O PT conhece o Brasil, mas o Brasil não conhece o PT. Essa é uma afirmação que remete à importância histórica e simbólica do Partido dos Trabalhadores no nosso país. Não se trata apenas dos feitos do partido em si analisados de forma pragmática, com dados de governos, mas trata-se de analisar esses feitos de forma contextualizada. Está na hora do povo brasileiro compreender essa análise. Creio que isso já deveria ter sido feito há muito tempo, antes do golpe inclusive, mas nunca é tarde para começar.
Nós, parlamentares, militantes e demais membros do PT, estamos aqui, dentro do partido, porque sabemos a nossa história e compreendemos a contextualização histórica. No entanto, parte significativa da população brasileira não consegue ver dessa forma. Um dos grandes fatores que contribui para isso é o papel nefasto que parte da mídia brasileira faz em relação ao nosso partido na tentativa desmedida de criminalizá-lo. Contudo, não podemos apenas nos prender a isso. Não podemos ser ingênuos de acreditar que os grandes conglomerados de comunicação do Brasil não se voltariam contra o PT ou que, de repente, esses setores se portariam de forma democrática em relação ao partido. Isso não aconteceu e não vai acontecer, pelo menos não enquanto esses conglomerados mantiverem suas estruturas e trabalharem em prol dos seus próprios interesses. De certa forma, abandonamos a necessidade de dar outra versão para além da grande mídia ao longo de todos esses anos e não percebemos o risco que corríamos. Fomos negligentes nesse ponto.
Em suma: o PT é o maior partido de esquerda da América Latina, idealizado pela classe trabalhadora que enfrentou a ditadura militar no final da década de 70. O PT elegeu como presidente o primeiro brasileiro oriundo da classe trabalhadora e a primeira presidenta mulher do Brasil. Na necessidade de contextualizar, citado anteriormente, é imprescindível estender esse pensamento: Lula foi o primeiro presidente vindo da classe trabalhadora, um operário com ensino fundamental, num país onde ter um sobrenome de peso é importante, onde fazer parte de uma família quatrocentona é importante e onde ter um diploma é importante. Todos esses fatores são importantes no sentido de diferenciação. Lula não teve nada disso.
Dilma foi a primeira mulher presidenta num país machista, misógino, com um dos maiores índices de violência contra mulher no mundo. Não é por acaso que muitos dos ataques e ofensas sofridos por ela tinham essa natureza. O ódio à Lula e Dilma, na verdade, pouco tem a ver com política. É importante perceber que os ataques e o golpe em si se referem a como a nossa sociedade se comporta diante das suas “minorias” (coloco entre aspas pois são minorias simbolicamente e não estatisticamente) e como se “arma” para manter sua estrutura de privilégios. Lula e Dilma não simbolizam apenas as “minorias” das quais eles próprios fazem parte. Eles representam também todos as “minorias” que ascenderam socialmente nos 13 anos de seus governos.
O golpe de 2016 foi duro, mas fez com que as máscaras de alguns setores da nossa sociedade caíssem, que as fraturas ficassem expostas. Talvez nunca tenha sido tão duro nós brasileiros ter que olhar para dentro de nós mesmos, como se torna essencial fazer agora. Somos todos machistas, racistas, misóginos, homofóbicos, detestamos pobre, detestamos ter que dividir espaços físicos, afetivos e simbólicos com “gente de segunda classe”. Não está sendo fácil notar todas essas características em nós mesmos. Mas somos apenas isso? Não! Também somos afetuosos, somos alegres, somos solidários, nos adaptamos bem às dificuldades da vida. Essas contradições são traços marcantes do Brasil enquanto civilização. O “contragolpe”, por assim dizer, também deverá ser o resgate desses valores.
Golpe dado, consumado e em pleno curso, a todo vapor, conforme podemos conferir a cada dia nos noticiários. Um silêncio ensurdecedor paira sobre o país. Silêncio daqueles que ingenuamente acreditaram que destituir Dilma Rousseff teria o efeito de um passe de mágica. Silêncio também daqueles que não acreditam em mágica e que preferiam o caos estabelecido a ser governado por uma mulher.
Quem não pode nesse momento ficar em silêncio somos nós, membros do Partido dos Trabalhadores. Será um longo trabalho para mostrar ao povo brasileiro o valor da democracia, a importância do diálogo, da diversidade, do respeito. Enfim, de todos os valores que o golpe tem feito questão de ignorar.
Eu, que me filiei em dezembro de 2016, que acabei de chegar, tenho a nítida e constante sensação de que vai começar tudo de novo. Quando tomei a decisão de me filiar, comentei com uma grande amiga e relatei que a decisão foi tomada a partir do entendimento histórico que enfatizei ao longo de todo esse artigo. Nesse momento, falei “eu era petista há anos e não tinha me dado conta”. Ela respondeu: “somos muitos”.
Quantos somos, afinal? Como podemos nos organizar? Uma proposta a ser debatida nesse congresso é criar algum tipo de organização interna para podermos atuar nos nossos bairros, distritos, cidades e estados.
Vai ter luta!
Por Fernanda Maria de Almeida, graduada em Comunicação Social/Cinema – PUC-Rio, mestra em Ciências Sociais – PUC-Rio e filiada ao PT Petrópolis-RJ desde 19 de dezembro de 2016, para a Tribuna de Debates do 6º Congresso. Saiba como participar.