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Fracasso em Manaus aumenta dúvida sobre uso da cloroquina

Morte de 11 pacientes fez cientistas suspenderem o uso da “panaceia” receitada por Bolsonaro e Trump. CIA manda agentes não tomarem a droga por conta própria

Bruno Caramori

Cloroquina, "panacéia" de Bolsonaro e Trump

Principal aposta do presidente Jair Bolsonaro para enfrentar a pandemia do coronavírus, a cloroquina e seus derivados sofreram duros golpes esta semana. Estudo preliminar feito no Brasil sobre o uso da substância para tratar pacientes com sintomas de Covid-19 foi interrompido depois que 11 pessoas morreram. Os pesquisadores descobriram que uma dose alta da droga pode levar a quadros severos de arritmia ou batimentos cardíacos irregulares. Até 2 gramas, segundo cientistas chineses, podem ser fatais.

A pesquisa, divulgada no último sábado, 11 de abril, em um servidor virtual de informações da área da saúde chamado medRxiv (www.medrxiv.org), cita 81 pacientes que foram hospitalizados com sintomas de Covid-19 em Manaus.

Financiado, entre outros, pelo governo do estado do Amazonas, o estudo foi realizado pela Equipe CloroCovid-19, formada por 26 cientistas de diversos órgãos. Os pacientes foram incluídos na pesquisa antes de receberem uma confirmação do laboratório de que estavam com a doença. Metade deles recebeu uma dose alta e outra metade, uma dose baixa. Também receberam ceftriaxona e azitromicina como parte do tratamento.

No sexto dia de testes, os pesquisadores interromperam o estudo antes do previsto depois que alguns pacientes do grupo que recebeu uma dose alta do medicamento morreram. Os sobreviventes passaram a receber uma dose baixa. Os cientistas solicitaram mais estudos sobre o medicamento.

Segundo o jornal norte-americano The New York Times, especialistas em segurança de medicamentos dizem que a pesquisa brasileira apresenta mais provas de que tanto a cloroquina quanto a hidroxicloroquina podem causar danos severos a alguns pacientes, aumentando o risco de uma arritmia cardíaca fatal. Semelhante à cloroquina, a hidroxicloroquina tem sido vista como “uma derivação menos tóxica” da droga.

Rejeitada nos EUA

Endossada pelo presidente norte-americano Donald Trump – a inspiração de Bolsonaro – a droga não foi aprovada pela FDS, agência que regula o setor de alimentos e fármacos nos Estado Unidos. A FDS emitiu uma autorização para uso emergencial de cloroquina e hidroxicloroquina em pacientes de Covid-19, mas outra agência, a principal de inteligência norte-americana, a desaconselha.

Reportagem do jornal americano Washington Post afirmou que a Agência Central de Inteligência (CIA, em inglês) emitiu um alerta a seus agentes de que a substância tem efeitos colaterais potencialmente perigosos, incluindo morte súbita. Na reportagem, o Washington Post identificou os problemas com a droga no Brasil.

O tópico foi publicado em 27 de março em um site para funcionários da CIA com perguntas relacionadas à disseminação da Covid-19. Um funcionário perguntou se deveria tomar o medicamento sem receita médica. “Nesse momento, o medicamento não é recomendado para ser usado por pacientes, exceto por profissionais médicos que o prescrevem como parte de estudos investigacionais em andamento”, disse a resposta da CIA, com o negrito: “Por favor, não obtenha este medicamento por conta própria”.

Recentemente, a equipe técnica do Ministério da Saúde apresentou uma cartilha de análise de 33 teses sobre o remédio e concluiu que nenhuma é válida de acordo com o ponto de vista científico. O presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), Mauro Luiz Ribeiro, tem criticado a politização do uso da cloroquina no tratamento da Covid-19 e contesta sua eficácia médica.

Benefício desconhecido

“É uma situação inusitada. A cloroquina, hidroxicloroquina, é muito usada para determinadas doenças no Brasil. E é impressionante a forma com que isso tocou. Hoje todos têm opinião sobre tratamento com cloroquina. Não existe nenhum trabalho até hoje publicado na literatura de pesquisa mundial que aponte qualquer tipo de benefício da hidroxicloroquina”, atacou, em entrevista à CNN Brasil.

Enquanto a controvérsia aumenta, o Laboratório do Exército (LQFEx), atendendo a pedido de Bolsonaro, produziu 2,2 milhões de comprimidos de cloroquina. Segundo a coluna Painel, da Folha de S. Paulo, a produção deve aumentar para 1 milhão por semana. Cada pílula custa R$ 0,20. A destinação dos comprimidos caberá ao Ministério da Defesa, afirmou a assessoria da pasta.

Em entrevista à agência de notícias Bloomberg, o ministro da Defesa, general de quatro estrelas Fernando Azevedo e Silva, defende que o Brasil reduza sua dependência de importações de produtos médicos essenciais da Índia e da China. “O próprio ministro da Saúde disse que somos 90% dependentes de suprimentos médicos da Índia. Se houver algum problema, como o Brasil poderá produzir aspirina e novalgina? ”, questionou Azevedo e Silva na entrevista em vídeo.

 

Da Redação

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