A crise política e institucional brasileira continua ganhando repercussão na imprensa internacional. O jornal americano The New York Times avalia que o Brasil atravessa uma “tempestade perfeita” com o aprofundamento de uma crise política combinada com uma recessão destrutiva e a grave crise sanitária do país nos últimos cem anos. Na edição de sábado, o jornal publicou longa reportagem dos correspondentes Ernesto Londoño e Letícia Casado, analisando a conjuntura brasileira e o desafio imposto ao presidente Jair Bolsonaro com a saída de Sérgio Moro do governo. “O presidente estava lutando para governar efetivamente muito antes do discurso explosivo de demissão de seu ministro, que basicamente considera seu chefe um criminoso”, relatam. O jornal francês Le Monde, por sua vez, diz que a demissão de Moro – chamado de “ambicioso” – enfraquece Bolsonaro.
“Nas últimas semanas, a resposta surpreendentemente desprezível de Bolsonaro à pandemia de coronavírus, que ele chamou de ‘resfriadinho’ e que não pode ser um impeditivo para o crescimento econômico, gerou pedidos de impeachment no Congresso e perplexidade no exterior”, diz a reportagem do diário americano. NYTimes descreve que o presidente aposta que os parlamentares não se atreverão a um novo impeachment e colocar o Brasil, o maior país da América Latina, a viver “outro espetáculo político como o que derrubou a antecessora Dilma Rousseff, há quatro anos”.
Já o diário francês Le Monde avalia que o Brasil está mergulhado em uma grave crise política, com consequências potencialmente explosivas. O jornal avalia que a pandemia global aliada a uma crise econômica não foi suficiente para o presidente Jair Bolsonaro. A saída “brutal” de Moro é descrita como “um duro golpe ao governo de extrema direita”. A reportagem do correspondente Bruno Meyerfeld informa que Moro era “o ministro mais popular do governo” e “não pretende receber ordens”. “Para surpresa de todos, ele renunciou, mas não conseguiu fazer Jair Bolsonaro se curvar”, diz o texto.
NYTimes também avalia a saída como um golpe no governo. E ouve o senador Major Olímpio, descrito como um dos principais aliados do presidente no Congresso. “Tudo isso desgasta o governo em um momento em que todas as energias devem se concentrar no combate ao vírus e na economia da economia, que está atolada em crise devido ao crescente desemprego, miséria e fome”, disse o parlamentar.
Rival político
De acordo com o jornal, a saída de Moro agora confronta Bolsonaro com um poderoso rival político, que se supõe há muito tempo que tem suas próprias ambições presidenciais. O deputado Capitão Rosa, apresentado pelo diário americano como líder da “bancada da bala”, chama a saída de Moro de ferida autoinfligida no presidente que luta para gerenciar uma resposta à pandemia e à resultante contração econômica. “Moro era um pilar de estabilidade na base do governo, representando a luta contra a corrupção e o crime organizado”, disse Rosa, cuja bancada apoia amplamente Bolsonaro. “Este é um duro golpe”.
Segundo o New York Times, embora vários líderes latino-americanos tenham assistido a um salto de popularidade na opinião pública ao impor medidas restritivas, como a quarentena para conter a disseminação do coronavírus, a popularidade de Bolsonaro caiu em meio ao que os críticos chamam de resposta insatisfatória. “A oposição do presidente às medidas de distanciamento social o levou a demitir seu popular ministro da Saúde na semana passada e a brigar com alguns dos governadores mais poderosos do país”, descreve o jornal.
O jornal cita Acácio Machado, aposentado de 70 anos, que vive no Rio de Janeiro e votou em Bolsonaro em 2018. Ele diz que se arrependeu de sua escolha. “Votei na esperança de que houvesse mudança, mas fui enganado”, afirma, acrescentando que muitos amigos que votaram em Bolsonaro também passaram a lamentar sua decisão. “Se eu tivesse uma bola de cristal na época, teria estragado meu voto”.