É necessário ousadia para inaugurar um novo ciclo de transformações sociais
Em 10 de fevereiro de 1980 nasceu uma ferramenta capaz de dar voz a classe trabalhadora deste país, capaz de ser síntese dos anseios por democracia e igualdade. Nascimento chancelado nas lutas dos movimentos sociais, nas grandes greves, na luta por reforma agrária, na luta por vida digna na cidade.
Por onde governou, o Partido dos Trabalhadores fez gestões transformadoras e sua chegada à Presidência da República não poderia ter sido diferente. Ao longo dos seus 35 anos mudou radicalmente a qualidade de vida dos trabalhadores e trabalhadoras deste país. Sem dúvidas somos até aqui um dos projetos de esquerda de maior sucesso na história.
Contudo, chegamos ao nosso quarto mandato à frente da Presidência da República com desafios grandiosos. Grandiosos frente ao nosso programa, à situação econômica e política do país e frente ao patrimônio político até aqui construído por nós.
Considerando as opções políticas do governo Dilma em sua composição, vemos tristes acenos aos setores conservadores em detrimento dos trabalhadores, tendo como maior símbolo a equipe econômica. Essas opções alimentam o sentimento de desconfiança daqueles que sustentaram nosso projeto nas ruas antes e, especialmente, durante as eleições.
Vivemos hoje um esgotamento do pacto político e econômico – o lulismo – que permitiu profundas transformações durante nossos três mandatos à frente da Presidência da Republica.
A manutenção do pacto conservador realizado com o capital financeiro, retratado no tripé macroeconômico, e o curto horizonte estratégico do governo impediram a constituição de um novo modelo de crescimento com inclusão social.
O estabelecimento de uma nova estratégia de desenvolvimento é cabal, pois no contexto de crise econômica internacional desapareceram as condições externas favoráveis que tornaram o lulismo possível.
O mercado interno ampliado pela ascendente classe trabalhadora e os incentivos fornecidos pelo governo sustentaram o nível de emprego, mas não geraram nova dinâmica de crescimento.
O resultado já foi percebido nos últimos dois anos, seja pela estagnação dos rendimentos reais dos trabalhadores seja pelo arrefecimento do ritmo de queda da desigualdade. Esses indicadores, conquistas mais fundamentais do ciclo de governos populares, correm hoje grave risco de reversão.
As medidas econômicas conservadoras tomadas nesse início de mandato de Dilma não respondem a esses desafios, uma vez que aumentam o peso da carga tributária sobre os trabalhadores e a classe média, enquanto seguem preservando os mais ricos.
O resultado destas opções é cada vez mais sentido pelo conjunto da classe trabalhadora, à qual não são oferecidos os sinais necessários. Enquanto prioriza um ajuste “pró-mercado”, o governo se afasta do programa apresentado nas eleições e trai a confiança dos únicos dispostos a defender o governo em circunstâncias bem adversas – e na rua se preciso.
A eleição para mesa diretora da Câmara Federal foi um demonstrativo do fortalecimento das forças conservadoras e fisiológicas nas eleições de 2014. Assim como deverá servir como um alerta para a necessidade de se repensar a aliança que dá “sustentação” ao governo.
A vitória de Eduardo Cunha é um entrave para os avanços das reformas estruturantes do Estado brasileiro. A burguesia nacional, que teve grandes dificuldades de se organizar durante a última década, inaugura um novo período onde se apresenta organizada estrategicamente e consensuada entre seus pares, criando condições para pautar a agenda política do País.
Nessa conjuntura, não podemos permitir que um programa conservador capitalize a insatisfação da população ou se apresente como solução para seus anseios. Precisamos defender o programa político que empenhamos durante o processo eleitoral, confrontando a direita ideologicamente e, ao mesmo tempo, disputando os rumos do Governo Dilma.
É necessário acumular força, constituir uma frente de esquerda que aglutine forças políticas, sociais e culturais comprometidas com as reformas estruturantes do Estado brasileiro. Para isso, será crucial recuperar a capacidade de mobilização e de diálogo com novas pautas da população. Além disso, nosso discurso e prática devem reforçar os elementos de reformismo radical, que são oportunos ao período de crise.
Para isso, o 5º Congresso do PT será um momento especial, pois é fundamental que se debata a atualização de nossa estratégia e se repense as estruturas deste partido. É urgente o processo de desburocratização para que nos abramos para as formas novas e tradicionais de organização, garantindo a oxigenação necessária para enfrentar os desafios colocados a nossa história.
Temos pouco tempo e uma oportunidade histórica.
Laura Sito é membro do Diretório Nacional do PT e graduanda de Jornalismo pela UFRGS
Guilherme Morlin é mestrando em Economia pelo IE/UFRJ