O adiamento da votação da reforma da Previdência para agosto deu aos parlamentares de oposição na Câmara dos Deputados mais tempo para tentar popularizar os debates sobre o tema. O movimento inclui membros das siglas PT, Psol, PCdoB e parte do PSB e do PDT, que vêm se articulando em conjunto contra a proposta do governo Bolsonaro (PSL).
Para a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), uma das vice-líderes da minoria, a mudança na data de votação em segundo turno, que ocorreu mais de uma vez ao longo dos últimos meses, resulta do trabalho de obstrução feito pelos opositores, que dificultaram as investidas do governo ao desacelerar as sessões que debateram a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 6/2019, nome oficial da reforma.
A parlamentar acredita que o intervalo do recesso parlamentar, que se inicia na próxima quarta (18) e segue até 1º de agosto, contribui para as articulações da oposição, mesmo diante da vantagem matemática obtida pelo governo – o texto-base da PEC foi aprovado por 379 votos favoráveis contra 131 rejeições, em um cenário de liberação de emendas e oferta de cargos pelo Planalto em troca de apoios à pauta.
“Nestes quinze dias, nós vamos trabalhar intensamente nas bases. Vamos fazer com que a sociedade saiba quem votou a favor e quem votou contra. Muitos dos deputados que votaram pela reforma juravam nos palanques eleitorais que jamais votariam a favor de uma reforma dessa natureza. Evidentemente, eles vão sentir na base o reflexo disso”, projeta.
Segundo Portugal, a oposição buscará o que chama de “redução de danos” e tentará excluir, por exemplo, a regra da PEC que reduz o valor da pensão por morte concedida a viúvas. Nas votações do plenário na semana passada, os deputados baixaram de 100% para 60% o percentual da aposentadoria destinada ao segmento.
Pelo regimento da Câmara, na votação de segundo turno, os parlamentares não conseguem mais modificar pontos da proposta aprovada, mas podem apresentar os chamados “destaques supressivos”, que são sugestões de retirada de trechos. “Vamos jogar com a opinião pública pra tentar reverter os elementos mais nocivos da reforma”, afirma.
Os governistas apostam que a votação ocorra a partir do dia 6 de agosto, para encaminhar a proposta ao Senado até o dia 9.
Período estratégico
Se, por um lado, o adiamento da votação de segundo turno mantém o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), principal articulador da PEC, sob os holofotes midiáticos como condutor da pauta da reforma, por outro, o intervalo traz riscos aos interesses do governo. Primeiro, porque um eventual novo escândalo da gestão Bolsonaro pode ajudar, em alguma medida, na pressão exercida por deputados sobre o Planalto.
Em busca de emendas, cargos e outros dividendos políticos, parlamentares de diferentes siglas, especialmente as do chamado “centrão”, investiram em barganhas de bastidor para negociar com o governo o apoio à reforma. Esse movimento de forças, aliado à rejeição popular à medida, foi o principal fator de desidratação do texto da proposta e poderia levar a novas perdas do governo na votação dos destaques supressivos.
O período do recesso é considerado estratégico no jogo político porque, com vistas às eleições municipais de 2020, os parlamentares tendem a buscar maior interação com os redutos eleitorais, o que contribui também para a pressão do campo popular sobre os deputados.
“Não é tão simples reverter [o placar], mas acho que isso pode ajudar a diminuir a diferença”, acredita o líder do Psol, Ivan Valente (SP), destacando ainda a necessidade de maior mobilização popular contra a PEC.
Em sintonia com a opinião do parlamentar, o militante Leidiano Farias, integrante da Frente Brasil Popular (FBP), aponta que o momento deverá contar com novas articulações do campo.
“É importante aproveitar o recesso pra seguir dialogando com a população no sentido de que a reforma significa retrocesso do ponto de vista dos direitos sociais, do direito à aposentadoria, porque ela vai restringir o acesso à aposentadoria no país. Esse intervalo é pra aprofundar e intensificar o diálogo e a comunicação com a classe trabalhadora”, afirma.
Segundo Farias, um novo calendário de mobilizações está em fase de debate entre as entidades que compõem a FBP.
Por Brasil de Fato