Passei dois dias em São Bernardo do lado de tanta gente que foi apoiar e defender a Lula. Meu corpo acabou esgotado, mas tinha a certeza de que lá era onde devia estar.
O que aconteceu lá fez parar a História por um momento. Daqueles dias que marcam as biografias e ficam na memória. Daqueles dias que não devem ser esquecidos.
São Bernardo foram corpos, lágrimas, sonhos, desesperança. Uma polifonia de ideologias, perfis políticos, idades, passados, futuros, que se juntaram não só por Lula, não só pelo PT, por muito mais. Por uma democracia que está sob ataque.
Poucas vezes tinha visto tanta força reunida, mas também tanta angústia e tanta dor coletiva. Dor por um Brasil golpeado que foi melhor é não é mais. Dor por umas togas que destroem. Dor porque essa destruição é apoiada e aplaudida por muitos. O processo contra Lula simboliza todas essas dores. Significa que havia uma luz de esperança para Brasil e agora essa luz é muito mais frágil.
Lembro que um jornalista me perguntou se eu estava lá porque pensava que Lula era inocente. Lembro de ter respondido, cansada, entediada de dar sempre a mesma reposta, que não se tratava de inocência ou culpabilidade e sim de exigir o devido processo penal e as garantias básicas de todo cidadão, de pedir uma justiça imparcial, de querer justiça e não linchamento, de querer juízes e não verdugos. Respostas que deveriam ser óbvias.
Há 100 dias do Sindicato dos Metalúrgicos. Há 100 dias de São Bernardo. Há 100 dias e todos continuamos com a sensação de que quem está nessa cadeia não é só Lula, é um projeto de democracia para Brasil que foi dizimado.
E, não se engane. Você pode gostar ou não de Lula. Você pode gostar ou não do PT. Não importa. Se você for a favor de todos os excessos da Lava Jato, do que você não gosta é da democracia
Por Esther Solano Gallego, socióloga, cientista política e professora de pós-graduação da Universidade Federal de São Paulo