O episódio da prisão e subsequente soltura de Marice Corrêa de Lima, cunhada do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, é um importante alerta para sociedade brasileira. Na ânsia de levar ao limite o uso da restrição de liberdade como ferramenta de intimidação de suspeitos – logo, presumidamente inocentes –, o juiz Sérgio Moro cometeu, até aqui, o seu erro mais grave.
“Moro flerta com a arbitrariedade, mas não consegue perceber a gravidade do que faz”
Marice ficou cinco dias encarcerada, exposta à execração pública e jogada na fogueira da mídia porque, acostumado a não precisar mais balizar suas certezas, o juiz Moro decretou que as imagens de uma câmera de segurança do banco Itaú, em São Paulo, não deixavam “qualquer margem para a dúvida”: era Marice e pronto.
Marice é muito parecida com a irmã, Giselda Rosie de Lima, mulher de Vaccari, petista preso desde 15 de abril na carceragem da Superintendência da Polícia Federal do Paraná, em Curitiba. No inquérito, foi acusada de ter depositado dinheiro de propina da empreiteira OAS, investigada na Operação Lava Jato, na conta bancária de Giselda.
Em depoimento à Justiça Federal do Paraná, Marice negou ter sido ela a pessoa flagrada nas imagens do banco. A mulher do registro, insistiu, era a irmã. Giselda, por sua vez, também disse a Moro que era ela, a mulher, não a cunhada de Vaccari, que tinha ido ao banco fazer o depósito do dinheiro.
Antes de este imbróglio ser decido, no entanto, a família de Vaccari já havia sido enxovalhada pela mídia e pelos cães de guarda da oposição nas redes sociais. Centenas, talvez milhares, de perfis no Twitter e no Facebook replicaram como mantra as afirmações do Ministério Público Federal e de Sérgio Moro que acusavam Marice de “faltar com a verdade flagrantemente”.
Ao se utilizar da prisão de suspeitos como ferramenta de investigação, Moro flerta com a arbitrariedade e parece não perceber a gravidade do que faz, por duas razões.
Primeiro, pelo apoio incondicional e, não raras vezes, irresponsável da mídia à utilização da Lava Jato para perseguir politicamente o PT. Segundo, porque o juiz Moro tem sido obrigado a se meter na velha guerra de vaidades entre o Ministério Público Federal e a Polícia Federal quando se trata de ações espetaculares, sobretudo aquelas adotadas como campanha antipetista pela velha mídia nacional.
Em 15 de abril, portanto, no dia em que João Vaccari Neto foi preso, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu e obteve do ministro do Teori Zavascki, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, a suspensão de depoimentos de sete inquéritos. Motivo: a disputa de poder entre procuradores e policiais federais pelo protagonismo nas investigações sobre esquema de corrupção na Petrobras.
MP e PF, embora sejam obrigados a trabalhar em equipe, formam uma falsa irmandade. A cada passo da Lava Jato, Moro é obrigado a pisar em ovos para não melindrar procuradores e delegados e, ao mesmo tempo, se manter no noticiário como timoneiro de toda a operação.
Nesse sentido, o caso de Marice se tornou emblemático.
Apesar de a dúvida ser sempre pró réu, o Ministério Público Federal se manteve favorável à prisão da cunhada de Vaccari. Trata-se de uma inversão de valores cada vez mais perigosamente em sintonia com investigações que envolvam petistas, sob apupos da mídia e de ativistas do golpe, nas redes e nas ruas.
A Polícia Federal acabou dando uma saída menos vergonhosa a Moro. Os federais informaram ao juiz que a perícia das imagens só irão ficar prontas em uma semana. Diante disso, Moro, frente à alternativa de manter uma inocente em cana apenas para satisfazer a plateia, decidiu revogar a prisão imediatamente.
Que sirva de lição ao magistrado e àqueles que, no Poder Judiciário, têm poder e consciência para dar um basta nessa situação.
José Américo é deputado estadual pelo PT de São Paulo e secretário nacional de Comunicação do partido