O desgoverno Bolsonaro acrescentou mais um elemento ao acelerado processo de desindustrialização do Brasil. Desta vez, é a redução de 10% na alíquota do imposto de importação sobre produtos de informática, telecomunicações e bens de capital (máquinas e equipamentos). A decisão do Comitê-Executivo de Gestão da Camex (Câmara de Comércio Exterior do Ministério da Economia) alcança 1.495 produtos que não dependem de negociação com os demais membros do Mercosul.
No momento em que o ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, alega falta de recursos para financiar o auxílio emergencial para trabalhadores informais, sua pasta prevê que a medida deve gerar uma renúncia anual de arrecadação de US$ 250 milhões (aproximadamente R$ 1,4 bilhão).
A pasta projeta a criação de 20 mil postos de trabalho em um futuro indefinido, mas os impactos imediatos em um setor já em decadência pela falta de política industrial preocupam. Nesse momento, o país contabiliza mais de 14 milhões de desempregados.
No Twitter, o deputado federal Zé Ricardo (PT-AM) publicou vídeo criticando a medida. “Mais uma ameaça à Zona Franca e aos fabricantes de celulares, de computadores e outros equipamentos. Mais uma vez temos que defender nossos empregos” escreveu o deputado. “Isso deve afetar os produtores no Brasil e em Manaus, como de celular e computadores. Vai gerar emprego no exterior. Eita governo anti-Brasil”, completou Zé Ricardo.
Indústria apreensiva com medida
O presidente da Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), José Jorge Júnior, aguarda a publicação da medida para avaliar os impactos no setor, mas vê o anúncio com apreensão. “Uma redução de impostos de importação, de forma inusitada, é algo nos deixou muito preocupados, principalmente com o recado do governo de que vão ocorrer outras reduções para todos os produtos.”
Segundo José Jorge, no Amazonas, que acabou de perder a fábrica da Sony, serão atingidos produtos como máquinas de lavar de roupa e as de alta pressão (a jato), e ainda ar-condicionado industrial. “Ninguém é contra a abertura comercial nem a sua ampliação, mas não se pode fomentar apenas a importação. Nós queremos exportar também e para isso é preciso dar condições à indústria nacional”, criticou.
O Ministério da Economia anunciou que a medida da Camex será acompanhada de uma reforma “mais geral” em toda Tarifa Externa brasileira. Na prática, o Brasil tem desonerado impostos de importação sem exigir nenhuma contrapartida de parceiros internacionais.
Atentado à indústria e à soberania
A participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) caiu de 17,8% em 2004, para 11% em 2019. As políticas neoliberais dos anos 1980 e 1990, e a operação Lava Jato, a partir dos anos 2010, foram catalisadores desse processo.
Bolsonaro e Guedes, que em nenhum discurso ou projeto tratam como prioridade o aumento da participação da indústria no PIB, atentam não apenas contra um setor importante da economia nacional, mas também contra a soberania nacional.
Enquanto a escassez global de chips afeta a produção de várias cadeias produtivas, da automotiva à de smartphones, Bolsonaro liquida o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), única empresa na América Latina capacitada a produzir circuitos integrados.
Criado em 5 de fevereiro de 2010, pelo então presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, o Ceitec desenvolveu uma série de produtos e mantém 44 patentes registradas. O portfólio inclui o CTC11002 (Chip para identificação animal), que é produzido em escala comercial. Em 2012, a “estatal do chip” assinou convênio com a Casa da Moeda do Brasil para a produção do chip do passaporte brasileiro.
A extinção do Ceitec foi decretada por Bolsonaro em dezembro do ano passado. No mesmo mês, o deputado Patrus Ananias (PT-MG), secretário-geral da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional, protocolou projeto de decreto legislativo (PDL 557) para suspender o decreto.
Em fevereiro, o governo federal conseguiu derrubar uma liminar da Justiça Federal do Rio Grande do Sul que impedia a realização da assembleia geral extraordinária para dar continuidade à extinção do Ceitec. O oficial da reserva da Marinha Abílio Eustáquio de Andrade Neto foi escolhido para comandar as atividades de diluição da empresa.
O militar tem 30 dias para apresentar um plano de trabalho ao Ministério da Economia, com o cronograma de atividades da liquidação, prazo de execução e a previsão de recursos financeiros e orçamentários para as atividades. Abílio já atuou na liquidação de outra estatal, a Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais (Casemg).
Da Redação.