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Covid-19: morre um idoso e uma família cai na pobreza, alerta estudo

Com o agravamento da crise, famílias enfrentam impacto duplamente trágico: a perda de pais e avós e, com eles, a principal fonte de renda da família. Levantamento do Ipea aponta que cerca de 4 milhões de adultos e 1 milhão de crianças e adolescentes podem entrar na zona da pobreza com a perda de renda de idosos vítimas da Covid-19. Nesta terça-feira (25), o país ultrapassou a marca de 115.646 mortes e 3.636.167 milhões de infectados. “A doença afetou os idosos em duas vertentes: primeiro que eles morrem mais, segundo porque são os primeiros a perder o emprego por pertencerem ao maior grupo de risco de contrair o novo coronavírus”, diz Ana Amélia Camarano, autora do estudo

Nesta terça-feira (25), o país ultrapassou a marca de 115.646 mortes e 3.636.167 milhões de infectados por Covid-19. O alto platô de mil mortes por Covid-19 em média continua ampliando o alcance da pandemia do coronavírus no Brasil, atingindo principalmente as populações mais vulneráveis e empurrando milhões para a extrema pobreza. Com o agravamento da crise econômica, famílias afetadas pelo desemprego enfrentam um impacto duplamente trágico: a perda de pais e avós e, com eles, a principal fonte de renda da família.

Além da dor e do luto, a morte de idosos, o grupo mais suscetível à ação letal do vírus, representa uma preocupação real para a sobrevivência de milhões de brasileiros que dependem da renda de aposentados para sobreviver. Segundo um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), cerca de 4 milhões de adultos e 1 milhão de crianças e adolescentes de até 15 anos podem entrar na zona de pobreza com a perda da renda de idosos vítimas da Covid-19, caso o platô de mortes for mantido no atual patamar.

“Chama-se a atenção para o fato de que o idoso é vítima duas vezes nessa pandemia: é quem morre mais e quem é mais afetado pelo desemprego”, diz a pesquisadora Ana Amélia Camarano, autora do estudo do Ipea. “No entanto, o seu papel nas famílias é pouco reconhecido. Acho que se pode falar que se morre um idoso, uma família entra na pobreza”, aponta Camarano no texto do levantamento intitulado “Os dependentes da renda dos idosos e o coronavírus: órfãos ou novos pobres?”.

A pesquisadora utilizou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua, que indicava, em 2018, que nos 71,3 milhões de domicílios brasileiros, 33,9% contavam com pelo menos um idoso residente. Nos domicílios, onde moravam 62,5 milhões de pessoas, 30,1 milhões eram não idosas, e 16,6 milhões não trabalhavam.

A pesquisa mostrou que, em média, domicílios com moradores idosos têm renda maior do que aqueles onde não há nenhum. A contribuição do idoso chegava a 69,8% da renda dos domicílios, sendo que 56,3% da renda era proveniente de pensões ou aposentadoria.

“A importância da renda do idoso para as famílias é bastante alta no Brasil”, afirmou Camarano, em entrevista recente à ‘BBC News’. “Isso ocorre por causa das dificuldades que jovens e adultos enfrentam para entrar no mercado de trabalho. Muitos deles, sem emprego e sem dinheiro, voltam para a casa dos pais e acabam sendo bancados por eles”, observou a pesquisadora.

Mortes de idosos

Segundo Camanaro, o quadro é preocupante: até julho de 2020, 73,8% das mortes por Covid-19 ocorreram entre as pessoas com 60 anos ou mais, sendo 58% homens. “A doença afetou os idosos em duas vertentes: primeiro que eles morrem mais, segundo porque são os primeiros a perder o emprego por pertencerem ao maior grupo de risco de contrair a Covid”, disse Camanaro ao ‘Portal da CUT’.

Em 20,6% dos 71,3 milhões de domicílios do país, a renda do idoso representa mais de 50% do total do orçamento das famílias. Se esses idosos morressem, o rendimento médio per capita cairia deR $ 1.621,80 para  R$ 425,50. “O impacto seria muito grande, uma redução de quase 75%, que afetaria cerca de 11,6 milhões de pessoas, sendo 2,1 milhões com menos de 15 anos”, destaca o estudo.

Desemprego

A crise econômica do país fez com que muitos filhos e netos voltassem a morar com idosos, aumentando a pressão sobre a renda familiar.  “A pandemia só reforça esse tipo de arranjo familiar. As casas, que chamo de ninhos familiares, se antes ficavam vazios, normalmente com uma idosa morando sozinha, hoje a ordem mudou, até por conta dos empregos instáveis, da dificuldade de transição para a vida adulta e das relações afetivas que resultam em separações de casais”, declarou Ana Amélia ao ‘Portal da CUT’. Essa pressão, segundo ela, pode aumentar ainda mais com a escalada do desemprego no país.

A pesquisadora comentou a situação dramática na qual muitos idosos não se sentem no direito de morrer para não deixar as famílias na mão. “Eu lembro de uma médica contando o caso de um idoso de mais de 80 anos que disse a ela que não podia morrer porque precisava sustentar os dois netos”, relatou.

No estudo, a pesquisadora faz questão de ressaltar que as projeções levam em conta “situações extremas”, com a renda completamente eliminada pela morte dos idosos . “O que se sabe que está acontecendo neste momento é uma diminuição da renda do trabalho pelo desemprego em todas as idades e pelo corte de salários e, também, o aumento da mortalidade da população, em especial da idosa”, diz a nota. “São duas faces da pandemia, que afetam a renda das famílias e deixam em destaque o papel dos idosos brasileiros e a contribuição da Seguridade Social para a sua sobrevivência”, destaca.

Famílias afetadas pela pandemia

Uma pesquisa divulgada nesta terça-feira pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), feita em parceria com o IBOPE, aponta que as famílias brasileiras mais afetadas pela crise decorrente da pandemia foram as que possuem crianças e adolescentes, em especial as mais vulneráveis. Segundo o levantamento, que ouviu 1.516 pessoas entre 3 e 18 de julho, houve redução expressiva de renda e um aumento da insegurança alimentar desde o início do surto.

Entre os entrevistados, 55% afirmam que o rendimento de seus domicílios diminuiu desde o começo da pandemia. Os impactos foram maiores nas famílias com crianças e adolescentes: 63% viram sua renda diminuir. Entre a parcela mais pobre, a redução atinge 67% dos que possuem renda familiar de até um salário mínimo, ante 36% daqueles com renda familiar de mais de 10 salários.

“A pesquisa deixa claro que os impactos econômicos e sociais da pandemia afetam mais crianças, adolescentes e suas famílias”, argumenta Liliana Chopitea, chefe de políticas sociais, monitoramento e avaliação do UNICEF no Brasil, no comunicado da agência. “Para além dos benefícios temporários, é importante que os programas regulares de proteção social incluam, de maneira sustentável, todas as famílias vulneráveis”, recomenda.

Aumento da insegurança alimentar

A pesquisa encomendada pela agência  também constatou um agravamento no quadro de segurança alimentar no país: um em cada cinco brasileiros (21%) passou pela situação que ver a comida acabar em casa e não dispor de recursos para renovar o estoque. Entre as famílias com crianças e adolescentes, o percentual subiu para 27%.

Além disso, quase metade (49%) da população brasileira com 18 anos ou mais declarou ter mudado os hábitos alimentares durante o período de Covid-19 no Brasil, com aumento de consumo de comida industrializada.

“Estamos diante de um cenário preocupante de má nutrição”, alerta a chefe de Saúde no Brasil da agência, Cristina Albuquerque. “Essa situação impacta prioritariamente as populações mais vulneráveis com efeitos a longo prazo. É fundamental atuar imediatamente para reverter esse cenário e garantir o acesso de meninas e meninos a uma alimentação adequada e saudável”, observa.

Da Redação, com informações de ‘CUT’, ‘BBC News’ e ‘UNICEF Brasil’