Criança também tem o direito à participação política. Com esse entendimento, a Frente Povo Sem Medo organizou uma atividade lúdica para as crianças na tarde do último domingo (3), em Brasília (DF).
“O intuito do ato é falar que política também é coisa de criança. Política, liberdade, respeito ao outro, alteridade. Isso também é coisa de criança”, afirmou a advogada Diana Melo, mãe de João Francisco, de 3 anos.
No ato, as crianças cantaram, brincaram e pintaram cartazes com frases em defesa da democracia e contra o golpe. E é justamente a defesa da democracia, segundo o economista e membro da Frente Povo Sem Medo, Chico Carneiro, que unifica os participantes.
Para ele, crianças também têm direitos e precisam participar para que a democracia se fortaleça no Brasil.
Tamires Gabriele de Jesus, 10 anos, e Daniela Vitória de Souza, de 12 anos, concordam. Para elas, as crianças precisam falar de política e também devem ir aos atos e defender a democracia. “Criança também é para estar na luta”, afirmou Tamires.
“O ato foi protagonizado pelas crianças, onde elas estão mostrando o seu direito de participação política, lutando para que isso possa ser efetivado aqui em Brasília, o direito de estar nos atos, de participar, construir e entender esse momento tão importante para a vida democrática do Brasil”, destacou Chico Carneiro.
Diana Melo acrescentou que não adianta esconder o debate político das crianças. Segundo ela, é preciso fazer uma discussão geral de não violência, de respeito e de democracia. “A discussão está na vida delas, está na escola, está acontecendo o bulling político nas escolas, porque as crianças ‘da direita’ estão com o discurso violento que está sendo repercutido em casa pelos pais. Elas estão reproduzindo o que ouvem dos pais e também nas passeatas”, contou.
“O que a gente não pode aceitar é uma criança desejar a morte de alguém de um grupo adversário, uma criança começar a desenhar alguém sendo enforcado, uma criança falando palavras carregadas de misoginia, de machismo. Isso a gente não admite em lugar nenhum. Nem das nossas crianças, nem das outras”, destacou.
O caso Uirá
A coordenadora do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) do Distrito Federal, Maria José Costa Almeida, acrescentou mais um motivo para a atividade lúdica infantil. “A gente resolveu fazer essa atividade principalmente depois do que aconteceu no dia 24 de março, com a prisão de uma criança”, enfatizou, lembrando a ação da Polícia Militar do DF durante ato em frente à sede da Rede Globo, que levou pai e filho para a delegacia em um camburão, alegando negligência.
A criança em questão, de apenas sete anos, é o filho de Chico Carneiro. “O ato todo era pacífico, meu filho estava brincando, me afastei dele para tirar uma foto e os policiais o pegaram. No que eu fui me apresentar como pai, recebi voz de prisão por levar meu filho em uma manifestação. Me colocaram dentro do camburão e colocaram ele junto comigo. Para ele, é a percepção de que ele também foi preso, não apenas separado do pai, como foi preso pela Polícia por participar de um ato contra a Rede Globo”, contou.
Chico Carneiro lembrou de outras situações semelhantes ao que ocorreu com seu filho no dia 24 de março, como o tratamento que a PM do DF queria dar à Ciranda pela Democracia, ato infantil que aconteceu no dia 31 de março, durante manifestação pela democracia e contra o golpe.
“A PM convocou o Conselho Tutelar para se preparar, porque, segundo a PM, as crianças seriam usadas como escudos. Isso tudo está em documentos formais da polícia”, especificou.
Para a coordenadora do MTST, a alegação da polícia não condiz com a verdade. “Jamais uma mãe vai pegar um filho e fazer de escudo. A polícia está agora com essa estratégia de tentar pegar as crianças da gente para criar o confronto e eles querem se beneficiar disso. Então a gente está fazendo essas denúncias. No dia de hoje, às crianças estão aqui brincando aonde não tem polícia e elas vão voltar para casa feliz. Mas se aparecer polícia aqui, elas já vão ficar com medo, porque elas já têm medo da polícia”, frisou.
Na avaliação de Carneiro, os casos mostram que a polícia não está preparada para essas situações. “Quando são atos que buscam a manutenção e agravamento de uma ordem contra a retirada de direitos, a PM dialoga melhor com esses atos e acolhe os pais, acolhe as crianças, saúda esse tipo de processo, como foi no dia 13 de março, em protestos que vão contra o Estado Democrático. Agora, quando são protestos que tentam reafirmar a democracia, isso não dialoga com uma estrutura militar, e aí a gente vê que ela não está preparada mesmo”, afirmou o economista.
Segundo Diana Melo, que ajudou a organizar a Ciranda pela Democracia, os movimentos sociais sempre levaram as crianças para a rua. “Primeiro porque é um espaço de aprendizado, e segundo porque faz parte da vida da gente, da dinâmica da gente, das crianças estarem junto da gente, participam junto com a gente, até porque algumas mães não têm com quem deixar as crianças. A medida que aquilo não ofereça risco para às crianças e faz parte da vida delas, as mães vão levar seus filhos. E a gente leva”.
Por Luana Spinillo, da Agência PT de Notícias