O país chega ao final de semana abalado por uma pandemia que já matou mais de 26 mil brasileiros e uma perigosa ameaça de ruptura política. Com o “Gabinete do Ódio” na mira do Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro reagiu elevando o tom de seus disparos verbais. “Chegamos no limite. Estou com as armas da democracia na mão”, disse, invocando as Forças Armadas. A ameaça é rechaçada pela presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffman (PR).
Ela alerta que o presidente da República nunca teve compromisso com a democracia. “Bolsonaro falando em defesa à democracia soa tão falso como as fake news espalhadas pelos apoiadores”, adverte. “A intenção é assolar o país, destruir e ocupar ideologicamente com a cultura do ódio e da exceção”.
Na quinta-feira (29), em sua “live” semanal, ele reafirmou as ameaças veladas aos ministros do STF, beirando um linguajar típico de milícias. Para defender uma cadeira no STF como forma de recompensar o procurador-geral da República, Augusto Aras, Bolsonaro sugeriu que uma terceira vaga “extra” poderia surgir com o “desaparecimento” de algum dos atuais ministros. “Se aparecer uma terceira vaga – espero que ninguém ali desapareça –, mas o Augusto Aras entra forte para essa vaga aí”, disse.
A origem da sua trajetória política e sua atuação confirmam as palavras da presidenta do PT. No final dos anos 80, Bolsonaro planejou ações violentas em quartéis para pressionar o ministro do Exército, Leônidas Pires Gonçalves, e o então presidente da República, José Sarney. Derrotado em seu papel de “sindicalista”, Bolsonaro acabou afastado do Exército, classificado como “mau militar” pelo general Ernesto Geisel, ex-presidente da República, que tinha aversão à indisciplina do ex-capitão.
Partido do Exército
O apelo de Bolsonaro por apoio militar aos seus assanhamentos golpistas também repercutiu no meio militar. Em artigo no jornal ‘O Estado de São Paulo’, o general Santos Cruz diz que “as Forças Armadas, por serem instituições de Estado, não devem fazer parte da dinâmica de assuntos de rotina política”. Para o ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República, “a dinâmica de governo não é compatível com as características da vida militar”. Ele deixou o governo no ano passado.
No entanto, a grande quantidade de militares lotados na Esplanada depõe contra a “incompatibilidade” alegada pelo general. Atuando como um “partido”, além da vice-presidência e de destacados ministérios, o Exército forneceu oficiais para ocuparem secretarias e direções de empresas públicas. Após a demissão de dois ministros da Saúde, ambos médicos, um militar ocupa o cargo, ainda que interinamente: o general Eduardo Pazuello.
“Os militares do gabinete e o ministro da Defesa acham que o presidente Jair Bolsonaro tem razão e só fazem reparos ao tom”, adverte nesta sexta-feira a jornalista Miriam Leitão, em sua coluna no jornal ‘O Globo’. “Acreditam que, sim, o Supremo Tribunal Federal (STF) está exorbitando de suas funções”, observa. “Não está, mas a opinião dos militares dos quais se cercou o reforça, e ele então decide escalar e assim fortalece sua militância”.
Defender a Constituição
Apesar das ameaças impostas por Bolsonaro, o líder da bancada do PT na Câmara dos Deputados, Enio Verri afirma que os democratas não vão se curvar. “Nós não vamos admitir que se desrespeite a Constituição. Vamos defender com unhas e dentes aquilo que a população construiu a duras penas, que é respeito a uma República que tem Três Poderes — o Executivo, o Legislativo e o Judiciário —, que representam muito bem o conjunto da população”, assegura o deputado.
O líder da bancada do PT no Senado Federal, Rogério Carvalho (SE), por sua vez, afirma que “na democracia não se admite espíritos ditatoriais”. E cobra: “Respeitem o Estado Democrático de Direito e as nossas instituições”. A Constituição de 1988 consagrou a superação de um período ditatorial que dividiu o país por duas décadas. Para Rogério Carvalho, quem rasgar a Constituição não terá novas anistias.