A organização não governamental Médicos Sem Fronteiras, que atua no combate a pandemia em 90 países, avalia que a maior parte das 400 mil mortes por Covid-19 no Brasil teria sido evitada caso o governo Bolsonaro tivesse orientado a população a seguir medidas básicas de prevenção. Em passagem pelo Brasil, o presidente da entidade, Christos Christou, condenou a omissão de Bolsonaro na crise sanitária.
“Não posso deixar de apontar o governo federal como o responsável pela falta de qualquer mensagem consistente, de uma abordagem científica, e de uma resposta coordenada, centralizada”, afirmou o presidente da ONG, em entrevista à Folha de S. Paulo.
“Posso dizer que muitas mortes e sofrimento podiam ter sido evitados no Brasil”, avaliou o médico grego. “Não consigo te dar números, obviamente existem modelos projetando, mas sabemos que poderíamos ter evitado muitas mortes, especialmente em locais onde não houve nenhuma preparação para receber um aumento de doentes muito graves”.
“Bastava fazer o básico, adotar as medidas que funcionaram em muitos lugares” ressaltou Christou. “Medidas de saúde pública, usar máscara, evitar deslocamentos desnecessários, fazer distanciamento social, usar mensagens consistentes e claras e não negar a gravidade da doença, negar a doença”.
Christou também condenou a recomendação, feita por Bolsonaro e pelo ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, do chamado kit covid, que reúne medicamentos sem comprovação científica contra a Covid-19, como a cloroquina e ivermectina. O diretor afirmou que o Brasil é o único país no mundo que adotou o protocolo. Ele chamou a atenção para os riscos a quem faz uso das drogas para tratar da doença.
Kit Covid
“O kit Covid não é inofensivo”, alertou o médico. “Há pelo menos três consequências. As pessoas não apenas tomam os remédios que não têm comprovação científica contra Covid, elas tomam em excesso, tomam todos os dias, doses maiores do que as recomendadas, supostamente para fazer prevenção —e o resultado é que seus testes de funções hepáticas ficam muito alterados por causa disso”.
Christou também condenou médicos que prescrevem o uso das drogas, apontando conflitos éticos. “Os médicos que receitam esses remédios fazem mais mal do que bem a essas pessoas, e isso viola o princípio da medicina”, denunciou o diretor da ONG.
Vacinação lenta
Ele criticou a lentidão da vacinação no Brasil, afirmando ainda que a falta de uma mensagem clara na campanha de imunizações provoca desconfiança na população. “No Brasil, a taxa de vacinação é decepcionante, considerando que o país tem grande capacidade de fabricação de vacinas e o know-how de campanhas maciças de vacinação”, avaliou o médico.
“Além disso, as pessoas estão muito confusas por causa da desinformação, e, quanto mais confusas, mais elas perdem a confiança na ciência”, advertiu. “Ou seja, temos agora o nacionalismo vacinal, em que países disputam para comprar vacinas, e a hesitação vacinal, causada por desinformação sobre a eficácia e efeitos colaterais das vacinas”, lamentou.
Da Redação, com informações de Folha de S. Paulo