Com um microfone de apresentadora, a guarda entra no salão cheio de estudantes e professoras, fala um “Boa tarde” em tom animado e anuncia a próxima atividade: um teatro de fantoches realizado por guardas municipais. Carismática, a guarda-apresentadora é famosa entre os alunos.
Ela integra o efetivo da GCM em Canoas, na região metropolitana de Porto Alegre (RS). Com o intuito de combater a violência nas escolas, a cidade, administrada pelo prefeito Jairo Jorge (PT), fez um esforço para mudar a presença da GCM nos centros de ensino. Desde então, os guardas passaram a entrar nas escolas municipais para promover rodas de conversa, teatro de fantoches e o “recreio animado” .
“Nossos alunos tinham muito problemas com a guarda. Mas agora o olhar está mudando”, afirma Elizabete Fettuccia, diretora da escola municipal Paulo Freire, em Guajuviras, que já foi um dos mais violentos da cidade.
Segundo o guarda Matias, que coordena o programa, são selecionados guardas que estejam dispostos a se relacionar com os adolescentes. Além disso, a ideia é que a própria comunidade encontre a solução para os casos de violência nas escolas, e que a GCM tenha um papel de orientação. “A gente vai em busca de onde nós podemos atuar a partir da experiência deles. Porque eles têm a solução também”, diz.
Canoas tornou-se case no combate à violência pelo poder municipal – teoricamente, segurança pública é uma responsabilidade do Estado e, no Rio Grande do Sul, a situação piora a cada dia. De 2011 a 2016, os homicídios no Estado cresceram 56%. No mesmo período, em Canoas, os homicídios caíram 44%. Não à toa, o município já ganhou prêmio do BID de melhor experiência de prevenção à violência e concorre com outras 5 cidades ao Prêmio da Paz em Bogotá (Colômbia).
O programa de segurança em Canoas também envolve mecanismos de alerta – com a instalação de 192 alarmes e 204 câmeras de vídeo – mas a prevenção é o principal eixo para a redução dos casos.
Cada Jovem Conta
Ainda quando estão na escola, alguns estudantes começam a se envolver em bondes, ou facções. Geralmente com dificuldade na família, os adolescentes começam a se envolver em conflitos e, fora do ambiente escolar, praticar pequenos delitos. Esse é um roteiro conhecido para professores e diretores de escolas.
O Cada Jovem Conta foi pensado a partir desse cenário. A ideia, segundo o secretário de Segurança Pública e Cidadania da cidade Alberto Liebling Kopittke, é disputar cada adolescente com o tráfico. A partir de um sistema de monitoramento de violência nas escolas implantado pela secretaria e da percepção das professoras e equipe de educadores, são selecionados alguns jovens com maior vulnerabilidade.
Cada jovem selecionado passa a ter um acompanhamento de perto por um grupo diverso, composto por educadores, assistentes sociais, conselheiro tutelar, assistentes de saúde, guarda municipal e até Ministério Público. Cada novidade no atendimento é passada para todos os membros por meio de um sistema informatizado.
Na Escola Municipal Paulo Freire, por exemplo, um dos que foi indicado para o programa havia começado a praticar pequenos furtos para comprar comida. Isso porque seu avô – o único adulto em sua casa – já não tinha energia para comprar ou fazer comida. O adolescente tinha problemas de concentração e faltava muito.
Em agosto, ele foi incluído no Cada Jovem Conta. Desde então, a assistência social tem feito visitas à casa, e a guarda municipal fez uma combinação com o estudante: se ele for às aulas, poderá levar mangás (quadrinhos japoneses que o estudante gosta de ler) para casa. “Se forma uma rede de atendimento. Os casos não ficam soltos”, explica a diretora Fettuccia. Segundo ela, o monitoramento integrado faz com que os casos tenham resolução continuada – e não se perdem na burocracia como ocorria anteriormente.
Por Clara Roman, da Agência PT de Notícias