A pandemia do coronavírus se alastra desenfreadamente pelo país, diante do estrondoso silêncio do Ministério da Saúde e de uma campanha antivacina promovida pelo presidente Jair Bolsonaro. A alta de infecções voltou a pressionar os sistemas de saúde do país em diversas regiões e preocupa especialistas. Acusado de ter esperado a vitória de Bruno Covas na eleição municipal de domingo (29), o governador João Dória anunciou o endurecimento das medidas de distanciamento social em São Paulo, levando o estado de volta à chamada zona amarela. Nesta terça-feira (1º), o país registra 6,3 milhões de casos e 173.229 mortes.
Na segunda-feira (30), a Organização Mundial da Saúde alertou para a gravidade do quadro no país. Durante entrevista coletiva, o diretor-geral da OMS, Tedros Ghebreyesus, expressou preocupação com a América Latina, em especial, o Brasil e o México. “O Brasil teve seu ápice em julho”, lembrou Tedros. “O número de casos estava diminuindo, mas em novembro os números voltaram a subir. O Brasil precisa levar muito, muito a sério esses números. É muito, muito preocupante”, advertiu.
Na contramão do bom senso e da ciência, Bolsonaro continua a investir contra a vacina. “Se for certificado pela Anvisa, o governo federal vai comprar esse material e colocar à disposição da população de forma gratuita e voluntária”, declarou Bolsonaro, antes de concluir: “Eu digo para vocês, eu não vou tomar, é um direito meu”.
Ao advogar contra o uso da vacina, Bolsonaro estimula a desconfiança entre a população, prejudicando seriamente as chances de sucesso de uma estratégia de imunização coletiva. Isso porque, para fazer efeito, uma vacina com 80% de eficácia precisa ser aplicada em pelo menos 75% da população, de acordo com um estudo publicado no American Journal of Preventive Medicine (AJPM). Daí a necessidade de a vacina ser obrigatória. Mas, para Bolsonaro, quem defende a obrigatoriedade é “ditador”.
Alta transmissibilidade
Segundo levantamento da agência ‘Reuters’, o Brasil ocupa o terceiro lugar no mundo em número de contágios diários, atrás da Índia e dos EUA. De acordo com a média semanal calculada pela agência, o Brasil está com uma taxa de contaminação cujo pico é de 76%. Ou seja, ainda distante de atingir o ápice de infecções. “A porcentagem desse pico que um país informa atualmente nos dá uma ideia melhor de quão longe está de conter a propagação do vírus em relação aos piores dias de seu surto”, explica a Reuters.
Na semana passada, o Imperial College de Londres detectou que a taxa de transmissão (Rt) do país atingiu a maior alta desde o mês de maio. Segundo a universidade britânica, o índice chegou a 1,30, o que corresponde a uma contaminação de 100 pessoas para outras 130. “Os países precisam atacar os casos que ressurgem para que eles não se propaguem”, observou Maria van Kerkhove, do Programa de Emergências da OMS, frisando que as orientações valem para todos os países. “Uma vez que você reduz o número de casos, você precisa manter esse número baixo”. O mundo já passa dos 63,8 milhões de casos e quase 1,5 milhão de mortes em decorrência do vírus.
Aumento de casos de síndrome respiratória
Também na semana passada, a Fiocruz voltou a acender o alerta em relação a um aumento dos casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) em todo o país. Segundo o Boletim InfoGripe, cerca de 97,7% dos casos de SRAG registrados em 2020 ocorreram em consequência do novo coronavírus. Desde julho não se observava um crescimento tão expressivo, com 12 capitais registrando altas de casos da síndrome há várias semanas. Os dados são referentes à Semana Epidemiológica 47 (15 a 21 de novembro).
“Os novos dados indicam interrupção de queda e sinal de retomada de crescimento. Todas as regiões do país encontram-se na zona de risco e com ocorrência de casos muito altas”, observou o pesquisador e coordenador do InfoGripe. De acordo com a fundação, já foram reportados este ano 565.312 casos. “Em apenas 6 das 27 unidades federativas observa-se tendência de longo e curto prazo com sinal de queda ou estabilização em todas as respectivas macrorregiões de saúde”, descreve o relatório da Fiocruz.
Entre as capitais com fortes sinais de crescimento de casos de síndrome respiratória aguda grave estão Belo Horizonte, Campo Grande, Maceió e Salvador. Já Curitiba, Natal, Palmas, Brasília, Rio de Janeiro, São Luís, São Paulo e Vitória apresentam índices mais moderados de casos.
Ocupação de leitos também preocupa
Em São Paulo, a taxa de ocupação de leitos de UTI da rede particular atingiu 84% enquanto no Rio de Janeiro, a rede pública tem 93% de ocupação de leitos no município. Segundo a prefeitura, a taxa de ocupação nos leitos de enfermaria é de 77%. Centenas de pacientes aguardam vaga para obter um leito. O número de pacientes internados subiu mais de 40% em um mês.
Já Santa Catarina chegou a 86,2% dos leitos intensivos ocupados. As três maiores cidades da região estão com lotação máxima nos hospitais públicos. Manaus (AM), Macapá (AP), Vitória (ES), Curitiba (PR) e Porto Alegre (RS) também têm taxas de ocupação acima de 80%.
Da Redação, com ‘Reuters’, ‘CNN’, ‘G1’, ‘UOL’, e ‘Fiocruz’