O processo constituinte de 1988, graças a forte participação do movimento de mulheres, trouxe, pela primeira vez na República Brasileira, o reconhecimento dos seus direitos. A Constituição traz como cláusula pétrea que “todos são iguais perante a lei” e que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações. Para além da igualdade formal, ela prevê distinções que visam assegurar essa igualdade, o que significa tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na exata medida de suas desigualdades.
É nessa premissa que se baseia, por exemplo, o artigo 201, parágrafo 7º, da Constituição Federal, que dá tratamento diferenciado à mulher, diminuindo o tempo necessário para se aposentar. Trata-se de discriminação positiva, utilizada para atenuar os desníveis social, político, econômico e cultural existentes entre homens e mulheres.
A PEC 287/16 enviada ao Congresso pelo governo golpista pretende alterar a Constituição para retirar direitos. É uma reforma regressiva das conquistas civilizatórias que trabalhadores e trabalhadoras garantiram por meio de muita luta. Representa garantir por lei o aprofundamento das desigualdades e o fim do único mecanismo compensatório que as mulheres possuem frente a um cenário de completo desequilíbrio ao qual estão submetidas no mundo do trabalho.
Hoje, as trabalhadoras urbanas se aposentam com idade mínima e tempo de contribuição 5 anos menores do que o dos homens. Na proposta de Reforma da Previdência encaminhada pelo governo, a idade e o tempo de contribuição serão equiparados, ignorando que as mulheres têm maiores dificuldades para encontrar emprego e que, quando encontram, experimentam remunerações mais baixas e as inserções mais precárias e desregulamentadas, além do que ainda respondem majoritariamente pelos afazeres domésticos e pelos cuidados familiares.
A Reforma proposta também acaba com a aposentadoria especial de professores da educação básica, prejudicando mais uma vez as mulheres que são 81,5% do total, segundo o MEC. Dos quase dois milhões de professores do país, mais de 1,6 milhão são do sexo feminino. A aposentadoria especial do magistério tem respaldo da Organização Mundial da Saúde (OMS), que considera essa uma das profissões mais estressantes e desgastantes. Sem falar que as professoras, em sua maioria, também cumprem uma terceira jornada em casa, com tarefas domésticas.
Para as mulheres camponesas o golpe é também muito duro. A proposta apresentada pelo governo extingue a condição de segurado especial que garante aos trabalhadores do campo se aposentar aos 60 anos e as trabalhadoras aos 55. Assim, se essa reforma passar, penalizará especialmente as trabalhadoras rurais que terão que trabalhar dez anos a mais. É um perfil de trabalho duro, exposto ao sol e a chuva, e que se inicia ainda na infância. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apontam que, ainda em 2014, 70% das mulheres e 78% dos homens do Campo começaram a trabalhar antes dos 14 anos de idade.
Nada justifica um ataque tão cruel e desumano aos nossos trabalhadores, em especial as mulheres. As condições de desigualdade que deram origem a esses direitos se mantém. Dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) de 2015 mostram que as brasileiras seguem trabalhando mais, ganhando menos e ocupando as piores vagas. A redução de cinco anos concedida hoje nas regras ainda é insuficiente para compensar a dupla jornada. Com essas medidas, o governo Temer mostra mais uma vez que está na contramão da promoção da igualdade de gênero no país e que despreza as mulheres e suas lutas. Não permitiremos tamanha macha ré em nossos direitos! Faremos um 8 de março histórico de luta e de resistência. No RN e em todo o país as mulheres irão parar contra a reforma da previdência! Nenhum direito a Menos! Fora Temer! Diretas já!
Fátima Bezerra (PT-RN) publicado originalmente no PT no Senado.