O Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou, na quinta-feira (26), a criação de uma relatoria especial sobre direito à privacidade na era digital. A iniciativa partiu de resolução proposta pelo Brasil, Alemanha, Áustria, México, Noruega, Suíça e o principado de Liechtenstein.
Por meio de relatórios anuais, durante os três anos de mandato inicial, a relatoria terá a incumbência de reunir informações e identificar os obstáculos criados à proteção do direito à privacidade, promover a defesa ao direito, relatar violações e submeter ao conselho os casos mais graves.
O professor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Sérgio Amadeu da Silveira, ressaltou o protagonismo o Brasil em defesa do direito à privacidade digital. Segundo ele, o País foi a voz dissonante da linha hegemônica dos Estados Unidos (EUA),que afirma ser válida qualquer ação para combater o terrorismo, a pedofilia e o tráfico de drogas.
“Com base nisso, se tentou criar legislações que suprimissem direitos das pessoas nas redes da internet”, ressaltou Amadeu.
Segundo o professor, o Marco Civil da Internet brasileiro, a Lei 12.965/14, foi na contramão do cerceamento aos direitos e garantiu as liberdades de pensamento e expressão. Ele entende que os maiores detratores dos direitos básicos dos cidadãos não são países considerados autoritários, como a China, mas os EUA.
“A posição deles, que aparentemente seria de defensores do mundo livre, é a de defensores do mundo de vigiados”, explica o acadêmico.
Aprovado em abril de 2014, o Marco Civil da Internet passou a ser referência mundial em democracia da comunicação. O físico britânico Tim Berners-Lee, considerado um dos pais da internet, divulgou nota, à época, enaltecendo a conquista brasileira. Para Berners-Lee, o principal mérito do projeto foi o de ter sido criado de forma colaborativa, refletindo o desejo de milhares de internautas.
“Se o Marco Civil passar, sem mais atrasos ou mudanças, será o melhor presente para os usuários de internet no Brasil e no mundo”, afirmou a nota.
O professor Amadeu lembrou que o Brasil e a Alemanha foram os países que mais publicamente ofereceram resistência à vigilância massiva preconizada pelos EUA. Para ele, o Brasil tem um papel de destaque na luta pelo respeito aos direitos e garantias individuais na comunicação digital.
Para tornar a relatoria mais efetiva, Amadeu sugeriria à ONU fazer um minucioso mapeamento das violações à privacidade que são praticadas diariamente, no mundo inteiro. Essa prática, afirma, compõe a economia da venda de dados pessoais. Em seguida, a ONU deveria aprovar um tratado duro contra a espionagem massiva, sob o princípio de que todos são inocentes até que prove o contrário.
Amadeu acredita que os maiores obstáculos para se avançar nas discussões sobre o direito à privacidade são os dados pessoais altamente valiosos para a economia da informação. Para ele, quanto mais se avança o capitalismo informacional, mais se reduz o direito à privacidade.
“É preciso expor os riscos dessa vigilância. É inadmissível usar técnicas de mineração de dados para encontrar suspeitos entre mensagens trocadas por cidadãos do mundo inteiro”, ressalta Amadeu.
Por Guilherme Ferreira, da Agência PT de Notícias