O resultado eleitoral de 2018 delegou ao PT autoridade e lhe impôs grandes responsabilidades. Autoridade da qual o PT não tem o direito de abrir mão ou subestimar. Responsabilidades para quais o PT tem o dever de estar preparado à altura para corresponder. O PT precisa fazer uma profunda e criteriosa reflexão, não para o autoflagelamento tão cobrado pela imprensa golpista e pelos os nossos adversários e inimigos, mas para compreender a extensão do antipetismo.
Para compreender que além da defesa intransigente dos direitos e da democracia, ambos em risco na atual conjuntura, precisa, ainda, empunhar com força algumas das suas antigas bandeiras (direito a educação e saúde públicas e de qualidade, a mais e melhores empregos, etc). É preciso, sobretudo, fazer tremular com vigor e encantamento, novas bandeiras que sejam capazes de dialogar e encantar os corações e mentes das camadas populares e com força suficiente movê-las a embalar novos sonhos e despertar novas esperanças.
Mas como fazer isso? Isso começa com o PT, seus dirigentes e militantes se despindo de qualquer vaidade e compreendendo que as perguntas ainda não foram todas feitas e todas as repostas não serão encontradas só a partir do seu olhar para dentro.
Quando nasceu, o PT bebeu numa rica fonte onde estavam depositadas as memórias das lutas passadas e fervilhavam os sonhos, os anseios e a esperança de um país maior e melhor para todos. Foi em um contexto de muita heterogeneidade, onde se encontraram intelectuais, militantes políticos anistiados dos diversos grupos que combateram a ditadura militar, o movimento sindical, os movimentos populares como de educação e saúde, religiosos como as CEBs – Comunidades Eclesiais de Bases – e ativistas de diversas pautas identitárias.
Foi a partir da soma das vontades e de muitas bandeiras nascida do seio do povo, que o PT se fez como a mais extraordinária das ferramentas de vocalização e execução do projeto de uma nação soberana e inclusiva, social e ambientalmente sustentável.
Agora, após, o exercício de seus 13 anos no governo do Brasil, interrompido de forma abrupta por um golpe jurídico, político e midiático, o PT encontra-se fortalecido por um grande legado de inclusão social, defesa e fortalecimento da nossa soberania e reconhecendo os seus erros. Novamente, o partido precisa ir ao encontro dessa fonte, compreendendo que já se passaram 40 anos desde a sua fundação e que o mundo mudou, com uma grande e profunda revolução tecnoeletrônica e na versatilização dos meios de comunicação.
O planeta diminui de tamanho, as pessoas têm mais acesso aos fatos e ocorrências no mundo. Surgiram grandes variações e mudanças referentes aos valores políticos, sociais, econômicos e culturais e, ainda, radicais mudanças nas relações de trabalho, de produção e no perfil e caráter da luta classe. Ou seja, os problemas são velhos, mas a forma de resolvê-los ou,
enfrentá-los não são mais as mesmas e se tornaram mais complexas e difíceis.
Por isso, o PT terá que ir buscar uma séria, respeitosa e horizontalizada interlocução com todos, aqueles e aquelas que, mesmo contrariados com o partido, para criar um necessário e audacioso projeto de desenvolvimento de matriz inclusiva, humanitária e de prosperidade. Apesar da violenta cruzada persecutória impetrada para sua dizimação, o PT sobreviveu e,
ainda, mantém um forte apoio popular. Nas eleições presidenciais, mais de 47 milhões de eleitores votaram em nosso projeto, mesmo percebendo as suas fragilidades. O Partido dos Trabalhadores elegeu 57 deputados federais, a maior bancada na Câmara dos Deputados, quatro governadores e 6 senadores, além de inúmeros deputados estaduais.
Essa vitória eleitoral o habilita para cumprir um papel muito preponderante na defesa do Estado laico, da soberania nacional, dos direitos, da liberdade e da democracia. Assim, o PT deve se opor à tentativa de implantação de um estado fundamentalista, minimalista, antinacionalista, entreguista, com fortes evidencias fascistas, que vem sendo arquitetado pelo presidente eleito.
Considerando o fato de as pessoas terem deixado comodidade de seus espaços individuais para se exporem na defesa da candidatura de Fernando Haddad, o PT não deve agora se voltar para dentro, envolvendo-se em suas disputas internas, quando a disputa a ser feita é no conjunto da sociedade.
Para o enfrentamento a que está chamado a fazer o PT tem uma grande oportunidade de, por um lado, reencontrar com os atores políticos, intelectuais, culturais, religiosos e sociais que ao longo de sua trajetória, por algum motivo, se distanciaram e, por outro lado, a oportunidade de ampliar a sua base social com novos e importantes atores dos mais diversos setores da vida nacional. Setores que engrossaram as fileiras da resistência durante golpe que afastou a presidenta Dilma Rousseff e que agora, nas eleições de 2018, fizeram corajosamente o enfrentamento contra o atraso que representava o projeto de nosso adversário.
O PT precisa ler corretamente o desenrolar da conjuntura nacional e internacional, para arquitetar com precisão os cenários que se desenvolverão, pelo menos, de curto e médio prazo, desenvolvendo um conjunto de ações e uma narrativa que encontre ressonância no seio das camadas populares, que compõem majoritariamente a população brasileira. Para isso, o PT precisa se ver de fora para dentro*.
Como nos ensinou o mestre Paulo, “como educador, reconhecer-se como educando”. Por isso, é hora de, enquanto partido, o PT assumir o seu papel de educando das massas populares. É extremamente necessário que se recorra, se não às massas como um todo, mas, ao menos, chegar a elas através de suas múltiplas referências coletivas e individuais históricas ou
emergentes.
É preciso fazer isso, sob pena de se estar perdendo o espaço criado pelo desenrolar dos últimos acontecimentos, para conseguir um vigoroso crescimento e energização do partido, que este momento proporciona e de cumprir o seu papel histórico de organizador dos discriminados da agenda decisória do país (o orçamento) e dos desprotegidos pelo aparelho de
estado que é bancado através da peleja cotidiana de muito suor e sacrifícios destes.
*Naturalmente, não foram só as minhas limitações para tratar do tema, mas a extensão e complexidade dele que não permitiram a apresentação de conclusões mais claras. Por isso, continuarei em um próximo artigo a tratar desta temática sobre o que compreendo ser o PT se ver de fora para dentro.
Donizeti Nogueira é suplente de senador pelo PT do Tocantins