Partido dos Trabalhadores

Lula à AFP: “Não tenho medo da prisão, sou inocente”

Leia a entrevista concedida pelo ex-presidente nesta desta quinta-feira (1) à Agence France Presse (AFP)

Ricardo Stuckert

O ex-presidente Lula vestindo camisa recebida de Evo Morales, no Rio de Janeiro

*Reproduzida da AFP

O ex-presidente foi condenado a 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4). Ele garante, entretanto, que todas as acusações foram montadas para desmoralizar sua candidatura e impedir a volta do Partido dos Trabalhadores (PT) ao poder.

Atualmente, ele tenta conseguir um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para impedir sua prisão quando se esgotarem seus recursos no TRF-4. Contudo, a Justiça eleitoral ainda pode torná-lo inelegível.

“Se eles resolverem me condenar e me prender, eles estarão condenando um inocente, prendendo um inocente. Isso tem um preço histórico. Se querem tomar essa decisão, vão arcar com a responsabilidade do que vai acontecer no país”, alertou. “Por isso, eu durmo tranquilo”, afirmou Lula.

Durante uma hora e meia de entrevista, realizada no Instituto Lula, em São Paulo, ele descartou, no entanto, criar tensões eleitorais.

“Vamos disputar democraticamente a eleição. Esse país não tem a cultura da violência no processo eleitoral”, disse.

Vestido com uma camiseta vermelha e um paletó azul escuro, ele falou das dificuldades de formar alianças de governo no Brasil.

Não há risco de ter uma campanha mais focada em seus problemas judiciais que nos do Brasil?

Eu na verdade não discuto o problema judiciário. Eu tenho consciência do que está acontecendo no Brasil, que os meus adversários e uma grande parte da elite econômica brasileira não querem que eu seja candidato à Presidência da República, e a única forma que eles encontraram para evitar que eu seja candidato foi uma quantidade de mentiras, uma quantidade de inverdades, ou seja, quase que um crime contra nossa própria Constituição. Eu tenho desafiado a Polícia Federal, o Ministério Público, o juiz a provar um crime que eu tenha cometido.

Enquanto isso, eu vou fazendo campanha.

Líderes do PT e de movimentos sindicais estão dizendo que se o senhor for impedido de ser candidato, ou preso, pode haver distúrbios e até mesmo mortes nas ruas.

Eu não trabalho com essa hipótese, só vou discutir essa hipótese quando acontecer. (…) O que estamos vendo no Brasil nesse momento é quase um assalto ao poder, feito pelo Poder Judiciário, representado pelo MP, pela Justiça Federal de Curitiba e pela imprensa.

Queremos acreditar que a Constituição seja cumprida, que todas as instituições voltem a funcionar corretamente.

O senhor está preparando uma “Carta ao povo brasileiro”…

Quando ganhei as eleições em 2002 havia um certo terrorismo contra minha candidatura, de que eu não iria cumprir os compromissos externos do Brasil, então naquela ocasião eu preparei uma carta ao povo brasileiro, que era tentando mostrar ao mercado o compromisso que o Partido dos Trabalhadores tinha com Brasil. Agora, eu quero fazer uma carta ao povo brasileiro para o povo brasileiro

Qual vai ser o foco?

É uma carta assumindo o compromisso com o povo, o que é o que eu quero fazer neste país (…) É possível fazer as coisas diferente do que esta sendo feito. Você não tem que vender patrimônio público. Você não tem que fazer corte na educação, na saúde, nas ciências e na tecnologia para poder equilibrar as finanças publicas.

Quando vai ser divulgada?

Essa carta estou trabalhando com muito carinho porque ela vai ser a base inclusive do programa de governo que a gente está fazendo. Eu penso que mais alguns dias, quem sabe uns quinze dias (…).

O senhor tem alto índice de rejeição e a maior intenção de voto. Não acha que seria o momento de abrir espaço a um candidato que gere menos polarização?

Não existe país que não seja polarizado (…) Nenhum partido vai ganhar com 80% (…) Toda eleição, na verdade, ela mostra uma divisão num país. Agora, o que é importante é que um governante que ganha e os políticos que perdem precisam perceber que, terminadas as eleições, acabada a disputa eleitoral, você tem que governar. Não vejo problema de polarização, ela existe na sociedade, no futebol, na religião, na política, na cultura. Não podemos temer da polarização.

Passa pela cabeça do senhor que poderia ir preso? Como lida com isso? Já pensou como seria um Lula na cadeia?

Passa todo dia. Eu não tenho problema. O problema é que eu não tenho medo e não estou preocupado. (…) Toda história tem consequências. Uma prisão pode durar muito tempo, como a de (Nelson) Mandela, que durou 27 anos, ou pode durar muito pouco tempo, como a de (Mahatma) Gandhi.

A única preocupação que eu tenho nesse momento é tentar mostrar minha inocência. Se eles resolverem me condenar e me prender, eles estarão condenando um inocente, prendendo um inocente. Isso tem um preço histórico. Se querem tomar essa decisão, vão arcar com a responsabilidade do que vai acontecer no país. Por isso é que eu durmo tranquilo.

Não vou para nenhuma embaixada, não peço asilo político, não vou me esconder, não vou me matar. Eu vou brigar. A única coisa que me motiva é brigar, porque eu tenho uma única coisa para defender, que é minha inocência.

Eu estou disposto a ir às últimas consequências para provar minha inocência.

E isso significa ir até o último momento da campanha eleitoral…

Lógico, lógico, por que é que não iria? Está cheio de pessoas que não têm 1% de aceitação e querem ser candidatos, porque é que eu que tenho 40% não quero ser?

Tem uma agenda internacional durante a campanha?

Se for confirmada minha candidatura, eu quero fazer uma viagem por alguns países da América Latina. Tenho uma palestra em Moscou, quero ver se vou o mês que vem, teria que ir a China (…) mas tudo vai depender da agenda, porque tenho de fazer três caravanas. Preciso acertar minha vida aqui dentro para poder viajar.

Por AFP