Enquanto mais da metade dos trabalhadores brasileiros estão sem emprego e, portanto, sem salário, o governo federal tenta fazer mais um agrado financeiro às Forças Armadas (FFAA). Cada vez mais isolado, e contando basicamente com apoio do Partido do Exército, Bolsonaro aposta em conceder um reajuste de 73% aos membros das Forças Armadas. Sob a pomposa rubrica de “adicional de habilitação”, a medida busca burlar a lei que impede a concessão de reajuste salarial a funcionários públicos, durante a pandemia.
A manobra de Bolsonaro para favorecer os militares, no entanto, esbarrou no Ministério Público que pediu a suspensão do aumento salarial junto ao Tribunal de Contas da União. O subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado argumenta que o “penduricalho” seria uma maneira de driblar a Lei Complementar 173/2020, que estabeleceu o Programa de Enfrentamento ao Coronavírus. A lei proíbe a concessão de aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares.
O aumento de até 73% na bonificação salarial aos militares das Forças Armadas que fazem cursos ao longo da carreira tem custo previsto de R$ 26,54 bilhões em cincos anos. O “penduricalho” será incorporado na folha de pagamento de julho, com impacto de R$ 1,3 bilhão neste ano, segundo nota técnica do ministério da Economia e dados do ministério da Defesa, obtidos pelo Estadão. O reajuste foi aprovado com a reforma da Previdência dos militares, no fim do ano passado.
Para o autor do pedido, “é difícil crer que no momento atual, quando se acumulam crises sanitária, econômica e fiscal, em face dos grandes esforços exigidos de todos para o enfrentamento da pandemia decorrente da Covid-19, o governo adote medida que virá a exigir ainda mais recursos da sociedade, já sobrecarregada por problemas que se acumulam nos campos da saúde e econômico, do convívio social, do emprego e da renda”.
A crescente participação dos militares nos principais cargos do governo segue a orientação da aliança que elegeu o “agitador das massas” presidente da República. Atualmente, oficiais das Forças Armadas comandam 10 dos 23 ministérios, são maioria no Palácio do Planalto e ocupam os principais cargos nas estatais. A massiva participação dos militares no governo é vista como um desvio das suas funções constitucionais e tem sofrido criticas de setores das FFAA.
Em plena pandemia, o governo mantém à frente do Ministério da Saúde um general sem qualificação técnica para a função, escalado para liberar a fabricação de cloroquina. Nesta semana, o governo teve de recuar na indicação do novo ministro da Educação, também oriundo do meio militar e igualmente sem “habilitação” para o cargo. Ao todo, segundo os últimos levantamentos da imprensa, mais de três mil militares ocupam cargos nas estruturas do governo federal.