Há tempos fiquei relembrando das lutas travadas pelos brasileiros em prol da democracia e da liberdade de expressão durante os anos de chumbo, após o Golpe Militar, e que desencadeou a Ditadura Militar no Brasil até 1985. Quanta ânsia, quantos sonhos perdidos de uma juventude fadada a tomar a dura decisão de ser submissa ou lutar. A escolha de se calar não pode ser tachada como um ato de covardia e fraqueza, porque os anos eram de “chumbo” mesmo, e dos grossos.
As torturas eram estrategicamente dolorosas e não deixavam marcas externas. Por isso, aqueles que decidiam lutar tinham consciência dos riscos aos quais estavam expostos se fossem pegos: tortura, prisão ou morte.
Nesta agônica incerteza que os jovens brasileiros viviam nas décadas de 60, 70 e 80, há uma lista com 379 nomes de pessoas assassinadas, vítimas da ditadura militar instalada no Brasil há 50 anos. Que vergonha!
Muitas vidas foram aniquiladas e arbitrariamente alteradas durante esta época e ainda entoam na vida daqueles que militaram e sobreviveram à tortura e prisão. Mesmo com tamanha tragédia, comemoramos o fim da ditadura destacando o sofrimento heroico de mulheres e homens que eram considerados pelos militares como subversivos. Quanta ironia.
Entre os militantes comunistas, quero destacar a ação das mulheres que decidiram lutar e sofreram as mesmas torturas aplicadas aos homens, mas com maldades à parte: mutilação dos seios, do órgão genital e aborto forçado. Isso quando apenas socos, chutes e choques elétricos não eram suficientes.
Entre estes ‘subversivos’, destaco a presidenta Dilma Rousseff que, ainda menina, foi presa e torturada pelos militares. Dilma Vana Rousseff é, até hoje, reconhecida pelos colegas da então Organização Revolucionária Marxista – Políticas Operárias (Polop), depois Colina (Comando de Libertação Nacional) e por último da VAR – Palmares (Vanguarda Armada Revolucionária Palmares), como uma companheira estudiosa e dedicada às ações do grupo do qual fazia parte.
Dilma liderou muitas das ações organizadas pelos grupos. Companheiros daquela época defendiam a atuação de Rousseff – uma jovem universitária do curso de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais – em movimentos com os operários e estudantes, assim como na função de ministrar as aulas sobre o Marxismo e formação política daqueles que gostariam de se unir ao grupo revolucionário.
Assim como Dilma – ex-secretária estadual, ex-ministra e agora presidenta do Brasil – muitas mulheres que sobreviveram à ditadura são hoje intelectuais, que se tornaram profissionais e professoras universitárias de respeito, que seguiram suas vidas, cultivaram seus ideais, formaram suas famílias, tiveram filhos – algumas crianças cresceram na prisão, para serem amamentadas pela mãe prisioneira – e, hoje, fazem parte de um honroso grupo de mulheres que foram, assim como muitos homens, estrategistas, líderes e operadoras em ações anti-ditadura e cravaram os seus nomes na história do nosso país.
O canal a cabo GNT exibe, toda semana, um capítulo do documentário “Mulheres à luta”. A produção mostra o relato de mulheres que militaram contra a ditadura. Os depoimentos são carregados de fortes emoções, como o detalhamento das torturas físicas e psicológicas que sofreram na mão de militares, impunes até hoje, e da felicidade intransferível que sentiram quando ganharam novamente o direito à liberdade. Uma verdadeira aula de civismo e patriotismo.
Cada sinal da idade aparente no rosto destas mulheres, hoje com mais de 60 anos, relembra para nós, brasileiros, o caminho recente percorrido por este país com mais de 500 anos e que se prepara para a sua sétima eleição nacional. Mesmo atrasados na democracia perante um mundo inteiro, devemos todo o agradecimento a estas mulheres, a maior das reverências. Nós, mulheres, devemos à essas senhoras lutadoras, a nossa luta pela permanência desta democracia tão desejada e conquistada com muito derramamento de sangue.
Devemos participar da política do nosso país, ser parte das tomadas de decisões, criar projetos de leis e nos fazer ouvidas nas Câmaras Municipais, Assembleias Legislativas e na Câmara dos Deputados.
Temos que lutar pelo nosso espaço, o direito de sermos no mínimo a metade: 257 deputadas federais, 47 estaduais, 14 governadoras, 2.782 prefeitas e, sempre, nos mantermos na liderança do nosso país. Assim os amigos de Dilma a reconheceram: como líder, assim são todas as brasileiras.
Iara Bernardi é deputada federal pelo PT-SP