O general João Carlos Jesus Corrêa teve sua demissão da presidência do Incra anunciada na semana passada, mas por falta de um substituto para o cargo segue trabalhando à frente do Instituto.
O pivô da demissão foi o secretário de assuntos fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia. Nabhan e Jesus Corrêa tinham divergências a respeito do processo de titulação de terras públicas, em especial no que diz respeito à região amazônica.
Na linha da campanha de Jair Bolsonaro (PSL) – que prometeu a titulação de 600 mil lotes até o fim de seu mandato – Garcia defende a aceleração do processo de titulação de terras concedidas via reforma agrária e fez críticas públicas à demora do órgão em efetivá-las.
Jesus Corrêa, por sua vez, reclamou da falta de recursos financeiros e humanos para dar seguimento aos trabalhos do Incra. “Saio com a consciência tranquila de ter feito excelente trabalho com a minha equipe [e] certo da excelência gerencial empregada, conhecendo o Incra como um todo”, disse ele à coluna Radar, da Veja, na última terça (1º).
Titulação de terras
Alexandre Conceição faz parte da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e atua em Brasília (DF), no contato com parlamentares e instituições públicas.
Para ele, a titulação de terras em larga escala esconde a “privatização da reforma agrária” e deve levar a um processo de reconcentração de terras. “Titulação não é reforma agrária. O que eles querem fazer é pegar o título privado e entregar às famílias sem gerar desenvolvimento do assentamento”, afirma.
Com o título de posse na mão, as famílias podem vender os lotes e acessar o crédito rural, mas deixam de ter acesso às políticas públicas garantidas pelo programa de reforma agrária.
O Programa Nacional de Educação da Reforma Agrária (Pronera), o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e a assistência técnica prestada pelos funcionários do Incra são alguns exemplos.
“Na hora que a família é titulada, ela cai fora do processo de reforma agrária. [O agricultor] deixa de ser um assentado da reforma agrária e passa a ser um proprietário de um lote de terra. Quando acabam todos esses programas e o indivíduo fica apenas com um lote de terra, ele fica vulnerabilizado [e vende a terra] para os fazendeiros”, completa Conceição.
O MST defende a Concessão de Direito Real de Uso (CDRU) aos assentados, que garante o uso da terra, a transição hereditária e o acesso a crédito, mas não permite a venda, impedindo o processo de reconcentração.
O movimento entende também que o processo de titulação pode levar à “legalização” de terras griladas por grandes latifundiários – o que em parte já vem ocorrendo por meio de legislações estaduais, como a nova lei de terras do Pará.
Por Brasil de Fato