O direto a visita para pessoas presas no Brasil é garantido tanto pelo Código de Execução Penal, quanto pelas Regras de Mandela, das quais o país é signatário. Porém, assim como ocorre em muitas prisões comuns, no caso do ex-presidente Lula, que é um preso político, a legislação vem sendo reiteradamente desrespeitada.
No dia 10 de abril, nove governadores foram impedidos pela justiça de visitar o ex-presidente. Nesta quinta-feira (19), o teólogo Leonardo Bofe e o Nobel da Paz Adolfo Esquivel tampouco conseguiram entrar no prédio em que o ex-presidente é mantido como preso político.
Juristas como o professor de processo penal da Universidade de São Paulo, Gustavo Badaró; o professor de Direito Público da UnB, Marcelo Neves; e o advogado especialista em direito criminal e coordenador no Ibccrim André Lozano são contundentes ao afirmar que no Brasil é direito do preso receber visitas tanto dos advogados quanto de parentes e amigos.
Segundo o Código de Execução Penal, Artigo 41, inciso X, é direito do preso a “visita do cônjuge, companheira, de parentes e amigos em dias determinados”. Já a Regra de Mandela de número 58 afirma que “os prisioneiros devem ter permissão, sob a supervisão necessária, de comunicarem‑se periodicamente com seus familiares e amigos, periodicamente; por correspondência e utilizando, onde houver, de telecomunicações, meios digitais, eletrônicos e outros; e por meio de visitas.
De acordo com Marcelo Neves, “as visitas não podem ser limitada pela autoridade na qualificação das pessoas. Não há essa possibilidade de execução penal. O que pode haver é limite de tempo, horário, pela organização da prisão. O que não se pode é, pela lei de execução penal, impedir as visitas. Pode-se definir dias e horários, mas não impedir a visita”.
O professor da UnB classifica como “absurdo”o tratamento dado ao ex-presidente Lula. “O caso de Boff e Esquivel mostra o absurdo da posição. No caso do Boff seria uma visita de caráter religioso e nesses casos tem muito mais flexibilidade”.
Neves destaca a Regra de Mandela de número 58 e afirma que “por Lula ser uma figura de relevância, isso amplia muito o número de pessoas com consideração e que se consideram amigos dele”.
“O sistema judicial pode organizar, mas não pode proibir. Nenhum desses que até agora querem visitar, não poderiam ser proibidos. Se Lula quer receber e eles querem visitar, se Lula considera uma pessoa sua amiga, o Estado tem que organizar e decidir o horário determinado”, afirma o professor da UnB.
Ele ainda acrescenta que o regimento interno da Superintendência da Polícia Federal não pode ser usado como embasamento para impedir visitas. “Uma norma interna de entidade prisional não pode prevalecer sobre a lei. Há hierarquia normativa do sistema e a lei prevalece sobre as normas administrativas”.
Já o professor Gustavo Badaró afirma que “não parece possível negar que parentes e amigos possam visitar o preso”. Para ele, esse direito pode, no máximo, receber certos condicionantes. “Pode-se estabelecer, por exemplo três visitas por vez, há certa flexibilidade para que isso seja disciplinado. O que não se pode é negar”, explica.
Badaró afirma que, de forma geral, quase nenhuma regra é respeitada em termos de execução penal no Brasil, destacando que o próprio STF já admitiu que as condições carcerárias no país desrespeitam diversos direitos e a própria dignidade humana.
Ele destaca que “essa regras vem sendo sistematicamente descumpridas para todos os condenados e são direitos de todos os condenados, independente de serem culpados ou inocentes. Não é um benefício, privilégio, não é concessão que o Estado faz”.
“Da mesma forma que o condenado perde a liberdade, tem direito a visita de familiares e amigos. Portanto, se o Estado tem o direito de tirar a liberdade de quem descumpre as leis do Estado, o Estado também deveria ter a obrigação de dar a quem está privado de liberdade todos os seus direitos”, completa Badaró.
Segundo o advogado Lozano, o Código de Execução Penal é reiteradamente desrespeitado no país, em geral pelos diretores dos presídios. “Para se ter noção da loucura, o diretor não obedece a ordem judicial em muitos casos e não acontece nada com ele”, comenta.
“São feitas concessões, no caso de Lula, mas mesmo assim a lei não é respeitada”, avalia o advogado. “Se a lei diz que amigos podem visitar, deveriam poder visitar, nem que fosse necessário aviso prévio. Isso é parte da ressocialização do preso. Para a ressocialização do preso ele precisa de convivência mínima em sociedade. Nada do que é colocado como direto ao preso é benefício, é por conta de ressocialização”.
“Vale a pena falar que, se não estão cumprindo os requisitos mínimos legais com o Lula, imagina o que se acontece com os demais presos, as condições subumanas. Se um ex-presidente é tratado assim, imagina um preso que não importa para ninguém”, completa o criminalista.
Da redação da Agência PT de notícias