomadas em relação ao distanciamento social. Mantida a tendência de ascendência da curva de contágio, o Brasil poderá registrar mais de 40 mil infecções diárias após a primeira semana de junho e um déficit de leitos de UTI acima de 20 mil ao final do próximo mês. Em São Paulo, os casos ultrapassariam os nove mil ao dia e o déficit de leitos de UTI chegaria a quase cinco mil.

A ferramenta do Departamento de Engenharia de Produção e pelo Núcleo de Educação em Saúde Coletiva (Nescon), órgão de ensino e pesquisa da Faculdade de Medicina da UFMG, pode ser consultada no endereço https://labdec.nescon.medicina.ufmg.br.

Da Redação