No final de 2015, a presidenta Dilma Rousseff publicou uma medida provisória que aprimora a legislação sobre os acordos de leniência entre empresas e governo. A medida atualiza a lei nº 12.846, conhecida como Lei Anticorrupção, proposta pela presidenta em agosto de 2013, e que instituiu os acordos de leniência com pessoas jurídicas (empresas).
O acordo de leniência permite que uma empresa envolvida em alguma irregularidade denuncie o esquema e se comprometa a auxiliar a investigação. Com isso, a empresa pode ter benefícios como redução de pena ou até mesmo a isenção do pagamento de multa. Na prática, o acordo de leniência é, para as empresas, como uma delação premiada para pessoas físicas.
A novidade implementada pela MP da presidenta Dilma é a possibilidade de que todas as empresas participantes de um conluio possam colaborar para a investigação em trocas de benefícios. Anteriormente, apenas a primeira a delatar recebia eventuais benefícios pela colaboração. Agora, a primeira empresa a fechar o acordo recebe o abatimento integral da dívida, enquanto as demais terão a redução de 2/3 da multa.
Além disso, ficam livres das restrições a novas contratações com o governo, previstas na lei de licitações e de ações promovidas pelos órgãos públicos que estiverem no acordo. Outra novidade é a inclusão do Ministério Público e da Advocacia da União desde o início do processo de acordo, de forma que a empresa fique livre de ações tanto de processos provenientes da Controladoria-Geral quanto do MP. Antes, o Ministério Público só era informado depois de finalizado o acordo. Isso aumenta a coordenação entre as várias instâncias que podem abrir um processo contra a empresa pelo mesmo motivo e aumenta a segurança de uma empresa ao delatar.
Com essas medidas, existe um estímulo maior a que empresas fechem acordos de leniência, primeiro porque mais empresas podem participar, e não somente a primeira envolvida, e porque evita processos em mais de uma instância. O objetivo principal desses acordos é facilitar as investigações e o combate a práticas ilícitas. Mas, indiretamente, elas podem contribuir para estimular a economia, ao permitir que empresas que cometeram ilícitos, mas estão colaborando com o poder público e ressarcindo os cofres, possam voltar a atuar no mercado.
“Indiretamente, e junto com outras medidas, essa MP pode ajudar a destravar a economia”, afirma Francisco Luiz Lopreato, professor de economia da Unicamp. Essa foi uma das justificativas feitas pelos ministro da Fazenda Nelson Barbosa, o ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, o controlador-chefe da União Valdir Moysés Simão e o ex-advogado-geral da União Luís Inácio Adams, à época da publicação da medida. A MP 703 está entre as propostas do PT para a retomada econômica.
Segundo Marcelo Viana, da CGU, e Alexandre Macedo, do Cade, em artigo publicado no jornal “Valor Econômico”, a inclusão dos demais participantes de um conluio no processo de delação, com diferentes valores de multas, cria uma estrutura de incentivos em várias escalas. A lei foi inspirada no acordo de leniência já ocorre no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).
O Tribunal de Contas da União (TCU) fica responsável por avaliar se a reparação pelo dano foi justa. Ou seja, mesmo com a leniência, a empresa continua obrigada a ressarcir o Estado pelo ilícito cometido.
Leis parecidas já ocorrem nos Estados Unidos, União Europeia, Japão e Canadá. No Brasil, a MP ainda tem que passar pelo Congresso para tornar-se uma lei efetiva. Uma mesa mista, composta por senadores e deputados, foi aberta para avaliar o texto, que já recebeu 159 propostas de emenda. Enquanto não se transforma em lei, a MP já tem validade. Caso seja derrubada, o Congresso poderia legislar sobre os acordos feitos nesse interim. Caso não se manifeste, os acordos feitos hoje sob a MP continuarão valendo.
Por Clara Roman, da Agência PT de Notícias