Depois de admitir não ter provas contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que mesmo assim condenou à prisão, o ex-juiz e agora ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, afirma que terá de ser destruído o conteúdo das conversas encontradas com os supostos “hackers” presos pela Polícia Federal.
“As mensagens serão destruídas, não tem outra saída. Foi isso que me disse o ministro (Moro) e é isso que tem de ocorrer”, disse o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio Noronha, à Folha de S.Paulo na tarde de hoje (25). Noronha foi procurado pelo jornal depois de Moro ter-lhe telefonado para comunicar que ele estava na lista das vítimas.
A Folha foi um dos veículos que compartilhou com o Intercept a publicação de revelações de que Moro e manteve um conluio como os acusadores do Ministério Público, sobretudo com o coordenador força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol. Em nota, o jornal reforçou hoje ter analisado o material recebido anonimamente pelo site de Glenn Greenwald e voltou a atestar sua autenticidade.
A jurista Carol Proner afirma em artigo na página Congresso em Foco que o caso The Intercept e as “revelações disfuncionais da Lava Jato” se encaixariam em pelo menos quatro categorias de direitos fundamentais imbricados a proteger o trabalho dos jornalistas: a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão, o direito à verdade e o direito (de acesso) à informação.
“São direitos com diferentes escopos, embora conexos e consequenciais. Para o caso em concreto, e diante das ameaças que vêm recebendo Glenn Greenwald e sua equipe, é preciso compreender que a Constituição brasileira protege tanto o direito de expressão como o trabalho jornalístico, além de atribuir inestimável valor de interesse público às informações que denunciam os bastidores da maior operação de combate à corrupção do país.”
A informação sobre a intenção do ministro da Justiça de destruir as “provas” que seus comandados apreenderam com o suposto “hacker”, se confirmada, é mais um indício de que os objetivos políticos de Sergio Moro prevalecem sobre normas legais e regras básicas do funcionamento do sistema de Justiça. Moro, que não é mais juiz, sabe de ofício que, na condição de comandante da PF, que conduz investigações, não deveria ter sequer comunicado ao presidente do STJ a menção ao seu nome no conteúdo das conversas. Talvez o tenha feito com a intenção de que aquela Corte autorize a destruição do conteúdo.
Faz lembrar o momento em que Eliot Ness, em Os Intocáveis, convence o juiz a substituir o júri que decidiria o futuro de Al Capone. Para tanto, diz ao magistrado que o nome dele estaria na lista da propina do mafioso. A diferença aqui é que Moro não se compara a Ness.
Afinal, como diz o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello à Folha, apenas o Judiciário pode decidir se as mensagens apreendidas com os “hackers” podem ser eliminadas. “Cabe ao Judiciário decidir isso, e não à Polícia Federal. Há responsabilidades civil e criminal que precisam ser apuradas”, afirma.
Provas servem para ratificar uma acusação e punir um criminoso. Se o ministro acusa o Intercept de lidar com material criminoso e supostamente adulterado, por que destruir o material? Ou seria outro, e não o Intercept, o criminoso?
Gleen Greenwald, do Intercept, voltou a desafiar o ex-juiz em sua rede social: “Sergio Moro pode destruir – de novo – a evidência que eles têm. Mas ele não pode destruir a evidência que nos temos, nem impedir sua divulgação. É por isso que uma imprensa livre é tão crucial em uma democracia.”