As reações da mídia à fala de Luiz Inácio Lula da Silva, na sexta-feira (16), no 4º Encontro Nacional de Blogueiros e Ativistas Digitais, não poderiam ter sido mais emblemáticas. No evento organizado, em São Paulo, pelo Centro de Estudos de Mídias Alternativas Barão de Itararé, o ex-presidente defendeu a aprovação do marco regulatório contra o monopólio dos meios de comunicação no Brasil. Além disso, criticou duramente os ataques da imprensa contra a presidenta Dilma Rousseff e o PT. Falou, com um tipo de franqueza pouco comum na política brasileira, sobre sua relação com a blogosfera progressista: “Eu me dou o direito de dar entrevista para quem eu quero, na hora que eu quero”.
A frase foi um recado direto ao moralismo de ocasião do jornal “O Globo”, do Rio de Janeiro, que em abril mobilizou-se para desqualificar uma entrevista de três horas de duração concedida por Lula a blogueiros e ativistas digitais, na sede do Instituto Lula, na capital paulista. Para interditar a comunicação de Lula com a blogosfera, o jornalão carioca partiu, sem sucesso, para a desqualificação rasa dos blogueiros e da disposição do ex-presidente em falar com eles – um misto de inveja e despeito com origens no absoluto descolamento da realidade em que vivem, na área de comunicação em rede, os jornalões brasileiros.
Hoje, um dia depois do discurso de Lula, coube à “Folha de S.Paulo” resumir em uma manchete (“Para Lula, cobrar metrô em estádio é ‘babaquice’”) a impaciência do ex-presidente com as manipulações primárias da imprensa, conforme discursou à audiência de mais de 600 participantes do encontro de blogueiros.
O petista falou de questões estruturais da democracia, entre as quais a questão essencial do marco regulatório da mídia como condição para o avanço civilizatório no Brasil. Disse, ainda, da importância da convocação de uma assembleia nacional constituinte exclusiva para se fazer a reforma política.
Mas a “Folha” preferiu sair com uma fala paralela, colocada dentro de uma circunstância de informalidade muito típica dos discursos de Lula, sem nenhuma relevância até mesmo para o tema que a gerou – a Copa do Mundo de 2014. O expediente, manjado e jornalisticamente desprezível, serviu tanto para o diário paulistano escapar da discussão central (o monopólio da mídia) como para alimentar o discurso da direita rastaquera nas redes sociais contra Lula e o PT.
Essa solução, usada em graus diferentes pela velha mídia nacional, foi, no fim das contas, um recurso desesperado diante da chuva de argumentos enumerados por Lula para justificar a necessidade de um marco regulatório, tanto para as concessões públicas de rádio e tevê, como para a questão da propriedade cruzada – jabuticaba tupiniquim que permite aos conglomerados de comunicação possuírem, num mesmo estado e região, emissoras de rádio e tevê, além de jornais e revistas.
Assim, ao tratar do tema, Lula teve o cuidado de listar uma série de modelos adotados em diversos países, entre os quais os Estados Unidos e a Inglaterra. Fez questão de esclarecer que não se tratava de censura, e ainda fez graça com o sentimento anti-esquerdista das redações brasileiras, de onde se extrai a doença infantil do antipetismo: “Para não dizerem que sou socialista, citei apenas países que são símbolos da democracia ocidental. Então, que não venham dizer que isso é censura”. E mais: “Não estamos tentando controlar os meios de comunicação. Nós exigimos é que haja neutralidade e seriedade nas informações neste País. As notícias que são produzidas aqui fazem uma guerra tentando mostrar que nesse País está tudo desandado, que nada está dando certo”.
Lula usou o exemplo da perseguição implacável da mídia paulistana contra o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, do PT, presente ao encontro de blogueiros. “Haddad, se fosse responsabilidade sua, seria porrada todos os dias, mas como é deles, então, não está tudo bem”, disse, ao se referir ao colapso de abastecimento de água em São Paulo por conta da inépcia administrativa do governo de Geraldo Alckmin, do PSDB.
A mídia, que esconde a crise do Sistema Cantareira atrás de cortinas de eufemismos e malabarismos de retórica, sentiu-se particularmente atingida pelo discurso de Lula, que foi muito mais claro do que as dezenas de “especialistas” usados pelos jornais para transformar racionamento em rodízio.
Diante também do ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha, pré-candidato do PT ao governo paulista, Lula atentou para o fato de que, simplesmente, os investimentos no setor hídrico não acompanharam o crescimento da maior e mais importante cidade do País. “Será que ninguém pensou em fazer mais um poço? Cadê o choque de gestão?”, questionou.
Lula aproveitou o tema para fazer piada com o termo “blogueiro sujo”, criado pelo tucano José Serra, na campanha eleitoral de 2010, para atacar a blogosfera progressista e de esquerda. Foi um tiro pela culatra: os blogueiros não só adotaram o termo para si, como passaram a usá-lo como peça de marketing.
“Aqui em São Paulo, ser chamado de ‘blogueiro sujo’ é culpa do Alckmin, porque o Cantareira secou”, brincou Lula, para alegria da audiência.
Essa, aliás, talvez seja uma diferença fundamental da comunicação de rede montada pelos progressistas e a tropa de cavalaria mantida pela mídia nas redações e em suas redes digitais ultra hierarquizadas: o bom humor.
No encontro de São Paulo, o que fez os blogueiros rir gerou, de imediato, reações casmurras na velha mídia nacional. Menos pela distinção dos interesses defendidos, mais por aquilo em que a imprensa se transformou nos últimos 12 anos de governos do PT: um depositório de ódios criado para subjugar, primeiro, o bom jornalismo, e que caminha num voo cego com o objetivo de, no fim das contas, subjugar a política em si.
E a mensagem crucial que Lula deixou aos blogueiros e ao País foi justamente esta: se depender dele, eles não conseguirão.
Por Leandro Fortes, da Agência PT de Notícias