Ana Clara, Agência Todas
Ocupar espaço na política não é fácil, principalmente se você for mulher. Para orientar candidaturas femininas, conversamos com uma advogada eleitoral para tirar as principais dúvidas. No radar, datas importantes como convenções partidárias, a novidade de cotas de ocupação interna no partido e como não se embolar na prestação de contas. Fique por dentro.
A partir das eleições de 2018, as mulheres obtiveram um importante avanço em termos de legislação eleitoral: a destinação obrigatória de 30% dos recursos públicos de campanha para candidaturas femininas. Em 2020, vai ser a primeira vez que essa regra será aplicada para eleições municipais.
Apesar dessa conquista, a dra Gabriela Araújo, advogada eleitoralista e mestre em Direito Constitucional, chama atenção para o fato de que os partidos podem estabelecer como será a distribuição desses recursos — se apenas para candidaturas proporcionais, se também para candidaturas majoritárias e em qual percentual para cada candidatura.
“As mulheres precisam ficar atentas para evitar que essa distribuição interna não seja demasiadamente desigual, ou pior que isso, direcionada especialmente a eventuais candidaturas laranjas, a fim de beneficiar candidaturas masculinas”, explica Gabriela.
Além de uma garantia mínima de financiamento eleitoral, as candidatas também tem direito a tempo de propaganda na TV e no Rádio.
PRESTAÇÃO DE CONTAS
Dentre os principais desafios enfrentados pelas mulheres em um campanha eleitoral, é importante reforçar a atenção em relação às obrigações legais a serem cumpridas que, em caso de violação, podem resultar em penalidades, multas, inelegibilidade e até imputação de eventual crime eleitoral.
A advogada Gabriela revela que, dentre as questões jurídicas, a ausência de uma prestação de contas transparente é o que mais pode prejudicar as candidaturas de mulheres. As candidatas são obrigadas por lei a contratarem assessoria contábil e jurídica individualizada para suas campanhas, para que possam arrecadar e gastar recursos dentro do que autoriza a legislação eleitoral. Elas precisam dessa equipe inclusive para manter uma prestação de contas quase diária à Justiça Eleitoral, por meio de um sistema específico. .
“É possível que os partidos disponibilizem esses profissionais para suas candidatas, mas muitos deles não o fazem, e a ausência de prestação de contas acaba gerando consequências jurídicas e financeiras muitas vezes devastadoras para as candidatas e que podem perdurar por anos”, afirma a advogada.
No caso do PT, o partido conta com o projeto Elas Por Elas, desenvolvido pela Secretaria Nacional de Mulheres. Composto por uma rede de mulheres em todo país para cuidar, orientar, incentivar e formar candidatas para uma disputa eleitoral legítima, o Elas Por Elas impulsiona a participação de mulheres na política e visa construir uma plataforma feminista para o Brasil.
RESUMO DOS PRAZOS
Por conta da pandemia, a possível mudança no calendário eleitoral está no horizonte das candidaturas. A advogada eleitoral reforça que isso é possível apenas por meio de emenda constitucional, votada pelo Congresso, portanto é preciso acompanhar essas movimentações.
Por ora, o calendário eleitoral segue o curso e alguns prazos importantes já foram atingidos.
PODE FAZER VAQUINHA NA INTERNET (arrecadação eleitoral ou crowdfunding eleitoral) | Desde o dia 15 de maio é permitido fazer uma espécie de vaquinha pela internet para arrecadar os recursos de campanha. Isso só é possível por meio de empresas autorizadas e previamente cadastradas junto ao Tribunal Superior Eleitoral. Os recursos eventualmente arrecadados somente serão disponibilizados às hoje pré-candidatas, depois que o registro de suas candidaturas realmente se efetivarem e outros requisitos forem cumpridos, como abertura de conta bancária específica e obtenção de CNPJ de campanha, o que deve ocorrer na segunda quinzena de agosto.
PODE FAZER PRÉ-CAMPANHA | As pré-candidatas ainda não podem pedir votos propriamente, pois a campanha oficial somente começa em 16 de agosto, mas já podem anunciar que são pré-candidatas, participar de entrevistas, divulgar suas conquistas e propostas, por meio de uma série de atividades de pré-campanha expressas na legislação eleitoral.
Qual a próxima data importante?
A próxima data importante para que as pré-candidatas fiquem atentas é a da realização das convenções partidárias em que os partidos deliberarão sobre a escolha de suas chapas de candidatas e candidatos.
Por lei, isso deve ocorrer entre 20 de julho e 05 de agosto, posto que o registro das candidaturas deve se dar até no máximo o dia 15 de agosto. Portanto, é já tempo de começarem a separar toda a documentação exigida pela justiça eleitoral, o que não é pouco.
MAIS UM AVANÇO – COTA INTRAPARTIDÁRIA
A dra Gabriela Araújo desta mais uma grande conquista das mulheres na política. No dia 19 de maio, o Tribunal Superior Eleitoral decidiu que deve ser observada a mesma reserva de vagas para candidaturas proporcionais prevista no parágrafo 3º do artigo 10 da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições) também para as disputas internas dos partidos políticos.
Ou seja, os partidos devem reservar no mínimo 30% das candidaturas para mulheres, nas eleições para a constituição dos órgãos partidários, como comissões executivas e diretórios nacionais, estaduais e municipais. Apesar do avanço importante, a decisão ainda não penaliza os partidos que descumprirem a norma.
“Infelizmente, como a decisão se deu no âmbito de uma consulta formulada ao Poder Judiciário, está desprovida de vinculatividade normativa, dada em caráter abstrato e sem natureza sancionatória, ou seja, seu descumprimento não ensejaria em um primeiro momento penalidades aos partidos políticos”, explica a advogada.
Ainda assim, o TSE decidiu encaminhar um apelo ao Congresso Nacional para que essa obrigatoriedade do cumprimento da reserva de gênero de 30% nas candidaturas dos órgãos internos de partidos seja incluída na legislação, com a previsão de sanções às legendas que não a cumprirem. A depender da decisão, poderá ser possível aplicar sanções aos partidos que não cumprirem.
Sobre Gabriela Araújo.
Gabriela Shizue Soares de Araujo, advogada eleitoralista, professora de Direito Eleitoral e Coordenadora de Extensão, Mídia e Eventos da Escola Paulista de Direito (EPD). Mestre e Doutoranda em Direito Constitucional pela PUC-SP. Membro do observatório de Candidaturas Femininas da OAB-SP e da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP. Apresentadora do programa Diversas: O Direito Por Elas, na Escola Superior da Advocacia da OAB-SP