A degradação progressiva da legislação trabalhista e o descaso programático com a geração de empregos que flagelam o Brasil desde o afastamento da presidenta legitimamente eleita Dilma Rousseff, em maio de 2016, chega ao cume com o desgoverno Bolsonaro. Na manhã desta sexta (30), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou mais um recorde da taxa de desemprego, em meio à avalanche de índices a apontar para o abismo que nos aguarda em 2021.
A taxa de desocupação (14,4%) no trimestre de junho a agosto de 2020 foi a mais alta da série histórica iniciada em 2012. Ela cresceu 1,6 ponto percentual em relação ao trimestre de março a maio (12,9%), e 2,6 pontos frente ao trimestre de junho a agosto de 2019 (11,8%).
Para o IBGE, a nomenclatura oficial para desempregado é “desocupado”. Considera-se desocupada a pessoa que procurou emprego e não conseguiu. Os que não estão procurando emprego fazem parte da população em idade ativa, mas não são consideradas desocupadas e sim, desalentadas. E são cada vez mais e mais, tanto desocupados quando desalentados.
O Brasil chegou ao ponto do menor contingente de população ocupada e do maior da população fora da força de trabalho. A relação inversa é a mais alta da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), iniciada em 2012.
A população ocupada agora é de 81,7 milhões. A queda foi de 5,0%, ou menos 4,3 milhões de pessoas trabalhando em relação ao trimestre anterior e menos 12 milhões (12,8%) frente ao mesmo trimestre de 2019. O nível de ocupação (46,8%) também foi o mais baixo da série, caindo 2,7 pontos frente ao trimestre anterior e 7,9 pontos contra o mesmo trimestre de 2019.
A população desocupada chegou a 13,8 milhões de pessoas, crescimento de 8,5% (ou mais 1,1 milhão de pessoas) frente ao trimestre móvel anterior (12,7 milhões). Em relação ao mesmo trimestre de 2019, quando já eram 12,6 milhões, o avanço foi de 9,8%, ou mais 1,2 milhão de pessoas.
A taxa composta de subutilização (30,6%) foi recorde na série, crescendo 3,1 pontos em relação ao trimestre móvel anterior (27,5%) e 6,2 pontos frente ao mesmo trimestre de 2019 (24,3%). A população subutilizada também foi recorde: 33,3 milhões de pessoas. São mais 3 milhões de pessoas (9,7%) frente ao já ruim trimestre anterior e 5,6 milhões (20,0%) contra o mesmo trimestre de 2019.
A população na força de trabalho (95,5 milhões de pessoas) caiu 3,2% (menos 3,2 milhões) frente ao trimestre anterior e 10,1% (menos 10,7 milhões) em relação ao mesmo trimestre de 2019. A população fora da força de trabalho (79,1 milhões de pessoas) foi recorde da série, com altas de 5,6% (mais 4,2 milhões) em relação ao trimestre anterior e de 21,9% (mais 14,2 milhões) frente ao mesmo trimestre de 2019.
Outro recorde é o da população desalentada: 5,9 milhões. Altas de 8,1% (mais 440 mil) em relação ao trimestre anterior e de 24,2% (mais 1,1 milhão) frente ao mesmo trimestre de 2019. Idem para o percentual de desalentados em relação à população na força de trabalho ou desalentada (5,8%), crescendo 0,6 ponto frente ao trimestre anterior e 1,5 ponto contra o mesmo trimestre de 2019.
O número de empregados com carteira de trabalho assinada no setor privado (excluindo trabalhadores domésticos), estimado em 29,1 milhões, foi o menor da série, caindo 6,5% (menos 2 milhões) frente ao trimestre anterior e 12,0% (menos 4 milhões) ante o mesmo trimestre de 2019.
O número de empregados sem carteira assinada no setor privado (8,8 milhões de pessoas) caiu 5,0% (menos 463 mil pessoas) em relação ao trimestre móvel anterior e 25,8% (menos 3 milhões) ante o mesmo trimestre de 2019. O número de trabalhadores por conta própria (21,5 milhões de pessoas) caiu em ambas as comparações: -4,0% (ou menos 894 mil) contra o trimestre móvel anterior e -11,4% (ou menos 2,8 milhões de pessoas) frente ao mesmo período de 2019.
O número de trabalhadores domésticos (4,6 milhões de pessoas) é outro que é o menor da série, caindo 9,4% (menos 473 mil pessoas) frente ao trimestre anterior e 27,5% (menos 1,7 milhão de pessoas) frente ao mesmo trimestre de 2019.
A taxa de informalidade chegou a 38,0% da população ocupada (ou 31,0 milhões de trabalhadores informais). No trimestre anterior, a taxa foi 37,6% e, no mesmo trimestre de 2019, 41,4%.
O rendimento médio real habitual (R$ 2.542) no trimestre terminado em agosto subiu 3,1% frente ao trimestre anterior e 8,1% contra o mesmo trimestre de 2019. Mas a massa de rendimento real habitual (R$ 202,5 bilhões) caiu 2,2% (menos R$ 4,6 bilhões) frente ao trimestre anterior e 5,7% contra o mesmo trimestre de 2019, ou menos R$ 12,3 bilhões circulando na economia nacional este ano.
A força de trabalho potencial (13,6 milhões de pessoas) cresceu 14,2% (mais 1,7 milhão de pessoas) frente ao trimestre móvel anterior e 70,4% (mais 5,6 milhões de pessoas) ante o mesmo trimestre de 2019. Já o número de empregadores (3,9 milhões de pessoas) ficou estável em relação ao trimestre anterior e caiu frente ao mesmo trimestre de 2019 (-10,2% ou menos 444 mil pessoas).
Queda da ocupação com aumento da desocupação
“O cenário que temos agora é da queda da ocupação em paralelo com o aumento da desocupação. As pessoas continuam sendo dispensadas, mas essa perda da ocupação está sendo acompanhada por uma maior pressão no mercado”, explicou a analista da pesquisa, Adriana Beringuy. “Antes as pessoas em isolamento não pressionavam o mercado porque estavam fora da força, já que não havia oportunidade. Agora, há mais procura por trabalho.”
“Com exceção da agricultura, as atividades estão demitindo, o que pode ter a ver com baixa demanda, fechamento do estabelecimento e com dinâmica da economia e padrão de consumo dos brasileiros”, completou a analista do IBGE.
Em 2014, o Brasil havia encerrado o ano com a menor taxa de desemprego já registrada: 4,8%, com um total de 6,7 milhões de desempregados. Foi o menor índice desde 2003, quando o IBGE adotou a metodologia atual de análise. Em 2013, o desemprego tinha sido de 5,4%.
Em 2015, após intensa campanha de desestabilização movida por setores inconformados com a derrota nas eleições de 2014, a taxa média de desemprego subiu para 8,5% – a maior desde o início da série da Pnad Contínua, em 2012. Em 2014, a média anual de desemprego ficara em 6,8%. Em 2016, subiu para 11,5%.
O contingente de desempregados no país aumentou em 1,47 milhão de pessoas de 2016 para 2017, segundo dados da Pnad Contínua. O total de desempregados passou de 11,76 milhões na média de 2016 para 13,23 milhões em 2017, um aumento de 12,5%. De 2014 para 2017, o total de desempregados quase dobrou, com aumento de 96%. A partir das “reformas trabalhistas” do usurpador Michel Temer, e com os ataques deliberados de Bolsonaro e o ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, a degradação explodiu.
Preços continuam subindo, junto com a fome
O IBGE também divulgou nesta sexta os índices de aumento de preços de produtos na saída das fábricas, medidos pelo Índice de Preços ao Produtor, que foi de 2,37% em setembro. O percentual é inferior ao de agosto (3,31%), mas superior ao de setembro de 2019: (0,50%), e acumula inflação de 13,46% no ano e de 15,89% em 12 meses.
Em setembro, 21 das 24 atividades industriais pesquisadas tiveram alta de preços, com destaque para alimentos (5,28%), indústrias extrativas (3,81%) e outros produtos químicos (2,03%). Ao mesmo tempo, três atividades tiveram deflação (queda de preços). A maior delas foi observada no refino de petróleo e produtos de álcool (-2,83%).
Entre as quatro grandes categorias econômicas, a maior alta de preços foi observada nos bens de consumo semi e não duráveis, que tiveram inflação de 3,05%. As demais categorias anotaram as seguintes taxas de inflação: bens intermediários, isto é, os insumos industrializados usados no setor produtivo (2,24%), bens de consumo duráveis (1,53%) e bens de capital – máquinas e equipamentos usados no setor produtivo: 1,31%).
Ao mesmo tempo, a fome no Brasil chegou a 10,3 milhões de pessoas, sendo 7,7 milhões de moradores na área urbana e 2,6 milhões na rural. Os dados são da primeira parte da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), divulgada pelo portal ‘Brasil de Fato’.
O índice mede o nível de restrição dos brasileiros no acesso à comida e foi constatado a partir de informações colhidas entre junho de 2017 e julho de 2018 em quase 58 mil domicílios de todas as partes do país.
Segundo a pesquisa, quase metade das famílias de zonas rurais do Brasil convive com a insegurança alimentar, um contingente que representa 44% do total. No campo, a proporção de insegurança alimentar classificada como “grave” era de 7,1% na época da coleta dos dados. O número representa três pontos percentuais a mais que a marca observada pelos pesquisadores na zona urbana, de 4,1%.
Já a comercialização de alimentos produzidos pela agricultura familiar, por meio do Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar (PAA), apresentou queda de 95% nos últimos oito anos. Das 297 mil toneladas de alimentos comercializadas por meio do programa em 2012, o número despencou para apenas 14 mil toneladas em 2019, primeiro ano do desgoverno Bolsonaro.
Em relação ao orçamento federal executado, a queda foi similar: 93%. Dos R$ 587 milhões utilizados pelo governo para execução do programa em 2012, passou para R$ 41,3 milhões em 2019, valor mais baixo desde a criação do programa em 2003, dentro da política de combate à fome do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Em 2012, foram atendidas pelo programa 128.804 famílias agricultoras pertencentes aos grupos do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). Em 2019, o número caiu para um total de 5.885 agricultores familiares.
Os dados foram divulgados na quarta (29) pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Autarquia responsável pela política agrícola e de abastecimento no Brasil, a Conab é responsável pela operacionalização do programa. É por meio dela que o governo realiza as compras de alimentos para doação e para a formação de estoques públicos.
Um dos programas responsáveis por tirar o Brasil do Mapa da Fome em 2014, o PAA atua em duas pontas. De um lado, compra de agricultores familiares. De outro, distribui parte à população mais ameaçada pela insegurança alimentar e nutricional.
O aumento dos recursos para compras públicas pelo PAA foi um dos itens vetados por Bolsonaro na Lei Assis de Carvalho (735/20), aprovada pelo Congresso Nacional para socorro aos trabalhadores da agricultura familiar, em meio à pandemia do novo coronavírus.
Desde a criação, em 2003, os recursos destinados pelo governo federal ao programa tiveram crescimento constante de forma acentuada até 2006, e de forma mais lenta até 2012, quando se chegou ao teto de R$ 1,2 bilhão. Para 2020, foi prevista pelo governo na Lei Orçamentária Anual (LOA) 2020 a destinação de R$ 101 milhões ao programa.
Da Redação