Para além de um reordenamento organizativo e de uma reorientação política para completar o desafio de se renovar após o 6º Congresso Nacional, o Partido dos Trabalhadores precisa investir decisivamente na formulação de um projeto estratégico para o Brasil. A experiência de governo com medidas desenvolvimentistas e as políticas públicas de inclusão social configurou um patrimônio valioso, mas rigorosamente insuficiente em um cenário econômico de primazia e internacionalização do capital financeiro, de dependência do “boom” das commodities, de declínio mundial do Estado de bem-estar social e de diminuição do emprego como forma de integração social.
O PT, bem como toda a esquerda brasileira, tem apresentado dificuldades em lidar com a questão econômica nos seus projetos políticos porque têm desconsiderado fatores sociais no Brasil. Com isso, acaba por valorizar a lógica privada do mercado. Isso porque se trabalha com a dualidade Estado-Mercado, ao invés de pensar na tríade Estado-Mercado-Sociedade. Repensar o nosso sistema econômico significa estabelecer a relação entre Estado, mercado e sociedade. Principalmente no que diz respeito às diferentes e possíveis formas de economia, para além da lógica autodestrutiva do mecanismo de mercado.
Um partido com vocação para o poder não pode ignorar agenda tão complexa, que ainda abarca as mutações do sistema político, o peso e o lugar de instituições como o Ministério Público e o Judiciário, o papel da mídia e das novas ferramentas de informação e comunicação, a importância da ciência e da tecnologia, da pesquisa e desenvolvimento, do pensamento estratégico e de segurança nacional, da preservação e manejo de recursos naturais estratégicos, dentre outros. Um partido com vocação para o poder precisa se dispor a compreender as transformações em curso para oferecer sua interpretação, suas ideias e seu programa para o país.
Uma das principais lições a aprender com a atual e mais grave crise de nossa história é que passou o tempo de responder a dilemas estratégicos com respostas táticas de curto prazo. Por isso, o projeto estratégico nacional, um projeto de nação é, sem dúvida, uma das grandes questões submetidas ao conjunto das forças democrático-populares no Brasil. Formular um projeto dessa envergadura não pode ficar ao encargo de poucas pessoas. Ao contrário, uma articulação dessa natureza vai exigir uma contribuição ampla.
Diante disso, e concluindo, gostaria de destacar trecho de um texto produzido em conjunto com os demais camaradas do Núcleo Celso Furtado (PT-RJ), do qual estou coordenador, para instigar o debate:
Por projeto nacional – Entendemos a mobilização presente de esforços no sentido de criar as bases teóricas, programáticas e culturais para, numa dinâmica provavelmente associada ao longo prazo, pôr em prática as transformações que a sociedade brasileira requer para se transformar numa nação capaz de assegurar a todos os seus cidadãos o exercício efetivo de direitos e garantias individuais e, sobretudo coletivos.
Entre as medidas a serem adotadas – ainda obstaculizadas pela correlação de forças atual – se incluem: assegurar o caráter público e universal à educação e à saúde; implantar o imposto sobre grandes fortunas; taxar fortemente os lucros das empresas monopolistas; realizar uma reforma agrária em grande escala combinada com a formação de uma agroindústria ecológica; submeter o sistema bancário ao interesse coletivo; assegurar o controle público das ações do Estado; descriminalizar o aborto; democratizar os meios de comunicação em todos os níveis; pôr fim à concentração fundiária urbana; garantir o domínio do país sobre seus recursos materiais, sobretudo os de natureza hídrica; intensificar os trabalhos de unificação política e econômica dos países latino-americanos; proteger os biomas ameaçados pelos interesses econômicos; mudar radicalmente o modelo de transporte público hoje inviabilizado pela opção pelo aumento da frota de automóveis; entre outros.
Conquistas, enfim, que deverão ser fruto da ação de uma nova maioria política e cultural formada pelo proletariado urbano e rural, pelos camponeses, camadas médias urbanas unidas aos movimentos sociais expressão dos anseios de mudança da juventude, das mulheres, dos negros, índios, grupos LGBT e populações quilombolas.
Por certo, tal articulação não se confunde com o atual projeto de acumulação de capital no qual nosso governo e nosso partido tentam negociar e inserir algumas reivindicações dos setores da base da pirâmide social.
Por Daniel “Samam” Barbosa Balabram, Músico, Educador, Editor do Blog de Canhota, filiado ao PT-RJ, coordenador do Núcleo Celso Furtado (PT-RJ) e membro da direção da 2ª Zonal do PT-RJ, para a Tribuna de Debates do PT. Saiba como participar.