Quase no final de seu discurso no encerramento dos trabalhos do Gabinete de Transição, na tarde desta terça-feira (13), o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva acabou com o suspense envolvendo rumores sobre a indicação do coordenador da Equipe de Transição, Aloizio Mercadante, para presidir o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDES). O nome de Mercadante foi oficialmente anunciado por Lula.
“Eu, Aloizio Mercadante, ouvi algumas críticas sobre você, sobre boatos de que será o presidente do BNDES. Quero dizer que não é mais boato, Aloizio Mercadante será presidente do BNDES”, confirmou Lula, arrancando aplausos da plateia. “Precisamos de alguém que pense em desenvolvimento, em reindustrializar esse país, em inovação tecnológica, em financiamento ao pequeno, médio e grande empresário, para que o país volte a gerar emprego”.
“Queremos dizer ao mundo inteiro: quer vir para cá, venha, tem trabalho, tem coisas para fazer, tem projeto novo para investimento. Mas não venham aqui para comprar nossas empresas públicas, porque elas não estão à venda. E nosso país vai voltar a ser respeitado, com soberania”, advertiu Lula.
Ao chamado “mercado”, Lula lançou um desafio: “Ao tentarem julgar o que estamos fazendo, digam se, em algum momento da vida do mercado brasileiro, ganharam tanto dinheiro como de 2003 a 201o, quando presidi o país”.
E arrematou: “Nós provamos que é possível governar para todos de verdade e isso significa que o crescimento do PIB não é um número para manchete de jornal. Crescimento só tem sentido se a gente distribuí-lo com aqueles que o produziram, que é o povo trabalhador desse país”.
Radiografia do estrago bolsonarista
“Acho que teremos uma radiografia perfeita do estrago que foi feito nesse país”, afirmou o presidente, ao comentar e agradecer o trabalho do Gabinete de Transição. Lula também mencionou o voto do povo brasileiro e todos os apoios que recebeu durante a mais dura campanha eleitoral desde a redemocratização.
“Nunca o Estado e suas instituições estiveram tão a serviço de um candidato como agora, na defesa campanha do senhor Bolsonaro”, constatou Lula. “Ele é uma figura anômala, irracional, sem sentimento, incapaz de expressar solidariedade, que não chorou uma lágrima por quase 700 mil pessoas que morreram de Covid-19”, definiu o presidente.
Lula condenou Bolsonaro por incentivar os atos golpistas de seus apoiares que, assim como o ocupante do Planalto, não reconhecem o resultado das eleições. “Ele segue o rito de todos os fascistas no mundo”, advertiu Lula, citando outros líderes mundiais da extrema direita.
“Governar é cuidar das pessoas”
Para espantar o fantasma do extremismo é preciso governar com espírito público, defendeu Lula. “Cabe a nós agora mostrar, companheiros e companheiras, outra vez à sociedade brasileira, como se governa um país: cuidando das pessoas que precisam ser cuidadas”, clamou Lula.
Lula afirmou que, além do compromisso de garantir três refeições diárias a todos os brasileiros, irá assumir em janeiro outro com a educação básica. “Não é possível que a gente não compreenda a necessidade desses meninos e meninas terem escola de qualidade, inclusive de tempo integral”, disse.
Defesa do SUS
Ele também afirmou que a saúde não pode continuar como está. “Não é possível que, depois da pandemia”, a gente não compreenda o papel do importante, sagrado que tem o SUS na história desse país”.
Lula criticou os que tentam deteriorar a imagem do SUS, como parcela da imprensa e do setor privado. “As pessoas se esquecem que a cada ano diminui a quantidade de dinheiro colocada no SUS”.
Lula voltou a assegurar que vai trabalhar ininterruptamente pelos próximos quatro anos para devolver a alegria de viver à população brasileira. “Não haverá chuva, sol, nada nesse mundo, a não ser Deus, que me proíba a fazer esse país voltar a sorrir, ser alegre e esse povo acreditar que é possível acabar com o complexo de vira-lata. Não somos inferiores a ninguém”, defendeu.
Diálogo participativo
O vice-presidente Geraldo Alckmin e coordenador do Gabinete de Transição do governo eleito agradeceu ao presidente eleito pelo convite para que coordenasse o Gabinete de Transição.
“O presidente Lula percorreu o Brasil, de norte a sul, leste-oeste, fazendo reuniões com movimentos culturais, cooperativas, sociedade civil organizada, educação, meio ambiente, com uma enorme participação”, lembrou.
“Podemos dizer que essa foi a transição mais participativa de todos os governos”, constatou o vice-presidente eleito. “Foram mais de cinco mil pessoas que contribuíram de maneira voluntária”, destacou. “Participativa, democrática, técnica, reunindo os melhores quadros de todas as áreas, transparente e com menos recursos”, emendou.
Alckmin comparou a transição com a feita por Bolsonaro, que convidou apenas 233 pessoas para o grupo de trabalho mas, ao contrário da atual equipe, ocupou todos os cargos que a lei estabelece, 43, enquanto o grupo de Lula nomeou quase metade, 22. O vice-presidente também fez questão de agradecer aos coordenadores Aloizio Mercadante, Gleisi Hoffmann e Floriano Pesaro por suas contribuições.
Reestruturação do Estado brasileiro
A presidenta Nacional do PT e coordenadora do Gabinete de Transição Gleisi Hoffmann reforçou a importância do trabalho técnico dos grupos de transição para uma reestruturação do Estado brasileiro. “Nós temos projeto para o país, que é muito diferente deste que está aí, de destruição das políticas públicas”, comparou Gleisi. “Queremos colocar o povo na centralidade do orçamento”, disse.
Gleisi fez um apelo para que a Câmara dos Deputados tenha sensibilidade e aprove a PEC do Bolsa Família, sem a qual não haverá orçamento para o ano que vem. “O presidente precisa entrar no ano que vem mostrando resultados, é o que as pessoas estão esperando”, alertou.
Mercado financeiro
Gleisi reagiu às críticas do mercado financeiro à PEC. “Onde estava essa gente, que não criticou Bolsonaro quando gastou mais de R$ 800 bilhões e não estruturou nenhuma política pública para melhorar a vida das pessoas?”, indagou a petista.
Ela também agradeceu aos 16 partidos que integram o Conselho Político da Transição e contribuíram para a elaboração da PEC e a participação de parlamentares. E falou do papel dos movimentos sociais. “Constituímos um conselho com mais de 50 entidades representativas dos movimentos sociais”.
Relatórios e diagnóstico
“Tivemos 940 pessoas aqui e por que não houve ruído, crise?”, perguntou Mercadante. “Porque há uma história longa de militância nesse processo, 13 anos de governo, um acúmulo de políticas públicas, com ministros, ex-ministros, secretários, militantes, lideranças de movimentos”, explicou o presidente da Fundação Perseu Abramo e futuro chefe do BNDES.
Mecadante chamou a atenção para a riqueza de detalhes de todos os relatórios e garantiu que não poderia haver “melhor ponto de partida” para o primeiro escalão que ocupará a Esplanada dos Ministérios a partir de 1º de janeiro. “Foi esse trabalho que organizou a PEC do Bolsa Família”, apontou.
“O governo diz que a situação fiscal do país está boa. Boa para quem?”, questionou Mercadante. “A gente olha para a educação, não tem livro didático, reajuste escolar, bolsa de estudo do Capes, reajuste para residência médica… Na saúde, não tem recursos para o Farmácia Popular, tratamento de câncer”, enumerou.
O petista frisou que todas as áreas sobre a quais o Gabinete de Transição se deteve carecem de recursos. Ele lembrou que várias das situações de calamidade causadas pelo atual desgoverno foram detalhadas nas coletivas dos grupos de trabalho. “Quem está pagando a conta desse apagão fiscal são os pobres, aqueles que mais precisam do Estado, de políticas públicas de qualidade”.
“Mas esse governo vai reconstruir esse país, retomar a esperança e mudar a história do Brasil”, festejou.
Da Redação