Nos últimos anos, um consenso sobre a necessidade da reforma política tornou-se mais sólido entre a sociedade brasileira. A eleição de 2014, a mais cara da história do país, expôs o quanto é preciso mudar, mas mudar para melhor.
Ao tratarmos do tema no Congresso Nacional, precisamos estar atentos à participação da sociedade na construção da melhor reforma para o Brasil, afastando a possibilidade de uma antirreforma de caráter elitista, que vincule ainda mais a representação ao poder econômico e fragilize a representatividade das instituições democráticas.
O texto da Proposta de Emenda à Constituição 352/13, apresentada por grupo de trabalho liderado pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que está sendo tratado como reforma política, desconsidera debates realizados pela sociedade civil por meio de recomendações de entidades como OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), e movimentos organizados nas ruas e nas redes, como o plebiscito popular pela Constituinte exclusiva.
Ignora, sobretudo, o sentimento da população de que a política deve ser serviço público dedicado à promoção de justiça social.
A PEC constitucionaliza a influência do poder econômico nas campanhas eleitorais ao não impedir o financiamento empresarial, base do patrimonialismo e das redes clientelistas, gene principal da corrupção. Será um engodo qualquer proposta de reforma política que não verse sobre esse tema.
Há outra medida igualmente perniciosa à consolidação democrática em curso no Brasil desde a Constituição de 1988: o voto facultativo. Seria uma mudança de caráter reacionário que comprometeria a nossa jovem democracia, que se estruturou no reconhecimento da igualdade e que garantiu, pela primeira vez na história, a participação de massas na definição dos rumos do país.
Quem defende o voto facultativo quer retornar a um sistema político que mais se aproxima do voto censitário, no qual poucos definiam o destino de todos. Os mesmos que discursam contra a política e constroem argumentos para desmerecê-la, defendem o voto facultativo sem se preocupar que os altos índices de abstenção possam levar a uma crise na legitimidade das instituições.
Outro aspecto é a redefinição de distritos eleitorais. Essa mudança no modelo do sistema eleitoral diminuirá o poder de escolha do eleitor que ficará restrito ao local onde mora, e não ao Estado.
O resultado pode ser a distorção da perspectiva do eleito que, mesmo integrando o Congresso Nacional, pode se distanciar do debate estrutural do país. A Federação brasileira não é soma de distritos, mas uma unidade política.
Se em alguns aspectos a PEC retrocede, em outros é completamente omissa. Não versa sobre o fortalecimento dos partidos enquanto vetores de fundamentos políticos ideológicos e de projetos coletivos.
A ampliação da representação das mulheres nos espaços políticos nem sequer é tema merecedor de debate na dita reforma. Consideramos que o Legislativo jamais será genuinamente representativo enquanto mais da metade da população brasileira seguir sendo alijada da participação, distorção inaceitável que precisa ser combatida.
Por isso, a PEC 352/13 não pode ser a única referência para o debate na Câmara, e a Comissão de Reforma Política deve envolver a sociedade nessas discussões. Não à antirreforma!
Maria do Rosário é deputada federal pelo Rio Grande do Sul