Para o ministro do Desenvolvimento Agrário do governo da presidenta eleita Dilma Rousseff, está clara a motivação classista do golpe no Brasil, que derrubou a democracia para atingir os pobres.
Em entrevista exclusiva à Agência PT de Notícias, Patrus Ananias, atualmente deputado federal pelo PT de Minas Gerais, falou dos retrocessos impostos pelo governo golpista de Michel Temer, como a extinção do MDA e suas consequências para a agricultura familiar e a reforma agrária.
“Todos os atos desse governo ilegítimo, que chegou ao poder através de um golpe, apontam claramente: é um governo contra os pobres”, enfatizou.
Os ataques dos golpistas ao Bolsa Família também foram abordados por Patrus, que implementou o programa quando foi ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome do primeiro governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“A presidenta Dilma, numa medida justa, de respeito aos beneficiários do Bolsa Família, determinou um reajuste de 9% no valor do benefício e eles não pagaram esse valor. E eles estão dizendo claramente que vão reduzir o Bolsa Família. É um governo que veio, realmente, a serviço dos grandes interesses do capital internacional e dos seus clássicos tradicionais serviçais no Brasil”, afirmou.
Leia a entrevista completa:
Com a extinção do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), como ficam as políticas da área?
Estou convencido, com base nos fatos, que nós tivemos no Brasil um golpe contra a democracia para atingir os pobres, para penalizar os pobres e reduzir, senão eliminar, as políticas públicas sociais voltadas para os pobres, trabalhadores e trabalhadoras de baixa renda, que nós tivemos no Brasil, especialmente nos últimos anos, nos governos Lula e Dilma.
O fim do Ministério do Desenvolvimento Agrário mostra claramente o descompromisso total desse desgoverno, que é um governo ilegítimo, com relação à reforma agrária e mesmo com relação ao desenvolvimento da agricultura familiar. Nós sabemos que a agricultura familiar cumpre um papel fundamental na alimentação do povo brasileiro
Quais as políticas e os programas que foram mais atingidos por essa extinção do MDA?
Programas fundamentais para o desenvolvimento da agricultura familiar no Brasil estão sendo penalizados, tendo seus recursos retirados, como é o caso do PAA, o Programa de Aquisição de Alimentos da Agricultura Familiar.
O PPA é um programa estratégico porque trabalha nas duas pontas. De um lado ele garante à agricultora e ao agricultor familiar o preço justo na colheita, e na outra ponta, ele atende, com os alimentos adquiridos, famílias e comunidades em situação de vulnerabilidade alimentar.
O Pronaf, o Programa Nacional de Fortalecimento de Agricultura Familiar também está sendo penalizado. O Programa Mais Gestão, que era um programa forte de apoio às cooperativas, também foi praticamente eliminado, penalizando em torno de 170 mil agricultores familiares e extinguindo em torno de mil contratos que estavam beneficiando, dando apoio de assistência técnica às cooperativas.
Agora, além dessa operação desmonte das políticas de apoio e desenvolvimento da Agricultura Familiar, outras medidas no campo social estão sendo tomadas também. Por exemplo, o desgoverno, o governo ilegítimo e golpista do senhor Michel Temer, tem anunciado que vai desvincular as aposentadorias rurais, especialmente o BPC, o Benefício de Prestação Continuada dos reajustes do salário mínimo.
O BPC é um programa que atende pessoas pobres, muito pobres. Trabalha com pessoas idosas, com mais de 65 anos, e pessoas com deficiência, incapacitadas para o trabalho e que sejam pobres. É gente que tem renda em torno de um quarto do salário mínimo. São essas pessoas que estão sendo atingidas, penalizadas, por esse desgoverno.
Ministro, como fica a reforma agrária agora com esse governo golpista?
Não há nenhuma chance. A reforma agrária está ligada a uma concepção de desenvolvimento da agricultura familiar, de nós traduzirmos na prática os princípios constitucionais da função social da propriedade das riquezas, na perspectiva de construirmos uma pátria mais acolhedora, mais justa, mais solidária.
A reforma agrária está vinculada a outras reformas, também estruturantes, como a reforma urbana, na perspectiva do direito à moradia, de consolidarmos os espaços públicos, da preservação dos recursos naturais, nesse momento especial da água.
As reformas agrária e urbana se ligam também com a reforma tributária, na perspectiva de nós estabelecermos impostos progressivos, no sentido que os ricos paguem mais e possam contribuir mais e melhor para o desenvolvimento do País e os pobres sejam menos penalizados.
Essas reformas apontam na perspectiva do desenvolvimento e da justiça social, do respeito à vida e da dignidade humana, que constitui a base de um projeto de nação. Porque a primeira condição de uma nação é incorporar, é integrar em uma vida digna e promissora todas as suas filhas e filhos, tornando realidade o verso do Hino Nacional brasileiro: ‘dos filhos deste solo és mãe gentil’.
E todos os atos desse governo ilegítimo, que chegou ao poder através de um golpe, apontam claramente, é um governo contra os pobres, a serviço dessa entidade nova, misteriosa, esse novo deus, que é o mercado.
Na sua avaliação, como fica a interlocução do governo com os movimentos sociais, agora com esse governo golpista? Há interlocução de Temer e seus ministros com os movimentos?
Está muito claro. O descompromisso desse governo com os pobres, com as questões sociais, implica automaticamente um descompromisso com as entidades e os movimentos sociais. Lembrando sempre que esse é um governo ilegítimo.
Uma experiência muito intensa que nós tivemos no Ministério do Desenvolvimento Agrário foram os nossos encontros periódicos com os movimentos sociais, que nós intitulamos ‘Diálogos da Terra’.
Todas as entidades, todos os movimentos sociais ligados à luta pela reforma agrária, pela função social da terra, pelo desenvolvimento da agricultura familiar, também entidades e movimentos ligados a questão da ecológica, a agroecologia, o cooperativismo, as populações e comunidades tradicionais. A cada três meses nós passávamos uma tarde inteira conversando com essas entidades e com esses movimentos.
O senhor foi o responsável por implantar o Programa Bolsa Família, na primeira gestão do presidente Lula. Qual a sua opinião dessas primeiras iniciativas de Temer sobre o Bolsa Família?
Na mesma linha dos ataques está o Bolsa Família. A presidenta Dilma, numa medida justa, de respeito aos beneficiários do programa, determinou um reajuste de 9% no valor do benefício e eles não pagaram esse valor.
Eles estão dizendo claramente que vão reduzir o Bolsa Família. Assim como vão reduzir também, vinculado à agricultura familiar, toda a parte da segurança alimentar e nutricional do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, como os restaurantes populares, as cozinhas comunitárias, os bancos de alimentos.
São políticas que nós implantamos quando fui ministro do Desenvolvimento Social no governo do presidente Lula. E outros programas também estão sendo visivelmente cerceados, ainda que eles façam um esforço para passar uma imagem diferente.
Mas é muito claro, por exemplo, as restrições ao Minha Casa Minha Vida, especialmente ao Minha Casa Minha Vida Rural, esse extraordinário programa habitacional, se não possivelmente um dos maiores do mundo, seguramente o maior programa habitacional da história do nosso País. E outros programas.
É um governo que veio, realmente, a serviço dos grandes interesses do capital internacional e dos seus clássicos tradicionais serviçais no Brasil.
Quem são os mais atingidos por esse golpe?
Sem nenhuma dúvida são os pobres. As trabalhadoras e os trabalhadores de baixa renda, na cidade e no campo. As agricultoras e os agricultores familiares.
A maneira quase que atropelada, ainda sôfrega, com que o desgoverno foi para cima dos movimentos sociais mostra isso. É a redução do Bolsa Família, é a desvinculação do Benefício de Prestação Continuada, é a extinção das políticas públicas vinculadas à agricultura familiar, são as restrições ao Minha Casa Minha Vida. É toda uma política de submissão total aos interesses do grande capital.
Inclusive, que é muito grave também, a desnacionalização total da economia brasileira. A submissão total do País aos interesses econômicos internacionais.
Estão sendo votados aqui no Congresso, a toque de caixa, sem nenhum debate, sem nenhuma participação da sociedade brasileira, projetos desnacionalizando completamente as empresas de transporte aéreo, a total desnacionalização da saúde pública. Grandes grupos internacionais estão comprando hospitais e cada vez mais, com isso, incidindo sobre as políticas públicas do SUS.
Essa é outra questão muito séria. Os sinais que eles estão demonstrando é de privatização da educação, onde colocaram um político historicamente comprometido com os interesses particulares, até pelo partido ao qual ele pertence, que é historicamente ligado aos interesses privados, contra qualquer presença efetiva do Estado brasileiro.
Quais as consequências dessa crescente desnacionalização?
Essa privatização crescente da saúde, da educação, da cultura, leva a uma perda da identidade nacional.
Então nós temos aí duas grandes perdas: de um lado, as perdas sociais, as perdas que incidem sobre os pobres, trabalhadores, gente que luta com dificuldade, os que têm fome e sede de justiça, que querem um Brasil melhor.
De outro lado, a incidência é sobre o próprio País, é sobre a pátria brasileira, no sentido que nós não tenhamos um projeto de nação, que pressupõe uma economia nacional que vai se consolidando e, sobretudo, preservando a nossa identidade, a nossa cultura e os nossos valores.
Por isso nós temos que trabalhar fundo, com determinação para que esse governo ilegítimo não prevaleça.
E como fazer para que ele não prevaleça?
Eu penso que nós temos no Brasil hoje dois grandes desafios. De um lado, articular todas as forças democráticas para resistirmos ao golpe, que quebrou as regras do jogo, para restabelecermos no País as normas, as regras constitucionais e democráticas, o Estado Democrático de Direito, que é uma grande conquista que nós tivemos.
E de outro lado, nós unirmos as pessoas de boa vontade, as pessoas efetivamente comprometidas com o nosso País e com as gerações presentes e futuras, em torno dos projetos sociais, protegermos o que está aí, que eles querem destruir, e ao mesmo tempo recolocarmos os temas fundamentais para o futuro do Brasil.
E também, neste momento temos que ter adesão e compromisso com a volta da presidenta Dilma.
Hoje, para que o Estado Democrático de Direito e a democracia no Brasil sejam preservados, isso pressupõe uma coisa: que a presidenta Dilma reassuma. Porque ela foi afastada de uma forma ilegítima, por um golpe. Ela não tem nenhum processo jurídico e não há nada comprovado contra ela. Então o fim do golpe, de um governo ilegítimo, e a volta da presidenta.
Precisamos fazer a defesa vigorosa da volta do Ministério do Desenvolvimento Agrário, com seus conteúdos. A defesa vigorosa de programas sociais que nós implantamos no Brasil, como o Bolsa Família. A defesa do BPC, que ele continue vinculado aos reajustes do salário mínimo, por uma questão de justiça social, de respeito a essas pessoas e famílias, que são muito pobres.
Estamos lutando contra a efetivação de um golpe de direita, um golpe conservador dado em nome dos interesses do capital, dos grandes interesses econômicos que eu disse e quero reiterar: dos grandes interesses econômicos internacionais e os seus históricos serviçais aqui no Brasil.
É um golpe a serviço do mercado, do dinheiro. Ele tem nome, endereço, ele é bem identificável e tem deixado claro a que veio, com as suas propostas, com as suas iniciativas, com as medidas profundamente antidemocráticas, antissociais e antipopulares. E nós estamos lutando em nome de um projeto nacional.
É fundamental, então, que as forças democráticas, que nós podermos chamar de as forças de esquerda ou de centro-esquerda, o chamado campo democrático popular, as forças progressistas, que nós todos estejamos unidos. Forças políticas, sociais, econômicas, culturais. Em torno desse compromisso com a democracia e a justiça social. Há uma disputa de projetos no Brasil hoje, como nós tivemos em 64.
Por isso que eu acho que nesse momento nós estamos lutando contra um golpe que é um golpe contra o povo brasileiro.
Por Luana Spinillo, da Agência PT de Notícias