Partido dos Trabalhadores

Construção prevê alta de 4,1% em 2024, mas juros do BC são freio para 2025

Presidente da Cbic, Renato Correia cita preocupação com o impacto que a aceleração do aumento da taxa Selic, que pode chegar a 14,25% ao final de março de 2025, poderá ter sobre os lançamentos

Tânia Rêgo/Agência Brasil

O setor da construção, fundamental para o crescimento da economia e a geração de empregos, acumula avanços durante o governo Lula

A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (Cbic) elevou para 4,1% a previsão de crescimento de suas atividades em 2024. Ao longo deste ano, as estimativas da entidade foram elevadas em quatro ocasiões. Em dezembro de 2023, esperava-se uma alta de apenas 1,3%. No ano passado, houve queda de 0,3%.

Para 2025, no entanto, o ciclo de alta de juros faz com que a Cbic projete uma alta menor, de 2,3%. Em entrevista coletiva de imprensa, na segunda-feira (16), o presidente da Cbic, Renato Correia, citou preocupação com o impacto que a aceleração do aumento da taxa Selic, que pode chegar a 14,25% ao final de março de 2025, poderá ter sobre os lançamentos no próximo ano.

“Há a possibilidade de termos bem menos lançamentos para a classe média”, diz. Para ele, será um ano mais “desafiador”.

Leia maisGleisi: alta da Selic é decisão “irresponsável, insana e desastrosa ao país”

Os juros mais altos aceleram a retirada de recursos da poupança, usados para financiar o cliente de classe média e também parte das próprias obras das incorporadoras. A entidade destacou que a caderneta de poupança teve, em 2024, seu quarto ano seguido de saques. Ieda Vasconcelos, economista da Cbic, explica que o ritmo dos saques caiu neste ano quando a Selic também caiu, mas que agora, isso deve se reverter.

Mesmo com a elevação dos juros, a inflação permanece alta, e a do setor, medida pelo Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) está acima do IPCA. O indicador acumula alta de 6,34% nos últimos 12 meses até novembro, ante 4,87% do IPCA.

“Não vai vender”

O cenário de elevação de custo para as obras e o financiamento mais caro atrapalham a recuperação das margens das incorporadoras e construtoras, já que “a renda do consumidor não subiu”, como explica Correia. “Se tiver que repassar no preço [da unidade], ele vai desencaixar da renda, é mais um motivo para não lançar, porque você não vai vender.”

O segmento de imóveis populares, que entram no programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV), é mais protegido dessa dinâmica, pois conta com financiamento com recursos do FGTS, tanto para as obras quanto para os clientes, a juros menores e fixos.

Porém, Correia adianta que pode ser preciso rever o teto de valor do programa, ou seja, o preço máximo de venda das unidades, hoje em R$ 350 mil, a depender do aumento de custos de produção. “É o alerta que fazemos, para que, no começo do ano, possamos avaliar [o aumento do teto], para ter o programa entregando fortemente sobre esse ano.”

Leia maisAlta da Selic é “incompreensível e totalmente injustificada”, afirma CNI

O saldo tem sido positivo, com aumento de 28% no número de unidades financiadas com recursos do FGTS, onde entram aquelas do MCMV, de janeiro a outubro, em comparação com o mesmo período de 2023. O número de unidades financiadas com recursos da poupança subiu 12,8% no mesmo período.

Esse resultado em 2024 é o que deve sustentar a atividade da construção imobiliária em 2025, explica Vasconcelos, porque o que foi lançado precisa ser construído. O impacto maior na atividade do setor pode vir em 2026.

Mais entidades preveem alta em 2024

Na semana passada, outras entidades da construção também divulgaram suas projeções para 2024 e 2025. De acordo com o Sinduscon-SP, sindicato das construtoras do estado de São Paulo, o PIB do setor deve crescer 4,4% neste ano e 3% em 2025, em nível nacional.

A Associação Brasileira da Indústria de Material de Construção (Abramat) aponta alta de 5,5% no faturamento dos associados em 2024 e espera alta de 3% em 2025.

Lula aponta “irresponsabilidade” do BC

Por diversas vezes desde que tomou posse, o presidente Lula alertou para os danos causados à economia pela política de juros altos do Banco Central, presidido pelo bolsonarista Roberto Campos Neto.

No domingo (15), Lula reforçou as críticas ao BC, durante entrevista ao Fantástico, da Rede Globo, afirmando que a condução da política monetária com seguidas elevações da taxa de juros é uma “irresponsabilidade”. “A irresponsabilidade é de quem aumenta a taxa de juros todos os dias”, declarou.

“A única coisa errada nesse País é a taxa de juros, que está acima de 12%”, acrescentou o presidente. “Essa é a coisa errada. Não há nenhuma explicação. É uma inflação totalmente controlada. A irresponsabilidade é de quem aumenta a taxa de juros todo dia. Não é do governo federal. Mas nós vamos cuidar disso também.”

Nessa mesma entrevista, Lula também enviou uma mensagem ao mercado, afirmando que “ninguém tem mais responsabilidade fiscal do que ele”. “Ninguém nesse País, do mercado, tem mais responsabilidade do que eu. Não é a primeira vez que eu sou presidente da República”, disse. “Não é o mercado que tem que se preocupar com os gastos do governo. É o governo.”

Selic alta é “picaretagem”

A política de juros altos do Banco Central foi duramente criticada também por Ladislau Dowbor, professor de economia da PUC-SP e consultor de várias agências internacionais. Em entrevista publicada pelo site GGN na sexta-feira (13), Dowbor afirmou que a recente decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de elevar a Selic em 1 ponto percentual, para 12,25% ao ano, é uma “picaretagem política generalizada”, voltada para interesses do mercado financeiro e de gigantes mundiais, como a BlackRock e o JP Morgan.

“A primeira coisa [para entender] é o seguinte: quem é que faz aplicação financeira? Aqui chamam de investimento, mas é aplicação financeira. Investimento é quando você produz alguma coisa que aumenta o estoque de capital. Aqui são aplicações financeiras, mas na realidade é especulação”, afirmou o professor.

Leia maisZeca Dirceu coloca especuladores do mercado financeiro na mira do CADE

Dowbor chamou a atenção para o fato de que 75% das famílias brasileiras não fazem aplicações porque mal conseguem “fechar o mês” com a renda que recebem.

Segundo o professor, além de atender aos interesses de 1% da população mais rica do país, a alta de 1 ponto percentual da Selic não faz jus à realidade econômica do país, que teve 0,9% de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre, mas sim a um processo de apropriação dos tributos pagos pela população. Isso porque o 1% mais rico tem entre 10% e 15% do Tesouro Direito, em que os investidores compram títulos da Dívida Pública Federal.

“O segundo ponto muito importante de entender é o seguinte, esse estoque da dívida de mais de R$ 7 trilhões, não é que o Estado construiu universidades, fez coisas úteis e se endividou para isso. Não, são esses bancos, esses grupos financeiros, eles vão comprando títulos do governo financiado pela Selic e a Selic dá os juros para eles e eles reaplicam esses juros, (7:38) o que vai aumentando a dívida e aumentando o volume de dinheiro dos nossos impostos transferidos para esses grupos”, resumiu Dowbor.

Da Redação, com informações de Valor Econômico e GGN