“Eu não estou mais aceitando as coisas que eu não posso mudar, estou mudando as coisas que eu não posso aceitar.” – Angela Davis
As mulheres negras ainda ocupam espaço restrito nas produções televisivas e cinematográficas. Em outras áreas, como a literatura, a situação não é diferente. O reconhecimento, muitas vezes tardio, nem sempre se dá em vida, a exemplo da escritora Carolina Maria de Jesus, que ainda hoje permanece desconhecida para muita gente.
Para a escritora, atriz e cantora Elisa Lucinda, a literatura, no seu campo de atuação, é o espaço em que a entrada da mulher negra encontra barreiras mais difíceis de serem transpostas. Ela cita a Academia Brasileira de Letras (ABL). Fundada há 120 anos, por Machado de Assis, a instituição nunca teve uma cadeira ocupada por uma mulher negra.
“Eu acho a literatura um dos espaços mais duros. Parece que está escrito ‘aqui você não pode entrar’. É uma invisibilidade muito grande, o olhar é de subliteratura”, afirma Elisa.
Uma das mais reconhecidas autoras negras do país, a mineira Conceição Evaristo tem sido aclamada para ocupar a cadeira número 7 da ABL, que está vaga desde abril, com o falecimento de Nelson Pereira dos Santos. Uma petição online foi criada na internet em apoio à eleição da escritora, e já ultrapassa as 20 mil assinaturas.
A dificuldade para adentrar a espaços historicamente ocupados por homens foi enfrentada por Eliane Dias, empresária do maior grupo de rap do país, o Racionais MC’s. Ela conta que teve de encarar a desconfiança para desenvolver o seu trabalho, muitas vezes pautada na questão de gênero e raça.
“Agora está bem melhor. Mas um espaço ou outro ainda me poda, não tenho total liberdade. Me esforço muito, me desdobro, trabalho bastante para atender as demandas e deixar portas abertas para que outras mulheres negras também possam atuar como empresárias no mundo do rap”, destaca.
Na opinião de Eliane, quando as mulheres negras chegam a ocupar esses espaços de destaque, ainda há uma tentativa de invisibilização.
“A gente está numa guerra constante, porque apesar de as pessoas e os espaços culturais saberem que não dá para invisibilizar a mulher negra, tentam fazer isso”, diz.
As oportunidades ficam ainda mais restritas conforme os recortes realizados. A atriz negra e transexual Aretha Sandick destaca que as portas que se abrem são escassas, e quem nem todas podem entrar.
“Quando você faz esses recortes, mulheres negras, mulheres trans, temos uma porta pequena aberta, que algumas puderam entrar, mas nem todas poderão.”
Aretha Sandick defende que a mudança desse cenário de invisibilidade da mulher negra nesses espaços passa, necessariamente, pela ocupação de outros.
“Precisamos estar em todos os espaços, no recrutamento, na contabilidade, é o que a gente vem exigindo cada vez mais. Ocupar espaço de fala. Na verdade, tomar ele de volta”, completa Aretha.
Ainda que a passos lentos, Elisa Lucinda avalia que as mudanças estão em curso, e destaca que as mulheres negras precisam estar em espaços que permitam a construção da narrativa.
“Temos de ser roteiristas, diretoras, porque quando a gente vai para a narrativa, Iemanjá, por exemplo, deixa de ser um folclore. O processo de mudança é lento. Mas já temos um Brasil diferente, que está de olho na representatividade”, conclui.
Por Geisa Marques, da Comunicação Elas por Elas