O Tribunal de Contas da União não está situado na Praça dos Três Poderes, em Brasília. Sua sede fica no Setor de Administração Federal Sul, a 300 metros do Eixo Monumental. O TCU também não é um tribunal de Justiça, não representa o Poder Judiciário. Trata-se de um órgão auxiliar do Congresso Nacional, responsável por exercer a fiscalização financeira, orçamentária e contábil dos entes públicos (vide artigos 70 e 71 da Constituição Federal).
Os ministros dos tribunais de contas são escolhidos pelo Presidente da República (1/3) e pelo Congresso Nacional (2/3). Quem tem legitimidade para a escolha dos membros são os poderes Legislativo e Executivo. Os escolhidos são, na maioria, ex-parlamentares ou técnicos ligados a algum partido político. Hoje, todos os ministros do TCU têm vinculação partidária.
Na democracia, cabe ao Governo Federal e ao Parlamento desempenhar dois papéis principais. Espera-se deles a implementação de políticas públicas que sejam garantidoras de direitos e, em paralelo, o controle competente das contas públicas, para que os recursos disponíveis sejam efetivamente empregados, sem desvios, e para que o orçamento seja executado corretamente.
O modelo ideal de gestão das finanças públicas implica a busca permanente por total equilíbrio entre receitas e despesas e a constante preocupação para que não existam déficits. O Brasil conquistou o grau de investimento em 2007, na gestão do então presidente Lula, quando Dilma Rousseff era ministra-chefe da Casa Civil. Desde então, a dívida pública diminuiu e a qualidade das finanças do país melhorou significativamente.
Da mesma forma, Dilma exerceu com igual responsabilidade a condução das finanças de seu governo, agora numa conjuntura econômica desfavorável, quando, em razão da crise chinesa, o preço das commodities despencou e os mercados que compram nossos produtos industrializados foram igualmente afetados. Houve ainda outro agravante: dois anos consecutivos de uma crise hídrica aguda, que elevou o custo da produção da energia hidrelétrica e requereu também a produção de energia termelétrica, com custos elevadíssimos.
Num cenário econômico adverso, com diminuição de receita, cabe ao gestor público eleito administrar o caixa para fazer frente às despesas contraídas. Neste contexto, o gestor responsável programa o pagamento das contas conforme o fluxo de caixa, procurando honrar em dia as dívidas que não podem atrasar — especialmente os benefícios sociais — e organiza as demais despesas estendendo seu prazo de pagamento.
Foi o que fez a presidenta Dilma Rousseff, adotando todas as providências exigidas pela lei orçamentária. Diante da queda brusca de receita, ela manteve os benefícios em dia e priorizou num primeiro momento os gastos sociais, em saúde, educação, Bolsa Família, FIES ou previdência. Sua atitude demonstra compromisso incontestável com a população, com aqueles que dependem diretamente desses benefícios. E também com a soberania brasileira. Vale lembrar que, em outros tempos, o FMI era procurado sempre que a conta ameaçasse não fechar.
Em 2015, o Ministro Augusto Nardes desencadeou uma campanha para a reprovação das contas da presidenta, adiantando o seu voto, dando publicidade à sua decisão e articulando outros atores para que acompanhassem seu parecer. A acusação foi de prática de “pedalada”, um termo de palanque, estranho a qualquer norma de gestão orçamentária. O julgamento demorou 19 minutos. Nenhum ministro pediu vista ou votou em separado. Preferiram seguir as recomendações do relator, militante do impeachment.
Nunca houve reprovação por parte do TCU desta prática, utilizada há 20 anos no Brasil. Nenhuma conta de presidente da República foi reprovada por este motivo. Querem condenar uma pessoa honesta por um suposto crime que encontra seu antídoto na própria jurisprudência do tribunal. Será esse o modelo de controle externo das contas públicas que o Brasil requer? Estará esse modelo de instituição à altura do desafio histórico que o país enfrenta?
A sociedade brasileira tem que ficar atenta ao papel que o Tribunal de Contas da União vem desempenhando. A recente decisão de reprovar as contas de 2014 demonstra alto teor político e baixa densidade técnica. Essa reprovação, entretanto, não é dotada de valor jurídico. É tão somente uma recomendação. Quem aprova ou desaprova contas do Governo Federal é o Congresso Nacional.
Caberá àqueles que têm legitimidade popular, conferida nas urnas, corrigir essa decisão. Dos integrantes do Congresso Nacional esperam-se isenção e responsabilidade no julgamento. Seus critérios deverão conjugar a preocupação com a correta gestão das contas públicas e também o devido zelo com as áreas mais sensíveis da população e com os projetos imprescindíveis à Nação. Foi o que fez Dilma Rousseff. Milhares de gestores honestos no Brasil agem de forma semelhante, sem dolo nem culpa, e são muitas vezes atropelados por visões formalistas e tacanhas que se hospedam no Estado brasileiro.
Acredito que o Congresso Nacional não deixará prosperar tal visão, que, caso prevaleça, representará a captura da política, construída na legitimidade popular, pela técnica formalista, insensível, distante dos anseios populares.
Paulo Teixeira é deputado pelo PT-SP e vice-líder do Governo na Câmara dos Deputados