Apontado como motivo principal da demissão de José Mauro Ferreira Coelho 40 dias após a posse como presidente da Petrobrás, o risco de desabastecimento de diesel no mercado brasileiro é real e iminente. O alerta é da Federação Única dos Petroleiros (FUP). A entidade publicou nota em seu site avisando que o país pode ficar sem o óleo no início do segundo semestre deste ano.
Os motivos do desabastecimento, aponta a FUP, serão a prevista escassez de oferta no mercado internacional e o baixo nível dos estoques mundiais, agravados após as sanções lideradas pelos Estados Unidos contra a Rússia devido ao conflito no Leste Europeu. Os mesmos citados no documento ‘Combustíveis: desafios e soluções’, que Ferreira Coelho teria mostrado a Jair Bolsonaro como justificativa para não congelar os preços do óleo.
“Se não houver sinal de preços de mercado à frente, há risco material de desabastecimento de diesel no pico de demanda da safra, afetando o PIB do Brasil”, prevê o documento da Petrobrás, ao qual a agência inglesa Reuters teve acesso, de Houston, Texas (EUA). A estatal lembrou que a demanda pelo diesel tende a aumentar a partir de junho/julho, com a entrada da safra agrícola destinada à exportação.
“A Índia está produzindo diesel com petróleo russo e exportando para a Ásia e Brasil. Porém, grande parte do diesel importado pelo Brasil, cerca de 80%, é fornecido pelos Estados Unidos, que estão mandando muito produto para a Europa”, descreve o coordenador-geral da FUP, Deyvid Bacelar. “Há possibilidade real de faltar diesel no mercado brasileiro ou de o preço desse combustível explodir no país.”
Bacelar afirma que essa ameaça de desabastecimento de diesel no mercado doméstico, a menos de cinco meses das eleições presidenciais, levou Bolsonaro ao desespero e se tornou o pano fundo da quarta troca de presidente da Petrobrás em sua “gestão”. Também motivou o balão de ensaio da proposta de congelamento de preço do produto por 100 dias, numa tentativa eleitoreira de evitar maiores explosões da inflação.
“É mais uma cortina de fumaça criada por Bolsonaro, que não muda ou abandona a política de preço de paridade de importação (PPI) porque não quer”, prossegue o líder da FUP. “O PPI não é lei; é decisão do Executivo. A questão central é que o governo não quer arranjar briga – nem com o mercado, nem com os acionistas privados que, com o atual modelo, têm a garantia de dividendos espetaculares.”
Luiz Inácio Lula da Silva disse coisa semelhante em entrevista à Rádio Mais Brasil News FM nesta terça-feira (24). Para ele, não adianta Bolsonaro trocar o presidente da estatal, nem dar “murro na mesa”, se o PPI foi mantido. O correto, diz, seria reunir o Conselho Nacional de Política Energética e decidir pelo fim da dolarização. “O que ele tem que ter é coragem. Porque, na verdade, o que ele tem é o rabo preso aos preços internacionais.”
Em três anos e quatro meses de desgoverno Bolsonaro, o preço do diesel subiu 90%. O dado é de levantamento divulgado pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) nesta terça. Novamente, o PPI é apontado como principal responsável pela explosão dos preços. “É como se a Petrobras estivesse funcionando como um monopólio privado”, afirmou o economista Eduardo Costa Pinto.
Desmonte e venda de refinarias custaram caro ao país
A entidade representativa dos petroleiros destaca que, apesar da autossuficiência na produção de petróleo, o Brasil importa atualmente 25% de suas necessidades de diesel, conforme dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP).
O estímulo à importação de combustíveis via criação de empresas privadas começou em 2016, com Michel Temer, lembra Bacelar. Agora, essas empresas pressionam por importações e para que o preço interno acompanhe os patamares internacionais.
Bolsonaro agravou a dependência ao decidir não criar refinarias, reduzir investimentos e ainda vender unidades da Petrobrás. “Uma política de desmonte que, com base na política do PPI, contribuiu para a escalada da inflação”, afirma o líder da FUP. Para ele, um dos erros cruciais do desgoverno Bolsonaro foi não ter concluído o segundo trem da Refinaria Abreu Lima (Rnest/PE), especializada em produção de diesel.
“Errou também ao não investir no Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), e ao não construir unidades de coqueamento em algumas refinarias do país – como na refinaria da Bahia, privatizada no fim do ano passado”, prossegue o dirigente. “Elas deveriam estar produzindo diesel ao invés de óleos combustíveis.”
Presidente da Petrobrás quando as reservas do pré-sal foram confirmadas, José Sergio Gabrielli pensa de forma semelhante. Detentor do mandato mais longevo à frente da estatal (22 de julho de 2005 a 13 de fevereiro de 2012), o economista costuma dizer que desde o golpe de 2016 a estatal caminha rapidamente para se transformar de uma empresa integrada, “do poço ao posto”, em mera exportadora de óleo cru.
“Se você abre o país para mais importação, se você diminui o uso do petróleo nacional, porque aumenta a exportação do petróleo cru e não processa o petróleo cru nas refinarias, que não estão crescendo – aliás, a expansão das refinarias foi inviabilizada com a lava jato –, você tem uma situação em que o país passa a ser dependente do mercado internacional”, explicou em entrevista no programa Sexta-feira 13h, na TvPT no Youtube, no ano passado.
“Tudo foi feito para que o país ficasse mais dependente dos preços internacionais, porque aumentou-se muito a importação de derivados, algumas refinarias foram desativadas e em outras reduziram a utilização, foram criados mais de 400 importadores de derivados no país e a Petrobrás está desmontando o parque de refino”, elenca.
Gabrielli destacou ainda o Plano Estratégico de Negócios e Gestão (PNG) da Petrobrás para o quinquênio 2022/2026. “Ele continua ainda fortemente concentrado em atender os interesses de curto prazo dos acionistas, desprezando outros públicos de interesses que constituem o universo das grandes empresas”, finalizou.
Da Redação, com informações da Assessoria da FUP