Pesquisa divulgada pela “Folha de S.Paulo” mostra que o apoio às ideias de esquerda cresceu, segundo mapeamento do Datafolha, que entrevistou 2.771 pessoas em 194 cidades brasileiras.
Foram cinco variações ideológicas (esquerda, centro esquerda, centro, centro-direita e direita) para os temas pobreza, crescimento, homossexualidade, migração, pena de morte, armas, leis trabalhistas, governo, impostos, benefícios, criminalidade, sindicatos, adolescentes, religião e drogas. A coleta dos dados foi feita entre os dias 21 a 23 de junho de 2017, com 2% de margem de erro.
Pela que foi divulgado inicialmente, não soubemos exatamente quais foram as perguntas, nem é possível ter certeza de quais temas ficaram de fora, como cotas, aborto, reforma agrária, questões históricas e candentes que sempre cindem nosso campo ideológico. Contudo, é possível fazer algumas reflexões com o que nos é trazido. Aí está uma síntese:
“Na comparação com o levantamento anterior, feito em setembro de 2014, nota-se uma maior sensibilização do brasileiro a questões que envolvem a igualdade, possível reflexo da crise econômica e do alto desemprego que atingem o Brasil nos últimos anos.
Subiu, por exemplo, de 58% para 77% a parcela que acredita que a pobreza está relacionada à falta de oportunidades iguais para todos. Já a que crê que a pobreza é fruto da preguiça para trabalhar caiu de 37% para 21%.”
É importante ressaltar que esta inflexão do público à esquerda dá-se após muitos eventos contenciosos, de radicalização política e polarização. Depois de setembro de 2014, data da sondagem anterior, tivemos dois turnos de uma eleição presidencial, protestos financiados pelo alto estrato do empresariado brasileiro, o agravamento da crise econômica, crise política, um golpe em 54 milhões de votos, o encerramento de um período de democratização.
Mais recentemente, nos últimos meses, temos ataques a direitos sociais, mobilização das forças populares, um estrondo em denúncias de corrupção. Ou seja, um cenário de polarização teria ajudado a esquerda a angariar apoio ideológico.
Assim, aqueles que apostavam que o caminho para as forças progressistas eram a cordialidade mansa e o abandono das tensões deveriam rever seus pressupostos. O que este cenário trouxe à vista dos brasileiros foram as pontas dos conflitos históricos da estrutura de poder do Brasil.
Ou seja, é preciso demonstrar a dinâmica contraditória da sociedade brasileira que, sem um estado forte e que aja pelos de baixo, seguirá produzindo fome, violência e injustiças.
Note-se também que a referência de 2014 era uma data bem próxima do pleito presidencial. O resultado das eleições nós conhecemos, venceu o Partido dos Trabalhadores. Ou seja, a população, mesmo com uma tendência a apoiar com menor força as ideias da esquerda, votou no PT.
Claro que não é possível saber se isso reflete-se exatamente no grupo que compareceu às urnas, mas é uma informação que nos impõe reflexões.
Seguro que isso tenha ocorrido em virtude de ser o PT o único partido que inspire noções de igualdade, interesse público, coerência programática e ideias bem definidas de políticas públicas.
Assim, as pessoas ainda associam a opção pelo PT a uma tomada de posição que lhe é razoável sobre o que se pode esperar do seu voto e sobre o que poderá cobrar dos(as) eleitos(as). Tais características são muito valorosas para qualquer partido, mas que no Brasil, só o PT pode conquistar às custas de muito esforço coletivo. Devem ser portanto fortalecidas.
Por Paulo Ramos, mestre em Sociologia, é Secretário Estadual de Combate ao Racismo do PT de São Paulo.