O percentual de reajustes abaixo da inflação seguiu em alto patamar para categorias com data-base em abril, aponta o boletim ‘De olho nas negociações’, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Entre 163 casos analisados até o momento, 46% não repuseram as perdas, mesmo nível dos que obtiveram reajustes iguais à variação anual do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Apenas 8% das categorias obtiveram resultados acima do indicador referência para as negociações salariais no país em abril. É a menor proporção de reajustes com ganhos reais em 2022 e a segunda menor proporção nas últimas 15 datas-bases, acima apenas de novembro de 2021.
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“Os sindicatos têm feito uma luta hercúlea para conquistar reajustes acima ou de acordo com a inflação, mas a alta de preços sem perspectiva de queda e a crise econômica agravada pelo governo, que a cada hora reajusta os preços dos combustíveis, dificultam as negociações”, analisa o coordenador da pesquisa, Luís Ribeiro, no Portal da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
“A economia não deslancha. Toda hora o ministro da Economia e os bancos dizem que o crescimento está sendo retomado. Não é verdade”, prossegue o técnico do Dieese. “Os números são frágeis, não existe uma melhora sustentável quando há desemprego e inflação em alta.”
A prova é a variação real média dos reajustes, que em abril foi de -0,76%, resultado pior que o das negociações com data-base em março. Em todas as últimas 15 datas-bases, a variação real dos reajustes foi negativa, especialmente em julho de 2021 (-1,94%).
“O cálculo é feito pela média. Quem teve reajuste igual ao INPC zerou, empatou, quem ficou abaixou perdeu e o ganho acima da inflação foi para poucos”, explica Ribeiro. “Por isso que a média dos reajustes ficou negativa, superando quem teve reajuste acima da inflação.”
Conforme o documento do Dieese, “houve ligeira piora no quadro geral das negociações dos reajustes salariais de 2022 em relação ao analisado no boletim anterior, publicado em abril”. No acumulado do ano, os reajustes salariais abaixo da inflação representam agora 40,8% do total, em percentuais iguais à inflação são 31,6% e resultados acima do índice inflacionário equivalem a 27,6%.
De janeiro a abril, reajustes iguais e acima da inflação foram mais frequentes no comércio, presentes em cerca de 67% das negociações analisadas. Em seguida vem as negociações na indústria, nas quais 64% repuseram a inflação. Mas os aumentos reais foram mais regulares na indústria (29,4%) que no comércio (17,1%). O setor de serviços ostenta a maior proporção de reajustes abaixo (45,1%) e acima (29,8%) do INPC.
O coordenador da pesquisa do Dieese lembra que maio é o mês mais importante. Como é a data-base de categorias importantes, como petroleiros, químicos e bancários, acaba dando o tom das negociações do ano. “Quanto mais a categoria for forte e organizada, mais chance tem de conquistar um reajuste acima da inflação”, finaliza Luís Ribeiro.
Salários perderam um terço do poder de compra em cinco anos
A disparidade entre a inflação e os salários chega a 31,32% no período entre março de 2017 e março de 2022. Na série histórica do Dieese, em 2018, 9% das categorias negociaram reajustes abaixo da inflação, enquanto em 2021 o índice chegou a 47%.
Ao mesmo tempo, o Brasil não consegue superar a marca dos 12 milhões de desempregados. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada em 29 de abril pelo IBGE, revelam 11,9 milhões de pessoas ainda lutando por uma vaga de emprego em março.
Em 2014, quando o país atingiu a inédita marca do pleno emprego sob Dilma Rousseff, 92% das negociações salariais resultaram em aumento, com variação real média equivalente a 1,39%. Apenas 6% igualaram-se ao índice inflacionário e 2% não obtiveram recomposição salarial.
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Em toda a série analisada pelo Dieese, o percentual de 2014 ficou abaixo somente dos registrados em 2010 e 2012. Naqueles anos, a política de valorização do salário mínimo já havia sido adotada por Luiz Inácio Lula da Silva.
Até 2018, o salário mínimo federal era reajustado pela taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores, mais a taxa do INPC do ano imediatamente anterior. A partir da posse de Jair Bolsonaro, em 2019, o reajuste passou a acompanhar apenas a inflação medida pelo INPC, sem considerar o crescimento do PIB. Com isso, o piso nacional vem perdendo valor a cada ano. E com ele, os salários em geral.
Da Redação, com informações do Dieese e Portal CUT